É a manifestação da índole psíquica ou de uma vivência passageira em formas aparentes do corpo ou no movimento voluntário ou involuntário e instintivo do mesmo corpo. Inclui-se aqui a expressividade dos olhos, da mímica do rosto, da atitude, da marcha (dança, pantomima, euritmia), etc. — Desde a antiguidade, a investigação científica procura distinguir e compreender melhor as formas particulares de expressão, indagar sua correspondência com determinadas configurações psíquicas bem como a gênese desta correspondência e tirar a limpo a importância e a repercussão das formas expressivas, na tarefa de configuração do espírito. Teofrasto, discípulo de Aristóteles, ocupou-se de semelhante tarefa, bem como o mestre de retórica, Quintiliano. No século XVIII, trabalhos de Gall, Lavaler, Engels e Goethe, despertaram interesse pela fisiognomia (teoria da expressão). No século XIX, Carus retomou esses trabalhos. Duchenne e Gratiolet investigaram, em clínicas de Paris, os movimentos expressivos. Darwin e, noutro sentido, Wundt formularam teorias sobre a gênese da correspondência entre vivência e expressão Piderit criou uma espécie de léxico dos movimentos de expressão. Klages constituiu cientificamente a doutrina da expressão, tomando para base a sua metafísica do espírito e da alma e fundou a grafologia científica (tudo da escrita como expressão da índole psíquica). O interesse pela psicologia das raças levou à teoria de F. Clauss sobre o tipo racial fisiológico como expressão do tipo racial psíquico primário. A doutrina da expressão de K. Buhler compendia os trabalhos anteriores e apresenta além disso uma ampla e sistemática teoria da expressão.
As formas de expressão assumem importância filosófica, porque dão a entender a íntima vinculação existente entre corpo e alma (relação entre corpo e alma), bem como o fato e a estrutura da natureza social do homem, pois o sentido último da expressão é, evidentemente, manifestar a outros as vivências internas. O impulso irresistível do homem para dar expressão sensível e simbólica ao psíquico, mediante o corpo e seus movimentos, funda-se não só na esfera biológico-instintiva de seu ser, mas também na natureza de seu espírito unido ao corpo. Ao invés, o cultivo ou o desleixo das formas expressivas do psíquico, sua autenticidade ou degeneração no falso ou meramente formalista, refluem também e são de grande importância para a estruturação e curso da vida psíquica consciente. — WlLLWOLL. [Brugger]
Neste artigo, tratamos das formas de expressão e exposição das filosofias, do significado do termo expressão na semiótica e na lógica e, por último, da expressão em estética.
FORMA DE EXPRESSÃO EM FILOSOFIA: estas formas foram e são muito variáveis: o poema (Parmênides, Lucrécio), o diálogo (Platão, Berkeley), o tratado ou as notas magistrais (Aristóteles), a diatribe (cínicos), a exortação e as epístolas (estoicos), as confissões (Santo Agostinho), as glosas, comentários, questões, disputas, sumas (escolásticos), a autobiografia espiritual (Descartes), o tratado à maneira da geometria (Espinosa), o ensaio (Locke, Leibniz, Hume), os aforismos (Francis Bacon, moralistas em geral, Nietzsche, Wittgenstein),etc. Quase todos os autores citados utilizaram outras formas de expressão, mas as mencionadas são tão caraterísticas de uma parte fundamental das suas respectivas filosofias que se levanta um problema: o da relação entre conteúdo (ideia) e forma (expressão, exposição).
Pode formular-se assim: “está a expressão ligada ao conteúdo?” A resposta é, em princípio, afirmativa. Uma filosofia exortativa como a dos estoicos novos não pode adotar por um tratado magistral; uma filosofia omni-compreensiva, como a dos tomistas medievais não pode utilizar a diatribe. Contudo, alguns autores, por exemplo Berkeley, defendem a tese contrária. A teoria bergsoniana da intuição filosófica pressupõe a independência da expressão relativamente à ideia (ou intuição), pois a primeira não é mais que o invólucro acidental da segunda; uma mesma ideia pode, pois, expressar-se de formas muito diferentes. Mais imparcial, parece afirmar que, em épocas diferentes de crise, se manifesta uma separação entre a expressão e o conteúdo e, em épocas mais estáveis, uma quase completa identificação entre eles.
