VIDE teleologia
(in. Purposiveness, Finality; fr. Finalité, al. Zweckmässigkeit; it. Finalita).
Correspondência entre um conjunto de coisas ou de acontecimentos e um fim. Assim, p. ex., a finalidade de um plano ou de um projeto é a correspondência ou a adequação desse plano ao fim a que visa. A finalidade da natureza é a correspondência da natureza com os seus supostos fins, etc. Essa palavra não se aplica, pois, exclusivamente à causalidade dos fins da natureza (à qual se aplica a palavra finalismo), mas em geral designa certa forma de organização ou ordem. [Abbagnano]
O caráter do que tem um objetivo. — Uma explicação pela finalidade, ou explicação final, explica uma ação pelo seu fim, sua intenção. Opõe-se à explicação causal, que explica o que é pelo que a precede: a explicação final nos diz “em vista de que” um acontecimento se produz; a explicação causal, “por quais intermédios” se produziu. A finalidade, que é muitas vezes antropomórfica, encontra, contudo, um uso positivo em biologia e em psicologia, onde é impossível isolar um elemento da totalidade (do organismo ou do psiquismo) a que pertence: a psicanálise explica um sonho pelo seu fim, seu objetivo, sua “intenção”; da mesma maneira que se explica a existência do “fígado”, por exemplo, pela sua função no organismo. Para os acontecimentos da natureza, a explicação final por uma intenção permanece uma explicação do tipo “mágico”. [Larousse]
Designa a orientação de um ente para um fim, no qual alcança a complementação e perfeição correspondentes à sua essência. A finalidade funda-se no fato de que todo ente, enquanto tal, possui um sentido em seu ser e agir, o qual se exprime no princípio geral de finalidade (princípio de finalidade). A realização metafísica do sentido encontra sua expressão empiricamente apreensível em sistemas ou estruturas de ordenação (ordem), da mais diversa natureza e complexidade. Como o sentido e a unidade, que intimamente a rege, só são compreensíveis, do ponto de vista do fim, tais sistemas recebem o nome de teleológicos ou finais, quer sejam ordenados a dito fim desde fora, quer tendam para ele em virtude de um princípio interno. — A finalidade pode apreender-se com a máxima claridade no homem que, com conhecimento e determinação conscientes do fim, procura livremente consegui-lo (finalidade plena e intencional, autônoma ou auto-fundamentada). Aqui se manifesta a maneira como o fim precede a ação e, por autêntico influxo causal (embora não eficiente) sobre a causa eficiente, é motivo último de sua própria realização. Nos seres inferiores ao homem, a experiência não permite conhecer, senão em parte, os elementos constitutivos da finalidade neles existente, finalidade que, por esse motivo, se denomina também finalidade incompleta ou natural (1). Os restantes elementos devem deduzir-se da realização geral do sentido por parte do ente e das manifestações ordenadas especiais em que essa realização nos aparece. A finalidade natural mostra-se, além disso, como heterônoma (condicionada de fora ou imposta). Existe finalidade externa ou extrínseca ou finalidade de ordenação acidental, quando o estar dirigido para um fim é imposto de fora, p. ex., à seta pelo frecheiro, ao relógio pela união mecânica das partes; finalidade essencial interna ou intrínseca ou imanente é a que corresponde à coisa de maneira natural, de sorte que a coisa “aspire” (apetite) ao fim e o alcance, por sua própria atividade natural. Segundo o ponto de vista em que nos situemos, distinguem-se, outrossim, a. finalidade estática ou estrutural e a finalidade dinâmica ou natural (2), assim como também a finalidade ao serviço do mesmo sujeito ou da espécie (auto-teleologia) e a finalidade ao serviço de seres estranhos ao sujeito ou à espécie (hetero-teleologia). A finalidade imanente, peculiar a todos os seres vivos, pressupõe sempre na coisa um fundamento substancial e próprio desta (forma, enteléquia, princípio vital). A finalidade do cosmos em conjunto deve ser considerada como finalidade de ordenação.
É inevitável aceitar uma teleologia essencial constitutiva, na qual, mercê de sinais característicos de finalidade, tais como se apresentam, a quem estiver imune de preconceitos, na ontogênese, na regeneração, etc., dos organismos, se pode provar a existência de um autêntico apetite natural e de sua constante realização em manifestação ordenada. Os sistemas inorgânicos (de estrelas, de cristais, o sistema periódico dos elementos) insinuam também, segundo muitos autores, uma consideração teleológica. No que tange ao todo complexo do cosmos (mundo inanimado e reino da vida), não resta dúvida que ele mostra relações de finalidade. Os grupos parciais não se chamam uns aos outros à existência por via de causalidade eficiente (p. ex., os vegetais não são efeito necessário do cosmos inorgânico), e os grupos cronologicamente posteriores e de constituição mais elevada obedecem a leis que lhes são próprias, diante do» primitivos e mais imperfeitos. Portanto, a dependência mútua e regulada por leis, que, apesar do que se disse, existe efetiva e contingentemente (contingente), não é possível sem o influxo ordenador de uma causa eficiente e racional supra-cósmica. — A causa final, por cuja influência a ação tende para um fim, não substitui a causa eficiente, uma vez que o fim só se realiza e alcança pela ação de causas eficientes. A necessária intervenção destas para a consecução do fim é o que induz a ver nas causas eficientes as únicas que fundam o conhecimento, atitude esta injustificada que se verifica nalguns setores da moderna investigação da natureza. A investigação das causas eficientes (“análise causal”) dá a explicação (explicar) dos processos naturais; pelo contrário, a da finalidade faz penetrar em sua significação mais profunda e permite uma compreensão (compreender) mais ampla do conjunto da natureza.
