O termo “categoria” pertence à mesma raiz que o verbo grego kategorein (v. kategoriai), que significa “exprimir, enunciar, declarar”. Sendo assim, as categorias significam as diferentes maneiras de expressão, de enunciação, e, por conseguinte, como é sempre o ser que se exprime de qualquer modo, significam as diferentes maneiras de ser. A mesma significação se encontra exatamente no latim “’praedicamenta”, vocábulo que, por seu turno, se relaciona com “praedicare” (enunciar, apregoar). A explicação etimológica do vocábulo mostra que as categorias estão intimamente ligadas ao juízo, no qual se dá a predicação: o que já foi posto em destaque não só por Aristóteles e pela escolástica, mas também por Kant. No juízo defrontamo-nos com uma desconcertante multidão de modos de predicar e de ser, p. ex., homem, mortal, grande, pensa. Quando nos propomos ordená-los metodicamente, verificamos que muitos deles se reduzem a outros. Surgem então sub-conceitos, conceitos inferiores ou subordinados, de mais restrita extensão, mas de maior compreensão, os quais aparecem como subdivisões ou subclasses de conceitos superiores de mais ampla extensão, mas de menor compreensão. Assim, “homem” é um sub-conceito de “ser sensitivo”, que, como conceito superior abarca o seres sensitivos dotados de razão e também os irracionais. Prosseguindo nesta ascensão, chegamos aos conceitos superiores últimos, os quais, por não serem sub-conceitos de unidades ainda mais elevadas, se chamam conceitos primitivos (conceitos fundamentais). Constituem estes a pluralidade primitiva e radicalmente diferenciada das categorias ou gêneros supremos. Acima delas está unicamente o ser, que, na realidade, não é nenhum gênero, mas do qual participam as categorias como sendo os originários modos de ser. Determinações primordiais (modi) do ser são, além das categorias, os transcendentais. As categorias recebem o nome de determinações particulares, porque fundamentam diversas ordens ou classes e designam sempre o que há de peculiar na ordem correspondente; ao passo que os transcendentais se denominam determinações comuns, porque dominam por igual todas as ordens e são comuna a todas. O ser e os transcendentais, pelo fato de se elevarem acima das categorias, são designados super-categorias. Ao invés, as categorias, com todos os gêneros que lhes são subordinados até à ínfima espécie, formam o reino dos conceitos categorias (predicamentais). Aos graus existentes dentro deste reino chamamos também graus metafísicos, porque são apreendidos mediante uma penetração na» coisas que transcende as manifestações fenomênicas da ordem física. A chamada árvore porfiriana (arbor Porphyriana), primeiramente traçada pelo» neoplatônico Porfírío, apresenta de maneira esquemática a hierarquia destes graus para a categoria de substância.
A filosofia ocupou-se sempre com a dedução de uma tábua completa das categorias. Aristóteles enumerou dez, contrapondo à substância a» nove classes de acidentes. Em conexão com isso, cita várias propriedades, comuns a todas ou diversas categorias e que se chamam depois pós-predicomentos (oposição, prioridade, posterioridade, simultaneidade, movimento e possessão). Este catálogo das categorias domina a escolástica e sua projeção ainda hoje perdura. S. Tomás de Aquino tenta justificar a sua necessidade interna. Encontramos nova organização das categorias principalmente; em Kant, o qual extrai de uma tábua dos juízos doze categorias, e em sua dedução transcendental pretende demonstrar que elas são necessárias e completas. Fichte considera insuficiente a tentativa kantiana, e empreende nova dedução, partindo da atividade pura do espírito. A lógica de Hegel é a tentativa mais acabada de tal dedução, levada a efeito, mas violentando os dados. Desde então até nossos dias, novas tentativas têm sido feitas no mesmo sentido. Todavia, aguarda-se ainda uma solução definitiva. Recentemente, a filosofia existencial (filosofia da existência) sublinha a diferença entre as categorias do meramente presente e os existenciais da existência humana. N. Hartmann alude também à modificação ou flexão das categorias noa estratos particulares do universo.
