a) Caráter dos fenômenos afetivos.
b) Função do psiquismo que. para Aristóteles, é considerada como a consciência que se ajunta ao ato psíquico. Para os evolucionistas, fisiologistas em geral, etc. (Spencer, Mill, Darwin. etc.) é um sinal, um estado de consciência utilitária.
Revela-se a atividade contrariada ou não. As teorias fisiologistas incluem-na na sensibilidade como um epifenômeno desta.
Crítica — Nosso psiquismo, com suas raízes na sensibilidade, funciona, polarizando-se na intelectualidade e na afetividade.
Geralmente a afetividade e a sensibilidade são confundidas. Na sensibilidade, há a topicidade do que é objetivo em face do cognoscente. Há uma dor aqui, ali.
Mas, assim como a intuição intelectual serve de ponte de ligação entre a sensibilidade e a intelectualidade, os estados de agradabilidade e de desagradabilidade são afetivos. O prazer e o desprazer, quando tópicos, são da sensibilidade. Mas quando perdem a topicidade, para se darem difusos pelo ser humano, tornam-se afetivos, e são raízes da afetividade no seu aprofundar na sensibilidade, que é o arcabouço comum da vida noética.
A afetividade acompanha a presença do conflito entre os antagonismos interiores, em todo ato do conhecimento. Não há um instante desse conflito, que se dê, tanto no ato intelectual, intuitivo ou operatório, como no ato puramente sensível, sem que a afetividade esteja presente, muito embora sua intensidade seja tão pequena que não a atualize a nossa consciência. Mas, note-se, essa consciência, quando se dá, é apenas a de um estado.
A afetividade em si mesma transcende o conflito. Este apenas a revela. No conflito, um dos termos do antagonismo é atualizado, enquanto o outro é virtualizado, como se dá no conhecimento racional, em que o esquema, pela assimilação, é atualizado, enquanto o objeto é virtualizado.
A afetividade, não compreendida assim, levou às teorias já conhecidas, que a reduzem à epifenomenalidade, atribuindo-a ao corpo, à matéria, como nas concepções mecânicas da vida, ou à alma, ou à matéria organizada, como nas concepções teleológicas da vida, vitalismo, etc.
Janet, com grande intuição, via na afetividade a expressão do que se passa na alma favorecida ou obstaculizada em suas aspirações ou o reflexo do que se passa nas vísceras. Mas sempre apenas uma imagem:. . . Mas Janet acaba, afinal, por cair na mesma explicação singela, quando vê no sentimento apenas uma modificação do conjunto da conduta.
Desta forma, acaba por negar-lhe uma natureza própria, transformando-a apenas numa «modificação: da vida psicológica. A numenalidade da afetividade é negada, e por todos reduzida, afinal, à mera epifenomenalidade, desvalorizada a um papel meramente passivo (má interpretação do termo pathos, que encontramos na formação dos esquemas ocidentais, de atividade e passividade).
Podemos distinguir duas concepções sobre a afetividade: a afetividade considerada como uma recompensa boa ou má (Aristóteles, etc), e a que a considera como sinal, como um estado de consciência utilitária (Spencer, Mill, Darwin e os evolucionistas, fisiologistas em geral, etc).
Para distinguir a dor física, tópica, da dor moral atópica (afetiva), genuinamente páthica, tais psicólogos, na ausência de órgãos receptores, não revelados pela fisiologia, usam este processo explicativo: toda dor, que é tópica, que é mais ou menos difusa, vaga, torna-se aproximada à dor moral, como o prazer tópico ao prazer moral (afetivo), também o agradável ou o desagradável.
Mas, na afetividade, não encontramos essa equivalência. Entre uma dor de dente e uma mágoa moral, que semelhança há?
Todas as teorias conhecidas, que pretendem explicar a afetividade e a sensibilidade, sempre incluída nesta última, tendem a considerar que é o conflito que as condiciona. A contrariedade dinâmica do existir seria suficiente para explicá-lo e, neste caso, a sensibilidade (incluindo a afetividade) seria apenas um epifenômeno do mesmo existir, salvo para as concepções espiritualistas, em certo sentido, que oferecem outra explicação, mas, pelo modo como procedem, não satisfazem plenamente.
Todas essas teorias apenas nos indicam quando aparece e quando desaparece o fato sensível-pático, que não é objetivo nem subjetivo, que não apresenta as características da exclusão ou do dualismo antagonista, que se observa no ato de captação do conhecido pelo cognoscente.
Essas teorias apenas nos descrevem o sistema e as funções, onde, o sensível-pático se dá, considerando-o mero acidente.
Se é necessário o conflito para que captemos o sensível-páthico, como poderíamos conhecê-lo em sua numenalidade ?
Se a presença do sensível, por exemplo, não se manifesta senão nesse antagonismo, que implica a atualização de um dos termos e a virtualização do outro, se o sensível se acusa sob a forma de dor ou desaparece sob a forma de prazer, não teria ele uma realidade modal, transitória, epifenomenal, fundada nesse próprio antagonismo ?
Um estado sensitivo-afetivo é irredutível a qualquer outra coisa. A numenalidade, que é negada pelos psicólogos, e a sua natureza passam a ser temas de estudos.
Um estado afetivo não apresenta as características de objetividade da percepção de uma árvore, de um ser do mundo exterior.
Há paisagens tristes, mas o que é triste da paisagem não está no seu elemento representativo e objetivo. A afetividade não é captada na coisa, mas em nós.
Sua fonte está em nós, Mas essa alegria ou essa tristeza não trazem, simultaneamente, a marca do sujeito e a marca do objeto ? Não é algo que captamos em e de que somos?
Quando dizemos ter uma dor na perna, quanto há de profundidade nessa expressão popular. É o nosso corpo que sofre; sofremos em nós. Podemos localizá-la, podemos citar o ponto onde ela dói; porém dói em nós, e onde aquele ponto indica. Se no meramente sensível já podemos ver assim, quanto mais o poderíamos no afetivo.
E quando essa dor desaparece, surge-nos a euforia de uma satisfação, a satisfação de uma ausência, um estado de agradabilidade, mais afetivo que sensível, um contentamento conosco mesmos. E captamos uma ausência? Não captamos a ausência, o que captamos é o que sentimos, positividade indubitável. Todos os estados afetivos afirmam positividades, que podem ser favoráveis ou desfavoráveis, opostas aos nossos interesses. A dor é positiva, como o é o prazer. O desaparecimento da dor afirma a positividade do alívio e da agradabilidade.
A afetividade é extra-objetiva e extra-subjetiva. Os estados sensíveis a revelam. Ela surge em nós; ela vem do subconsciente, positiva sempre. Ela não é uma potência que se atualiza. Ela está em ato sempre.
AFETIVIDADE (característica da) — Na afetividade, também há conhecimento. Mas, aqui, a separação entre sujeito e objeto não é tão marcante como na intelectualidade, pois o sujeito e objeto, no que se chama estado afetivo, se fundem. Não estamos em face de um conhecimento (de cognoscere), mas de um fundir-se; pois sujeito e objeto são o mesmo. [MFSDIC]