O TERMO EXPRESSÃO NA SEMIÓTICA E NA LÓGICA usar-se este termo para designar uma série de signos de qualquer espécie numa linguagem escrita. São exemplos de expressões: “Buenos Aires é a capital federal da Argentina”, Vénus é um planeta que”, “175”, “regg tiel up”. Como se vê, é indiferente que uma expressão tenha significado dentro de uma dada linguagem. Requer-se apenas uma condição para que se possa falar de uma expressão: que tenha ou possa ter uma forma linear. Parece opor-se a esta condição o fato de certos signos não aparecerem linearmente em algumas expressões. Assim, o acento agudo em vendré não está ordenado da forma requerida. Contudo, os signos podem reduzir-se a uma forma linear, isto é, a uma série na qual cada um deles ocupa um lugar determinado. É frequente, na semiótica e na lógica, chamar expressão a qualquer sequência de signos em ordem linear ou redutível à ordem linear quando se quer evitar o uso de um vocábulo mais específico, tala como fórmula, proposição, etc.
A EXPRESSÃO EM ESTÉTICA: discutiu-se muitas vezes qual a relação de um conteúdo estético com a sua expressão. Por vezes, identificou-se esta com a forma. Mas como a forma tem um caráter universal objetou-se que, nesse caso, se deve identificar a expressão com um conjunto de normas ou regras de um caráter objetivo. Em suma, a expressão seria então a imitação. Para evitar esta objetivação da expressão, afirmou-se que a expressão é sempre, em todos os casos, de índole subjectiva e depende da experiência estética e suas inúmeras variações. Neste último caso, ligou-se a expressão à imaginação.
Na ética contemporânea, discutiu-se especialmente quais as relações da expressão com a intuição. Alguns autores distinguiram cuidadosamente entre ambas; segundo eles, a intuição (artística) pode manifestar-se em expressões muito diferentes. Croce, pelo contrário, defendeu que “a intuição é expressão e nada mais – nada mais e nada menos – que a expressão”. Segundo ele, em arte não há propriamente sentimentos; a arte é a expressão dos sentimentos (ou, se se quiser, os sentimentos enquanto expressos). [Ferrater]
L. Expressio; F. Expression; It. Expressione; I. Expression; A. Ausdruck.
Psic.: Ação que traduz uma realidade interior. As expressões pertencem ao mecanismo das emoções. Segundo Scheler, ap. Dwelshauvers, Traite, 407, a expressão seria a primeira coisa que o homem compreende do que o cerca. O que em primeiro lugar o menino percebe é a expressão: estrutura complexa que ao mesmo tempo engloba sentimentos e representações.
Fil.: Maneira de falar; enunciado ou notação que representa uma ideia ou uma relação entre certos termos.
Fnomn.: Na fenomenologia de Husserl, ap. Gurvitch, Tendances, 33, uma expressão não está apenas inseparavelmente ligada a uma significação; visa, também, por intermédio desta última, ainda outro correlativo, que Husserl, Investigaciones, designa de forma mais geral e indeterminada: objeto: “intencional” ou “fenômeno”. A relação de uma expressão com um objeto está constituída por sua significação na intuição. É muito importante notar que a significação não é nunca diretamente idêntica a seu objeto. Uma expressão designa alguma coisa e fala de alguma coisa; tem uma significação e tende para um objeto.
Husserl, Investigaciones, dedica todo o primeiro capítulo ao estudo fenomenológico da expressão e significação. [Soares]
(lat. expressio; in. Expression; fr. Expression; al. Ausdruck; it. Espressioné).