No que tange ao valor das categorias, reaparecem aqui todas as variedades de concepções que surgem no problema do conceito universal em geral. Em face do ultra-realismo dos platônicos ergue-se o conceptualismo. Aparentado a este é o idealismo transcendental de Kant, o qual atribui valor às categorias só para a coisa como fenômeno, não para a coisa em si. A doutrina aristotélico-escolástica é o realismo moderado. — Lotz. [Brugger]
Aristóteles foi o primeiro que usou “categoria” em sentido técnico. Às vezes pode traduzir-se por “denominação”; com maior frequência por “predicação” e “atribuição”. O mais corrente é usar simplesmente o vocábulo “categoria” que foi o que aqui adotamos. No tratado sobre as categorias, Aristóteles divide as expressões em expressões sem ligação – como “homem”, “é vencedor” – e expressões com ligação, como “o homem corre”, “o homem é vencedor”. As expressões sem ligação não afirmam nem negam nada por si mesmas, mas apenas ligadas a outras expressões. Mas as expressões sem ligação ou termos últimos e não analisáveis agrupam-se em categorias. Aristóteles apresenta algumas listas dessas categorias. A mais conhecida é: 1: substância, por exemplo “o homem” ou “o cavalo”; 2: quantidade, por exemplo “duas ou três varas”; 3: qualidade, por exemplo “branco”; 4: relação, por exemplo “duplo” “médio”; 5: lugar, por exemplo “no liceu”, “no mercado”; 6: tempo ou data, por exemplo “ontem”; 7: situação ou posição, por exemplo “deitado”, “sentado”; 8: posse ou condição, por exemplo “armado”; 9: ação, por exemplo “corta”, fala”; 10: paixão, por exemplo “cortado”.
Vamos mencionar em seguida, alguns problemas levantados pela doutrina aristotélica das categorias:
O primeiro problema é o da natureza das categorias. Propuseram-se várias interpretações de que mencionamos: 1: as categorias equivalem a parte da oração e, portanto, devem ser interpretadas gramaticalmente. Esta opinião esquece que uns elementos e os outros não são exatamente sobreponíveis e que Aristóteles trata das partes da oração – como o nome e o verbo – separadamente. 2: as categorias designam expressões ou termos sem ligação que, como o próprio Aristóteles assinala, significam a substância, a quantidade, a qualidade, etc. Esta opinião baseia-se numa interpretação linguística ou, melhor dizendo, semântica das categorias e tem um fundamento muito firme em muitos textos de Aristóteles. 3: as categorias designam possíveis grupos de respostas a certos tipos de perguntas: “o que é x?” “como é x?”, “onde está x?”, etc. Cada tipo de pergunta reconhece certos tipos de predicados, de tal modo que “os predicados que satisfizerem a mesma forma interrogativa são da mesma categoria”. 4: as categorias expressam flexões ou casos do ser e podem, por conseguinte, definir-se como gêneros supremos das coisas. É opinião tradicional, que é admitida não só pelos escolásticos, mas também por muitos historiadores modernos.
As categorias não são para Aristóteles, apenas termos sem ligação não utilitariamente analisáveis. Mas também diversos modos de falar do ser como substância, qualidade, quantidade, etc, o que seria impossível se o ser não estivesse articulado de acordo com esses modos de predicação. O segundo problema é o da relação entre a substância e as demais categorias. Embora seja certo que pode responder-se “Sócrates é uma substância” à pergunta “o que é Sócrates?”, acontece sempre que a categoria de substância se concebe como mais fundamental do que as outras, em virtude de conhecidos supostos filosóficos do Estagirita. Por outro lado, enquanto a substância se divide em substância primeira e segunda, nas demais categorias não aparece essa divisão.
O terceiro problema é o do conhecimento das categorias. Pode perguntar-se, com efeito, se o seu conhecimento é empírico ou não empírico. A solução de Aristóteles é intermédia. As categorias obtêm-se por meio de uma espécie de percepção intelectual, diferente da que descobre o princípio de não contradição, mas diferente também da que proporciona o conhecimento sensível. O quarto problema é o já mencionado sobre o número de categorias. as soluções são: a: um número indeterminado; b: um número determinado.
Esta última opinião, que é a tradicional, atem-se à lista de dez categorias. Pode perguntar-se agora se há precedentes para a doutrina aristotélica. Considera-se, usualmente, que os mais importantes se encontram em Platão. O mesmo problema se pode levantar quanto às doutrinas que se seguiram à de Aristóteles no decurso da filosofia grega. Parece provável que as noções de substância, qualidade, modo e relação propostas pelos estoicos eram uma derivação das categorias aristotélicas.
