(in. Humanism; fr. Humanisme; al. Humanismus; it. Umanesimó).
Esse termo é usado para indicar duas coisas diferentes: I) o movimento literário e filosófico que nasceu na Itália na segunda metade do séc. XIV, difundindo-se para os demais países da Europa e constituindo a origem da cultura moderna; II) qualquer movimento filosófico que tome como fundamento a natureza humana ou os limites e interesses do homem.
I) Em seu primeiro significado, que é o histórico, o humanismo é um aspecto fundamental do Renascimento , mais precisamente o aspecto em virtude do qual o Renascimento é o reconhecimento do valor do homem em sua totalidade e a tentativa de compreendê-lo em seu mundo, que é o da natureza e da história. Nesse sentido, costuma-se dizer que o humanismo se inicia com a obra de Francesco Petrarca (1304-74). Os principais humanistas italianos são: Coluccio Salutati (1331-1406), Leonardo Bruni (1374-1444), Lorenzo Valia (1407-57), Giannozzo Manetti (1396-1459), Leonbattista Alberti (1404-72), Mario Nizolio (1498-1576). Entre os humanistas franceses: Charles de Bouelles (1470 ou 75-1553), Petrus Ramus (1515-72), Michel E. de Montaigne (1533-92), Pierre Charron (1541-1603), Francisco Sanchez (1562-1632), Justo Lipsio (1547-1606). Entre os espanhóis, lembramos Ludovico Vives (1492-1540) e, entre os alemães, Rodolfo Agrícola (1442-85).
As bases fundamentais do humanismo podem ser assim expostas:
1) Reconhecimento da totalidade do homem como ser formado de alma e corpo e destinado a viver no mundo e a dominá-lo. O curriculum de estudos medieval era elaborado para um anjo ou uma alma desencarnada. O humanismo reivindica para o homem o valor do prazer (Raimondi, Filelfo, Valia); afirma a importância do estudo das leis, da medicina e da ética contra a metafísica (Salutati, Bruni, Valia); nega a superioridade da vida contemplativa sobre a vida ativa (Valia); exalta a dignidade e a liberdade do homem, reconhece seu lugar central na natureza e o seu destino de dominador desta (Manetti, Pico della Mirandola, Ficino).
2) Reconhecimento da historicidade do homem, dos vínculos do homem com o seu passado, que, por um lado, servem para uni-lo a esse passado e, por outro, para distingui-lo dele. Desse ponto de vista, é parte fundamental do humanismo a exigência filológica, que não é apenas a necessidade de descobrir os textos antigos e restituir-lhes a forma autêntica, estudando e colecionando os códices, mas também é a necessidade de encontrar neles o autêntico significado de poesia ou de verdade filosófica ou religiosa que contenham. A admiração pela Antiguidade e seu estudo nunca faltaram na Idade Média; o que caracteriza o humanismo é a exigência de descobrir a verdadeira cara da antiguidade, libertando-a dos sedimentos acumulados durante a Idade Média.
3) Reconhecimento do valor humano das letras clássicas. É por esse aspecto que o humanismo tem esse nome. Já na época de Cícero e Varrão, a palavra humanitas significava a educação do homem como tal, que os gregos chamavam de paideia, eram chamadas de “boas artes” as disciplinas que formam o homem, por serem próprias do homem e o diferenciarem dos outros animais (Aulo Gélio, Noct. Att., XIII, 17). As boas artes, que ainda hoje são denominadas disciplinas humanísticas, não tinham para o humanismo valor de fim, mas de meio, para a “formação de uma consciência realmente humana, aberta em todas as direções, por meio da consciência histórico-crítica da tradição cultural” (Garin, L ‘educazione umanistica in Itália, p. 7) (v. cultura).
4) Reconhecimento da naturalidade do homem, do fato de o homem ser um ser natural, para o qual o conhecimento da natureza não é uma distração imperdoável ou um pecado, mas um elemento indispensável de vida e de sucesso. O reflorescimento do aristotelismo, da magia e das especulações naturalistas (graças a Telésio, G. Bruno e Campanella) constituem o prelúdio da ciência moderna.
II) O segundo significado dessa palavra nem sempre tem estreitas conexões com o primeiro. Pode-se dizer que, com esse sentido, o humanismo é toda filosofia que tome o homem como “medida das coisas”, segundo antigas palavras de Protágoras. Exatamente nesse sentido, e com referência à frase de Protágoras, F. C. S. Schiller deu o nome de humanismo ao seu pragmatismo (Studies in Humanism, 1902). Foi com o mesmo sentido que Heidegger entendeu o humanismo, mas para rejeitá-lo; viu nele a tendência filosófica a tomar o homem como medida do ser, e a subordinar o ser ao homem, em vez de subordinar, como deveria, o homem ao ser, e a ver no homem apenas “o pastor do ser” (Holzwege, 1950, pp. 101-02). Referindo-se a um sentido análogo, Sartre aceitou a qualificação de humanismo para o seu existencialismo (L’existencialisme est un humanisme, 1949).
