divino

Segundo a sua [de Walter Otto] concepção não podemos apelar, pretendendo fundamentar e explicar o aparecimento da religião e da cultura, para um conjunto de aspirações, necessidades e ideais humanos, pois essas forças em sua modalidade histórica já supõem em aberto o espaço de sua manifestação. Finalidades, ideais, necessidades, sonhos, já são Einzelformen eines Gesamtstiles des Lebens [fórmulas singulares de um estilo integral de vida], desempenhos intramundanos, que supõem e pressupõem uma dotação de sentido prévio.

Essa dotação de sentido é o resultado emergente de uma epifania do divino, daquela poesia em si e por si de que falava Schelling: “A epifania majestosa”, diz-nos Walter Otto, “em cujo quadrado o homem recebe a sua própria imagem e irradia também a partir de si mesmo aquele Todo em movimento que denominamos o estilo total da vida. No começo está sempre Deus”. [ W. F. Otto, Dionysos: Mythos und Kultus. Coleção Frankfurter Studien zur Religion und Kurtur der Antike, Band IV. Frankfurt, Klostermann, s/d, p. 30.] Em consequência, a Manifestação mítico-divina que estilizava e põe em movimento um ciclo histórico, de todas as coisas reais ou atuantes, é a mais real ou atuante (von allem wirklichen, das Wirklichste [de todas as coisas reais ou atuantes, é a mais real ou atuante]). Não só o divino ou o mito formador da cultura e da história absorve em si a realidade de todo o real, que nada mais é que sua expressão, mas também a atuação de Todo o atuante. A verdadeira atividade ou produtividade, a autêntica capacidade de criação pertence exclusivamente, segundo Otto, à Erscheinung der Gottheit [aparição da divindade]; dela depende o grande ato criador (no sentido transcendental-projetivo) que desenha todas as formações particulares de uma cultura. Nada que no mundo teria demonstrado, através do tempo, uma tal capacidade criadora ou produtiva, no sentido de possibilidade do possível, como das Bild der Göttlichen [a imagem do divino]. A revolução do divino é o fenômeno originante de uma forma vital, revelação determinada na acepção frobeniuseana de uma Ergriffenheit. Quando Walter Otto afirma que “no começo está sempre Deus”, não devemos imaginar essa revelação como uma ideia subjetiva, um pensamento humano, pois, como vimos, a própria imagem do homem com suas forças e possibilidades é determinada abalio pela Offenbarung do divino. [VFSTM:171-172]