O problema das categorias passou, desde então, para a filosofia medieval, onde foi ampla e insistentemente tratado como doutrina daquilo a que se chamou os predicamentos. Estes eram também gêneros supremos das coisas, pelo que, como em Aristóteles, se distinguiu entre os predicamentos ou categorias e os predicáveis ou categoremas. Com efeito, os predicáveis são as coisas atribuídas ao sujeito segundo a razão do gênero, da espécie, da diferença, etc, enquanto os predicamentos consideram a coisa em si mesma, no seu ser e não no que há dela na mente e na intenção da mente. Daí que os predicáveis sejam fundamentalmente objeto da lógica, enquanto os predicamentos podem considerar-se objetos da lógica ou metafísica. Enquanto gêneros, deverão, além disso, conforme vimos, distinguir-se dos transcendentais do ser, os quais, como se sabe, se encontram na filosofia escolástica e em toda a ontologia tradicional para além de todo o gênero. Partindo desta base, os predicamentos dividiam- se, na escolástica, de acordo com a tábua aristotélica.
Na época moderna, a doutrina das categorias seguiu, imediatamente, o destino das sucessivas reelaborações metafísicas, pois dependia da concepção do ente pelo fato de este se articular ou flexionar de uma determinada maneira. No , as categorias compreendiam geralmente a substância e os seus modos. Assim, em Leibniz, as categorias admitidas são substância, quantidade, qualidade, ação ou paixão e relação. Mas já na medida em que o pensamento moderno – racionalista ou empirista – se move na direção que irá desembocar em Kant, a categoria vai-se convertendo, como em Locke, em “função do pensamento”. Mas a transformação radical apareceu apenas com a doutrina kantiana. Kant formulou na ANALÍTICA TRANSCENDENTAL, uma doutrina sistemática das categorias enquanto conceitos puros do entendimento “que se referem a priori aos objetos da intuição em geral com funções lógicas”. Seguindo alguns precedentes modernos, especialmente de origem cartesiana, Kant alega que a enumeração aristotélica carece de princípio, o que além do mais, foi rejeitado pela tradição escolástica, que insiste no fato de os predicamentos aristotélicos se fundarem na própria natureza das coisas. mas ele assinala que, além de incluir na sua enumeração modos da sensibilidade pura, Aristóteles conta como conceitos originários alguns conceitos derivados. Para obviar a isso, estabelece uma tábua de categorias, deduzidas do único princípio comum da faculdade do juízo; Assim, chega a um sistema de categorias que compreende: as categorias da quantidade (unidade, pluralidade, totalidade); as categorias da qualidade (realidade, negação, limitação); as da relação (substância e acidente; causalidade e dependência; comunidade ou reciprocidade entre agente e paciente); as de modalidade (possibilidade–impossibilidade; existência–não existência; necessidade–contingência). São estas as categorias originárias, junto das quais cabe mencionar as derivadas, que Kant chama predicáveis do entendimento puro, em oposição aos predicamentos. As categorias são constitutivas, isto é, constituem o objeto do conhecimento e permitem, portanto, um saber da natureza e uma verificação da verdade transcendental. O problema das categorias como problema fundamental da crítica da razão conduz ao problema da verdade como questão fundamental da filosofia. A dedução transcendental das categorias é “a explicação do modo como se referem os conceitos a priori a objetos e se distingue da dedução empírica, que indica a maneira como um conceito se adquiriu por meio da experiência e da sua reflexão”. O sentido construtivo dos conceitos puros do entendimento tem a sua justificação em que, só por eles, pode o sujeito transcendental pensar os objetos da natureza e conceber esta como uma unidade submetida a leis. Mas, ao mesmo tempo, este pensamento das intuições sensíveis por meio das categorias é possível porque há sujeito transcendental, consciência utilitária ou unidade transcendental da apercepção.