Em sentido mais geral, pode-se entender por humanismo qualquer tendência filosófica que leve em consideração as possibilidades e, portanto, as limitações do homem, e que, com base nisso, redimensione os problemas filosóficos. (Abbagnano)
O movimento dos humanistas da Renascença (Erasmo Montaigne, Budé), que revalorizaram simultaneamente a literatura da Antiguidade greco-latina e a reflexão pessoal. Doutrina moral que reconhece ao homem o valor supremo (contrapõe-se tanto ao fanatismo religioso quanto ao estatismo político, que sacrifica o indivíduo à razão de Estado): seu princípio de moral é o da tolerância; sua filosofia própria defende a ideia de um progresso da civilização para uma forma ideal de humanidade, onde o homem seria ao mesmo tempo livre, graças ao progresso técnico, em relação às contingências da natureza (da fome, do frio, das doenças) e livre em relação aos outros homens (numa sociedade sem lutas, sem classes, e entretanto organizada), graças ao emprego de uma Constituição ideal e mundial. — O termo “humanismo” aplica-se, historicamente, à “Religião da humanidade que Augusto Comte queria que substituísse a de Deus, e, atualmente, a toda teoria filosófica, social e política que tenha por objetivo supremo o desenvolvimento ilimitado das possibilidades do homem e o respeito real à dignidade da pessoa humana (o que constitui um objetivo moral e também um programa econômico). (Larousse)
Humanistas (séc. XW-XVI)
Este não é o lugar apropriado para falar do termo e do conceito de “humanista”, “humanismo”. Nem queremos analisar a evolução do conceito até chegar a nossos dias. Queremos simplesmente aludir ao “humanismo” e aos “humanistas” tal e como se produziram e surgiram num período histórico (séculos XIV-XVI). Nosso interesse está centrado, particularmente, nas pessoas e valores que encarnam o chamado “humanismo cristão” desta época. Como em outras épocas e momentos, nosso dicionário quer coletar a forma pela qual os autores e suas obras captam, vivem e expressam o cristão. Tratamos basicamente do humanismo renascentista.
Partimos desta constatação: quando desde os séc. XIV-XVI falamos de um “humanismo cívico”, de uma “teoria humanista da educação”, de um “humanismo artístico”, de um “humanismo científico”, e até de um “humanismo utilitário”, devemos ter presentes duas coisas: a) Que o núcleo do humanismo era a preocupação íntima do humanista pela correção de seu texto: se retirarmos do termo “humanismo” o cheiro da lâmpada do erudito, estaremos utilizando-a de forma enganosa, b) De igual modo, percebe-se nele oposição a um cristianismo que “os humanistas desejavam, no geral, completar, não contradizer, através de sua paciente escavação da antiga sabedoria de inspiração divina” (Enciclopédia do Renascimento italiano).
Essa constatação, inclusive no chamado “humanismo paganizante”, é representada em grande parte pelos italianos, embora com notáveis exceções. O redescobrimento da Antiguidade suscitou um entusiasmo tão vivo que se esqueceram quinze séculos de cristianismo. Contudo, esse humanismo não é anticristão. Se, ao contrário, examinamos o “humanismo cristão”, vemos que se caracteriza por um retorno às fontes, ao evangelho, aos grandes textos da tradição, porém despojados dos acréscimos por certa teologia escolástica e pelos comentários medievais, que muitas vezes os falseavam.
Esse humanismo, caracterizado pelo amor e pelo estudo da sabedoria clássica e pela demonstração de sua concordância fundamental com a verdade cristã, produziu resultados admiráveis: a) Produziu uma pedagogia, base da revolução cultural, indispensável à sua época, e contribuiu poderosamente para colocá-la em prática, b) Exaltou o evangelismo como “philosophia Christi” e como modo de vida, refletido em tantas obras da época como o Enchiridion militis christiani (Erasmo) e Do beneficio de Cristo (anônimo, 1543). Nos dois encontramos que o “cristianismo é essencialmente interioridade e não consiste na observância dos ritos externos; é um combate contra as paixões, que nos eleva sobre os bens materiais até Cristo salvador”, c) Descobriu o conceito da função civil da religião e da tolerância religiosa (Morus): a cidade terrena deve realizar, enquanto seja possível, a harmonia e a felicidade da cidade celestial. A harmonia e a felicidade pressupõem a paz religiosa. O ideal da paz religiosa é a forma com que se apresenta tanto no Humanismo quanto no Renascimento, a exigência da tolerância religiosa, d) Finalmente, os humanistas rejeitaram a herança medieval e escolheram a herança do mundo clássico, porque queriam fazer reviver essa herança como instrumento de educação, isto é, de formação humana e social. O privilégio concedido por eles às chamadas letras humanas, ou seja, à poesia, à retóri-história, à moral e à política, fundamentava-se na convicção herdada também dos antigos, de que tais disciplinas são as únicas que educam o homem enquanto tal, e o colocam na posse de suas faculdades autênticas.