Em sentido geral e moderno, manifestação por meio de símbolos ou comportamentos simbólicos. Esse termo foi introduzido no uso filosófico na segunda metade do séc. XVII, quando começou a substituir o termo aparência para indicar a relação entre Deus e mundo, graças à qual o mundo é “manifestação” de Deus. Spinoza e Leibniz usam o termo nesse sentido. Spinoza diz que um modo da extensão e a ideia desse modo são “uma só e mesma coisa expressa de duas maneiras; o que parece ter sido vagamente entrevisto, por alguns hebreus, que apresentam Deus, o intelecto divino e as coisas por ele percebidas como uma e mesma coisa” (Et., II, 7, scol). Leibniz, por sua vez, considera as substâncias espirituais ou mônadas como “expressão ou manifestações” de Deus (Disc. de mét., § 9,14; Monad., § 60). Mas com Leibniz começa também a história moderna desse termo, que do domínio metafísico passa para o domínio antropológico, onde é empregado para designar o comportamento tipicamente humano de falar por símbolos ou utilizá-los. Leibniz diz: “O modelo de uma máquina expressa a máquina e, assim, um desenho plano em perspectiva expressa um corpo com três dimensões, uma proposição exprime um pensamento, um sinal expressa um número e uma equação algébrica expressa um círculo ou outra figura geométrica: todas essas expressão têm em comum o fato de que da simples consideração das relações da expressão pode-se chegar ao conhecimento das propriedades correspondentes da coisa que se quer expressar. Disso resulta que não é necessário pensar numa semelhança recíproca entre expressão e coisa, contanto que seja mantida uma certa analogia de todas as relações” (Quid sit Idea, Op., ed. Gerhardt, VII, p. 263). Essas considerações de Leibniz marcam a extensão do termo expressão a toda espécie ou forma da relação entre o símbolo e o que ele designa e constituem, portanto, também o início do uso desse termo para significar “frase”, “enunciado”, “fórmula”, etc. No trecho citado, Leibniz continua observando que “algumas expressão possuem fundamento natural, ao passo que outras, como as palavras da linguagem e os sinais de qualquer gênero, dependem, ao menos em parte, de uma convenção arbitrária”. E acrescenta que a ideia é uma expressão nesse sentido: “Embora a ideia da circunferência não seja semelhante à circunferência tal como esta é, na natureza da primeira podem ser deduzidas verdades que serão, sem dúvida, confirmadas pela experiência referente à circunferência real” (Ibid., p. 263). Começava a história moderna desse termo; com Kant ele entraria no domínio da estética. Com efeito, Kant utilizou o conceito de expressão para classificar as belas-artes. “Em geral, pode-se dizer que a beleza (da natureza ou da arte) é a expressão das ideias estéticas; a diferença entre natureza e arte é que na arte a ideia pode ser ocasionada por um conceito, ao passo que na bela natureza basta a reflexão sobre uma intuição dada, sem o conceito do que deve ser o objeto, para suscitar e comunicar a ideia, cuja expressão o objeto é considerado.” Portanto, para classificar as belas-artes, podemos utilizar “a mesma espécie de expressão que os homens utilizam para falar, para comunicar do melhor modo possível não só seus conceitos, mas também suas sensações”. E como essa espécie de expressão consiste na palavra, no gesto e no tom, Kant distingue as artes da palavra, as artes figurativas e as artes musicais. E acrescenta: “Poder-se-ia também conduzir essa divisão dicotomicamente, distinguindo as belas-artes nas que exprimem o pensamento e nas que exprimem a intuição; e estas últimas, segundo a forma ou a matéria” (Crít. do Juízo, § 51). Desse modo, a noção de expressão servia a Kant para interligar arte e linguagem, o que se manteria e reforçaria na estética contemporânea.
Por outro lado, o conceito de expressão era cada vez mais empregado para designar a relação entre as manifestações corpóreas das emoções e as próprias emoções: relação que, a partir da obra de Darwin (A expressão das emoções no homem e nos animais, 1872), mostrou-se essencial à teoria das emoções (v. emoção). Mas nem esse uso do termo, nem o uso ainda mais amplo que dele se fez em estética contribuíram muito para determinar o seu significado, que na maioria das vezes é pressuposto pelas investigações estéticas ou psicológicas, mas não é questionado nem esclarecido em suas possibilidades constitutivas. P. ex., não esclarece muito o significado de expressão a identidade estabelecida por Benedetto Croce, como fundamento da sua estética, entre intuição e expressão (Estética, cap. I). Veremos, aliás, que a tendência a identificar essas duas coisas constitui a fase primitiva do comportamento expressivo. Tampouco são esclarecedoras as determinações de Dewey, segundo as quais a expressão é “o aclaramento de uma emoção turva”, sendo, pois, a “objetivação da