As categorias em sentido kantiano, são conceitos fundamentais mediante os quais se torna possível o conhecimento da realidade fenomênica. Não se referem às coisas em si, visto que nada podemos saber (racionalmente). Depois de Kant, e em grande parte como consequência de se ter posto de lado a noção da coisa em si, o problema das categorias volta a adquirir um aspecto metafísico. Contudo, no decurso da evolução das doutrinas categoriais durante o século XIX, houve uma forte tendência para acentuar o caráter objetivo das categorias. [Ferrater]
Em grego kategoriai (acusação), que significa, originalmente, o predicado de uma proposição. Aristóteles chama, portanto, “categorias do ser”, ou, por abreviação, categorias, as diferentes modalidades do ser, enquanto estas constituem diferentes classes de predicados, que se podem atribuir a um sujeito qualquer. Estabelecer certas distinções a este respeito, é algo que se impõe para um pensamento que trata de sistematizar da forma mais elementar a variedade encontrada no mundo. E fácil verificar que as coisas individuais se unem em espécies e que até coisas especificamente diferentes ainda obedecem a classificações genéricas. Mas, quando se diz de um sujeito que é “amarelo”, “animal” e “um”, procura-se em vão um conceito genérico, que abranja todas essas classes de predicados. Há, por conseguinte, predicados e, ao mesmo tempo, classes do ser, que constituem gêneros supremos, que não podem ser reduzidos a um outro gênero de carácter mais universal. O que é comum a estes diferentes gêneros supremos é que todos eles apenas constituem uma modalidade do ser; porém, ser não é um gênero, em sentido próprio, porque não pode ser atribuído de maneira unívoca aos seus respectivos (pseudos) sub-gêneros.
Aristóteles investigou, sistematicamente, quantas de tais modalidades do ser podem ser encontradas. Em diferentes obras, ele dá diferentes enumerações. A lista mais completa contém as seguintes dez classes: ousia (substância); poson (quantidade), poion (qualidade), pros ti (relação), pou (onde), pote (quando), keisthai (situação), exein (hábito), poiein (ação), paskeie (sofrer passivamente).
Não há nada no mundo absolutamente que não pertença a um desses dez gêneros supremos, se a lista é de fato completa. E há um consenso geral, que essas dez categorias aristotélicas não esqueceram nada, e esgotam, efetivamente, as possibilidades do ser. Mas é outra questão se todas as dez são de fato conceitos independentes. Muitas vezes foi feita a tentativa de reduzir uma ou outra categoria às restantes, diminuindo, assim, o número.
A primeira categoria (substância) aparentemente difere da maneira fundamental de todas as outras pela preferência metafísica de representar ela um modo de ser independente, ao passo que todas as outras nove modalidades têm em comum a dependência de uma substância, dentro da qual constituem um ser inerente. Em vista disso, Aristóteles compreende essas nove categorias pelo nome de acidentes, e contrapõe-nas à substância. Mas autores posteriores salientaram, também, que o “acidente” não constitui nenhum conceito genérico em sentido estrito: o carácter do ser só se pode atribuir analogamente às diferentes categorias.
A categoria keisthai, que traduzimos por situação, indica a posição de um corpo, como a de um homem, quando está de pé ou sentado ou deitado, etc, e concerne, portanto, à ordem das diferentes partes de um corpo entre si. O pou (onde) refere-se à posição dentro do espaço. A categoria exein traduzimos por hábito, termo ambíguo, inclusive na terminologia latina, pois habitus é o que um sujeito «habet» (habere = ter, possuir), como os vestidos, a ornamentação e outros objetos ou caracteres adquiridos, que constituem uma determinada espécie de posse metafísica por parte do sujeito. Esse hábito, que constitui uma categoria própria (habitus praedicamentalis) não deve ser confundido com o hábito qualitativo, a habilidade que se situa entre a possibilidade (potência) e a atualização, e que faz parte da categoria da qualidade. (P. ex.: o hábito de falar bem uma certa língua é uma qualidade, assim como a beleza também é uma qualidade, e assim a brancura).
Encontra-se, também, em Aristóteles uma classificação do ser em só três categorias, a saber: substância, qualidade ou carácter em geral (pathos) e relação. As opiniões divergem sobre se Aristóteles reclama para a sua relação de dez categorias um valor final e exaustivo, ou se ele mesmo vacila quanto ao número das mesmas. Há certa força de convicção na tese de que ele considerou a multiplicidade do ser e dos predicados lógicos exaustivamente representados nessa lista, porém talvez alimentasse a esperança de, em uma elaboração ulterior e jamais levada a cabo, poder simplificar e aprofundar o assunto, mesmo sacrificando o número de dez.