Dos diferentes humanismos da época, coletamos neste dicionário algumas amostras. Do humanismo florentino (Lorenzo Valla, Pico de la Mirándola, Marcílio Ficino). Do restante da Europa (Morus, Erasmo, Melânchton, Luís Vives, Lefevre D’Etaples).
BIBLIOGRAFIA: F. Hermann. Historia doctrinal del humanismo cristiano. Valencia 1962, 2 vols.; J. Gómez Caffarena. La entraña humanista del cristianismo. Estella 21987; H. de Lubac, El drama del humanismo ateo. Madrid 1967; Humanismo y Renacimiento (textos de Lorenzo Valla, Marcilio Ficino, Angelo Poliziano, Pico de la Mirándola etc.). Seleção de Pedro R. Santidrián. Madrid 1986. (Santidrián)
Humanistas (séc. XW-XVI)
Este não é o lugar apropriado para falar do termo e do conceito de “humanista”, “humanismo”. Nem queremos analisar a evolução do conceito até chegar a nossos dias. Queremos simplesmente aludir ao “humanismo” e aos “humanistas” tal e como se produziram e surgiram num período histórico (séculos XIV-XVI). Nosso interesse está centrado, particularmente, nas pessoas e valores que encarnam o chamado “humanismo cristão” desta época. Como em outras épocas e momentos, nosso dicionário quer coletar a forma pela qual os autores e suas obras captam, vivem e expressam o cristão. Tratamos basicamente do humanismo renascentista.
Partimos desta constatação: quando desde os séc. XIV-XVI falamos de um “humanismo cívico”, de uma “teoria humanista da educação”, de um “humanismo artístico”, de um “humanismo científico”, e até de um “humanismo utilitário”, devemos ter presentes duas coisas: a) Que o núcleo do humanismo era a preocupação íntima do humanista pela correção de seu texto: se retirarmos do termo “humanismo” o cheiro da lâmpada do erudito, estaremos utilizando-a de forma enganosa, b) De igual modo, percebe-se nele oposição a um cristianismo que “os humanistas desejavam, no geral, completar, não contradizer, através de sua paciente escavação da antiga sabedoria de inspiração divina” (Enciclopédia do Renascimento italiano).
Essa constatação, inclusive no chamado “humanismo paganizante”, é representada em grande parte pelos italianos, embora com notáveis exceções. O redescobrimento da Antiguidade suscitou um entusiasmo tão vivo que se esqueceram quinze séculos de cristianismo. Contudo, esse humanismo não é anticristão. Se, ao contrário, examinamos o “humanismo cristão”, vemos que se caracteriza por um retorno às fontes, ao evangelho, aos grandes textos da tradição, porém despojados dos acréscimos por certa teologia escolástica e pelos comentários medievais, que muitas vezes os falseavam.
Esse humanismo, caracterizado pelo amor e pelo estudo da sabedoria clássica e pela demonstração de sua concordância fundamental com a verdade cristã, produziu resultados admiráveis: a) Produziu uma pedagogia, base da revolução cultural, indispensável à sua época, e contribuiu poderosamente para colocá-la em prática, b) Exaltou o evangelismo como “philosophia Christi” e como modo de vida, refletido em tantas obras da época como o Enchiridion militis christiani (Erasmo) e Do beneficio de Cristo (anônimo, 1543). Nos dois encontramos que o “cristianismo é essencialmente interioridade e não consiste na observância dos ritos externos; é um combate contra as paixões, que nos eleva sobre os bens materiais até Cristo salvador”, c) Descobriu o conceito da função civil da religião e da tolerância religiosa (Morus): a cidade terrena deve realizar, enquanto seja possível, a harmonia e a felicidade da cidade celestial. A harmonia e a felicidade pressupõem a paz religiosa. O ideal da paz religiosa é a forma com que se apresenta tanto no Humanismo quanto no Renascimento, a exigência da tolerância religiosa, d) Finalmente, os humanistas rejeitaram a herança medieval e escolheram a herança do mundo clássico, porque queriam fazer reviver essa herança como instrumento de educação, isto é, de formação humana e social. O privilégio concedido por eles às chamadas letras humanas, ou seja, à poesia, à retóri-história, à moral e à política, fundamentava-se na convicção herdada também dos antigos, de que tais disciplinas são as únicas que educam o homem enquanto tal, e o colocam na posse de suas faculdades autênticas.
Dos diferentes humanismos da época, coletamos neste dicionário algumas amostras. Do humanismo florentino (Lorenzo Valla, Pico de la Mirándola, Marcílio Ficino). Do restante da Europa (Morus, Erasmo, Melânchton, Luís Vives, Lefevre D’Etaples).
BIBLIOGRAFIA: F. Hermann. Historia doctrinal del humanismo cristiano. Valencia 1962, 2 vols.; J. Gómez Caffarena. La entraña humanista del cristianismo. Estella 21987; H. de Lubac, El drama del humanismo ateo. Madrid 1967; Humanismo y Renacimiento (textos de Lorenzo Valla, Marcilio Ficino, Angelo Poliziano, Pico de la Mirándola etc.). Seleção de Pedro R. Santidrián. Madrid 1986. (Santidrián)