Movidos por preconceitos de ordem epistemológica, Kant e seus sucessores concebem a finalidade, não como princípio constitutivo do real, mas como mero princípio regulador da faculdade de julgar (juízo, faculdade de julgar) que investiga e busca a unidade (criticismo). Incapaz de fundamentar a finalidade é a hipótese do acaso: o acaso, de acordo com seu conceito, não explica nenhum acontecimento subordinado a leis. — O panteísmo, o pan vitalismo e o pampsiquismo tentaram encontrar fundamentações autônomas da finalidade. A fundamentação panteísta desmorona-se juntamente com o sistema do panteísmo. Segundo o pan-vitalismo (hipótese cosmo-orgânica), o todo cósmico constitui uma substância vivente, dotada de enteléquia total ou alma do mundo, da qual as ordens finais parciais tiram sua finalidade imanente. Contra esta opinião, convém notar que a diversidade essencial de tais ordens, entre si ontologicamente irredutíveis, contradiz a unidade substancial do cosmos (vitalismo, vegetal, animal). — O pampsiquismo reduz todos os processos teleológicos nas plantas, nos animais e até no inorgânico, a um pensar e querer subjetivo–racional de causas eficientes individuais, uma vez que um operar racional comunicado só objetivamente, ou seja, só na execução concreta, seria uma contradição. Contudo, a experiência mostra o contrário. O relógio, por exemplo, sem ser dotado de razão, executa o plano e o desígnio racional do homem. De maneira análoga, embora essencialmente mais perfeita, a saber, mediante a finalidade substancial nelas posta, as coisas da natureza inferior ao homem realizam o plano e a intenção de seu Autor supramundano; sua finalidade é natural, mas imposta (vitalismo, princípio vital). — Heterônoma, mas não levada até às derradeiras conclusões, é a fundamentação da finalidade mediante algo “psíquico supra-individual”, que se não determina o que seja (enteléquias de grupos ou de espécies ou ideias universais em sentido platônico). Nada se diz de definido acerca da maneira como se individualizam nos seres individuais estas enteléquias grupais ou ideias grupais. Aliás, elas podem ser explicadas pelo recurso a uma causa absoluta última, racional e supra-cósmica, que reúna no conjunto do cosmos todos os grupos e ideias grupais, causa que nós denominamos Deus. — Frank (Haas). [Brugger]
Fim pode significar terminação limite ou “acabamento de uma coisa ou de um processo”. Pode ser compreendido: a) em sentido primariamente temporal, como o momento final, b) em sentido primariamente espacial, como o limite; c) em sentido de intenção, ou “cumprimento de intenção”, como propósito, objetivo, finalidade. Desde Aristóteles tem-se compreendido com frequência a noção de fim (e a de finalidade) em relação com a ideia de causa. O fim é “causa final”, ou “aquilo porque” algo se faz. Assim, a saúde é fim (ou causa) do passear, pois passeia-se com o fim de conseguir ou manter a saúde. Às vezes é difícil distinguir-se entre o fim como causa final e o fim como causa eficiente. às vezes, em contrapartida, como sucede com as ações humanas, o fim como causa final é primeiro princípio do obrar (Ética a Nicômaco).
Convém distinguir o ser para o qual algo é um fim e o próprio fim. De acordo com Aristóteles, no segundo sentido o fim pode existir nos seres imóveis, mas não no primeiro sentido a distinção entre a causa final e o próprio fim exprime-se com frequência na linguagem ordinária mediante a distinção entre o fim e a finalidade. Nem sempre é unívoca a linguagem de Aristóteles. Por exemplo, na física e na metafísica o fim é o termo para que aponta a produção de algo. Na ética, em contrapartida, o fim é o termo para que aponta a execução de algo, do propósito. A semelhança e dissemelhança simultânea do conceito de fim em metafísica e em ética reaparece nos escolásticos, embora sempre exista neles a tendência para entender o conceito de fim com base no exame da ideia de fim em geral tal como se realiza na doutrina das causas. Pode servir de exemplo a sentença de S. Tomás: “o fim não por causa de outras coisas, mas outras coisas por causa do fim”. O fim é o que explica porque (ou melhor, para quê)opera a causa eficiente. Os escolásticos distinguiram entre o fim objetivo e o fim formal. O fim objetivo é a própria coisa querida (o que no nosso vocabulário chamamos a finalidade). O fim formal é a consecução ou a possessão do fim objetivo (o que temos chamado simplesmente fim). Mesmo quando na época moderna, especialmente em Descartes e Espinosa, se produziu uma rejeição da consideração da causa final, em física e em metafísica, há sistemas, como o de Leibniz, que propõem uma revivência das causas finais, entendendo especialmente que não há contradição entre as causas eficientes e as causas finais e que é possível conseguir uma conciliação harmoniosa de ambos os membros. [Ferrater]
Esta conexão da estrutura psíquica é ao mesmo tempo teleológica. Uma conexão que tem a tendência a produzir a plenitude vital, a satisfação dos impulsos e a felicidade, é uma conexão finalista. Na medida em que as partes estão unidas entre si na estrutura de tal modo que sua ligação é apropriada para provocar a satisfação dos impulsos e a felicidade, bem como afastar as dores, chamamo-la teleológica. Somente na estrutura psíquica se dá originariamente o caráter da finalidade, e ao atribuirmos finalidade ao organismo ou ao mundo estamos transferindo este conceito do viver íntimo. Pois toda relação de partes a um todo somente recebe o caráter de finalidade do valor nela realizado, este valor só é experimentado na vida sentimental e impulsiva. (Ideen uber eine beschreibende und zergliedernde Psychologie, cap. VII) [Dilthey]