Essas categorias foram amplamente discutidas por filósofos antigos posteriores a Aristóteles. Os estoicos e os neo-platônicos tomam a palavra categoria no mesmo sentido, mas oferecem listas diferentes. Plotino também toma «categoria» no sentido aristotélico, mas enumera como tais os cinco megista gene (gêneros supremos) de Platão, naturalmente não sem lhes mudar muito a significação original.
As categorias aristotélicas do ser passaram a ser problemáticas quando surgiu o criticismo kantiano. O mundo que tinha agora de ser classificado era o mundo dos conceitos, e dos conceitos não em relação ao seu conteúdo material, o que não teria mudado em nada a classificação aristotélica, mas os conceitos como tais, enquanto são formas a priori do nosso conhecimento, e representam as formas fundamentais do pensamento discursivo.
Kant empreendeu essa nova classificação, e as categorias, que ele dá como «Stammbegriffe des reinen Verstandes» (conceitos fundamentais do entendimento puro) são deduzidas da natureza do juízo, e representam diferentes formas do mesmo. Há tantas formas de juízo quantas maneiras fundamentais de pensar sobre os objetos possíveis do nosso entendimento.
As formas de juízo, porém, são. segundo Kant: 1) singular, particular e universal, 2) afirmativo, negativo e indefinidos, 3) categórico, hipotético e disjuntivo, 4) problemático, assertórico e necessário (apodítico). A eles correspondem os quatro grupos de categorias, dos quais cada uma Contém três categorias ligadas entre si por um certo princípio, que faz aparecer, cada vez, a primeira como uma tese (uma afirmação), a segunda como uma antítese (contrária à anterior) e a terceira como uma síntese (uma reconciliação das duas anteriores).
Assim Kant chega à seguinte tábua de categorias: 1) Categorias da quantidade: Unidade (Einheit), Pluralidade (Vielheit), Totalidade (Alheit); 2) Categorias da qualidade: Realidade (Realität), Negação (Negation), Limitação (Limitation); 3) Categorias de relação: Substancialidade (Substantialität), Causalidade (Causalität), Reciprocidade (Wechselwirkung); 4) Categorias de modalidade: Possibilidade (Möglichkeit), Actualidade (Wirklichkeit), Necessidade (Notwendigkeit). O fato de encerrar este quadro um aspecto simétrico pelo princípio de tese, antítese, parece remover dessa classificação o carácter de arbitrariedade, e elevá-la a um alto grau de certeza e de necessidade. Sem dúvida, este aspecto fascinou bastantes pensadores, como Fichte, Schelling, Hegel, que, de uma ou de outra maneira, alimentaram a esperança de poder construir uma lista de categorias, partindo de um único princípio constitutivo do processo do pensamento. Kant não fez essa tentativa; nem ele explica qual foi o princípio metodológico que o guiou na pesquisa referente às suas categorias, nem se ele procurou tal princípio. Não obstante, ele está convencido de ter oferecido uma lista completa e exaustiva. Outros filósofos muitas vezes se perguntaram de onde lhe provinha essa convicção. Por outro lado, a crítica das categorias kantianas se limitou a afirmar um ou outro entrecruzamento e identidade parcial entre as diferentes categorias, não podendo, porém, qualificá-lo de incompleto. A procura de um princípio único, como ponto de partida para uma classificação universal, como se verifica no pensamento pós-kantiano, levou a uma mudança bastante radical do sentido do termo categoria, que passou, então, a significar cada princípio lógico fundamental.