emoção” (Art as Experience, 1934, cap. IV). É provável que essas características possam ser atribuídas legitimamente à expressão estética, mas ainda não a descrevem suficientemente. Sem dúvida, é fonte de confusão a observação de Wölfflin de que “a arte é expressão, a história da arte é história da alma” (Das Erklären von Kunstwerken, 1921, § 3). Mais profícua foi a investigação sobre o conceito de expressão feita em campo estritamente filosófico. Dilthey já ressaltava em Construção do mundo histórico (1910) a função da expressão e, em primeiro lugar, da linguagem em relação ao pensamento discursivo do juízo (Aufbau, III, 1). E Husserl via na expressão a consecução perfeita dos atos significativos próprios da consciência teórica. Como tal, a expressão não é meio nem instrumento, mas um estado final, uma conclusão. “O estrato da E”, diz Husserl, “sem considerar que fornece expressão a todos os outros elementos intencionais é — e isso constitui a sua peculiaridade — improdutivo. Ou, se se quiser, sua produtividade, sua ação normativa, esgota-se na expressão e na forma do conceitual, que sobrevém nova com ele” (Ideen, I, § 124). Desse modo, Husserl acolhia em sua filosofia uma das características que hoje são consideradas próprias da expressão: ela não se limita a provir daquilo que expressa, mas, de certo modo, realiza-o e aperfeiçoa-o. Heidegger insistiu nesse caráter afirmando que “ao falar, o ser-aí se expressa, mas não porque esteja antes de tudo envolto num dentro oposto a um fora, mas porque, enquanto ser-no-mundo, já está fora, na sua compreensão”. Isso equivale a definir o homem com base em sua possibilidade de expressar-se, o que os gregos entreviram ao definir o homem como “animal racional” (em que razão equivale a “discurso”) (Sein und Zeit, § 34). Mas os esclarecimentos mais importantes sobre o conceito de expressão foram feitos por Cassirer. Ele mostrou a função constitutiva que as formas simbólicas exercem na construção da vida espiritual, de que não são aspectos acidentais e derivados, mas fatores condicionantes. Cassirer também foi quem mais contribuiu para esclarecer os caracteres e as condições da expressão. Distinguiu no desenvolvimento das formas linguísticas três estágios, que designou, respectivamente, expressão mimética, expressão analógica e expressão simbólica. Na expressão mimética ainda não há tensão entre o signo linguístico e o conteúdo intuitivo ao qual se refere: as duas coisas tendem a resolver-se uma na outra e a coincidir. “Só gradualmente encontramos uma distância, uma diferenciação crescente entre signo e conteúdo, e só então se realiza o fenômeno característico e fundamental da linguagem, a separação entre som e significado. Só quando essa separação ocorre, a esfera do significado linguístico constitui-se como tal. No início, a palavra pertence à esfera da mera existência: o que se aprende não é um significado, mas um ser substancial ou uma força sua” (Phil. der symbolischen Formen; trad. in., I, pp. 186 ss.; II, p. 237). Do mesmo modo, o mito não aparece, no início, como imagem ou “expressão espiritual”, mas como uma realidade objetiva ou arte essencial dessa realidade. Essa característica da expressão certamente é fundamental e constitui a confirmação, no plano antropológico, da diversidade entre a expressão e seu conteúdo, já evidenciada por Leibniz.
Podemos então resumir do seguinte modo as características fundamentais da expressão, tais como esclarecidas pela investigação moderna:
1) a expressão é uma consecução, um termo final, mais do que um instrumento ou um meio;
2) a expressão consiste em manifestar-se por meio de símbolos, sendo, por isso, um comportamento característico e próprio do homem;
3) a expressão, ao menos em sua forma madura, implica diversidade, “distância”, ou seja, alteridade entre símbolo e conteúdo simbólico (ou, como também se diz, entre símbolo e intuição correspondente) .
Pela primeira característica, a expressão se diferencia da comunicação, que tem valor instrumental: a linguagem como expressão não é um simples meio de comunicação, mas um modo de ser ou de realizar-se do homem. Nesse sentido, diz-se que a arte é expressão: nela, com efeito, os instrumentos de comunicação assumem valor final. Nesse sentido, Scheler afirma que o ato sexual é “um movimento de expressão, não um movimento com vistas a um objetivo”.. De fato, não se quer, no amor, o ato sexual (querê-lo significa inibi-lo), mas é o ato que exprime o amor, que é o seu modo de realização (Sympathie, I, cap. 7; trad. fr., p. 182). Pela segunda característica, a expressão é própria de qualquer espécie de comportamento que consista na produção ou no uso dos símbolos, estando, pois, ligada ao conceito geral de linguagem . Pela terceira característica, a expressão é diferente da intuição e de todas as relações de identificação. [Abbagnano]