O método dialéctico de Hegel baseia-se na convicção de que as formas categóricas provém primitivamente do pensamento e estão sintonizados umas com as outras. Kant nunca ensinou tal coisa, pois a sua lista de categorias estava cheia de reminiscências metafísicas e cosmológicas. Esse assunto é especialmente ventilado por Emil Lask, que concebe as formas lógicas — em oposição a Hegel — como derivadas do mundo objectivo e, portanto, espelhando, em sua constituição estrutural o material ôntico do qual foi tirado. “A cada especificação essencial do material corresponde sua própria forma categórica”. A multiplicidade das categorias irredutíveis é uma resposta do Logos à multiplicidade irracional da matéria. É impossível compreender a multiplicidade das formas categóricas de uma maneira puramente lógica. A diferenciação categórica está diretamente oposta à dedução dialéctica de Hegel. As categorias não se dirigem uma contra a outra, mas cada uma contra a sua matéria. As teorias opostas de Hegel e de Lask conservaram cada uma um traço da concepção original do termo «categoria»; a hegeliana, o carácter universal e exaustivo do princípio categórico, e a de Lask, a relação ôntica. De resto, a expressão «forma categóricas torna-se quase sinônima de forma lógica. Com isto o problema das categorias deixa de ser o da classificação da uma totalidade, quer ontológica quer lógica, e se torna um problema psicológico evolutivo de como foram constituídas aquelas formas lógicas, que se chamam agora categorias.
Bergson opina que o nosso pensamento categórico (em oposição à intuição; está de conformidade com certas necessidades da vida corporal e prática, e representa só uma adaptação superficial do espirito ao mundo material. A matéria tem que ser desorganizada para satisfazer a essas nossas necessidades. O nosso conhecimento seria, então, nem conforme à estrutura fundamental do nosso espírito, representando, somente, os seus hábitos superficiais e adquiridos (contra Hegel), nem conforme à organização própria da matéria da qual só oferece frações em elementos justapostos. Essa relatividade do nosso conhecimento, é, porém, segundo Bergson, não definitiva. É só preciso desfazer o que essas necessidades práticas fizeram (quer dizer: desfazer as categorias lógicas) e restabelecer a intuição em sua pureza primitiva e voltar, desse modo, a ter contacto com o real.
O ponto de vista bergsoniano parece conciliante quanto à oposição entre categorias primitivas (Hegel) e categorias adquiridas, porém parece muito radical na exigência de «desfazer» as categorias. De fato, o próprio Bergson mostra ainda um outro caminho para chegar a conhecimentos exatos da realidade, com conservação do pensamento categórico, que só exige uma retificação posterior, semelhante a um calculo integral para reconstruir a forma de uma curva matemática. Contudo, em Bergson, uma vez adquirida a forma categórica, o seu carácter a priori parece firmemente estabelecido, pelo menos quanto à universalidade de sua valia, já que o carácter apriorístico, em sentido estrito, parece evaporado pela descoberta decepcionante da sua aquisição evolutiva.
Max Scheler opõe-se também à universalidade do a priori. Segundo ele, a tábua de categorias, estabelecida por Kant, não é mais que o sistema categórico de uma época particular da Europa ocidental. Cada época histórica, e cada totalidade cultural, tem a sua própria «razão apriorística», seu modo próprio de apreender o mundo, sua própria maneira apriorística de intuição e de pensamento, de preferência, de amor, etc. A observação de variabilidade dos a priori subjetivos, relativos a grupos e a épocas históricas, constitui — segundo Scheler — uma das tarefas essenciais da Sociologia da cultura. Scheler confessa, com isso, que o trabalho de «observar» a variabilidade das categorias apriorísticas ainda está paia fazer. De onde lhe vem, então, o conhecimento? Observou Scheler uma diferença entre o conceito da causalidade no Japão e em Königsberg? Certamente, não. Trata-se aqui antes, de um mero-relativismo postulativo, proveniente de uma determinada teoria psicológica, que deixa prever uma tal variabilidade das categorias, sem, no entanto, poder avaliar o seu alcance prático. Mas, ainda assim, aquela relatividade, segundo Scheler, também é provisória ou, pelo menos, pode ser superada por meio de uma «funcionalização da intuição essenciais (Funktionalisierung der Wesensschau) no pluralismo de vias de acesso a essa intuição, partindo cada qual do seu ponto relativo, eliminando as «ilusões colectivas», que lhe aderem em virtude do seu a priori subjectivo, e movimentando-se em direção à apreensão total da realidade expressa simplesmente uma afirmação ou negação sem estar ligado. Vide acidente predicamental.
CATEGORIAS DE ARISTÓTELES — Classificava-as da seguinte forma:
a) o ser como existir em si, categoria da substância (ousia);
b) os modos de ser do ser que existe em si, os acidentes. [MFSDIC]