TOMÁS DE AQUINO (Santo), teólogo italiano (castelo de Roccasecca, no reino de Nápoles, 1225 — Fossanova 1274). É o maior teólogo da Igreja católica. Descendente de uma nobre família lombarda, recebeu o hábito dos dominicanos em 1240 ou 1243, apesar da oposição de seus pais. Raptado por seus irmãos (1244), resistiu a todas as tentações (daí advindo seu cognome de “Angélico”) e pôde juntar-se novamente à sua ordem. Lecionou em Paris no convento Saint-Jacques (1252) e depois na Universidade de Paris (até 1259). Voltou em seguida para a Itália, para a Corte pontifical (1259). Aprofunda então a filosofia de Aristóteles, que deveria servir de moldura à sua doutrina; voltou a Paris em 1269, onde continuou a redação da Suma teológica (1266-1273). Morre em 1274, indo de Nápoles para o concílio de Lyon. Lógico, metafísico e teólogo, Santo Tomás tenta conciliar a filosofia racional de Aristóteles com a fé cristã; estabelece uma harmonia entre o que é “sabido” e o que é “acreditado”. Onde a reflexão filosófica cai em contradições (sobre o problema da criação no tempo, por exemplo), Santo Tomás de Aquino remete à fé, É o fundador da “ciência” teológica como ciência teórica (e não apenas prática, como sustentariam Duns Scot e de Occam). Malgrado o acento aristotélico de sua doutrina, o tomismo se inspira diretamente nos Padres gregos e no Pseudo-Denys: parte de Deus, desce aos anjos e aos homens para em seguida subir, através da Igreja e dos sacramentos, a uma teoria da vida futura. O gênio de Santo Tomás foi acompanhado por uma autêntica santidade (foi canonizado por João XXII desde 1323). Combatido pelos discípulos de Duns Scot e de Occam, o tomismo só se desenvolveu a partir do fim do século XVI, quando a Suma torna-se o texto de base para os estudos. Contudo, é somente em 1879 que o papa Leão XIII, alarmado pelo nível excessivamente baixo nos seminários e nas universidades católicas, impôs o estudo de Santo Tomás. Foi então que o Monsenhor Mercier, em Louvain, tentou rejuvenescer a tradição fundando a escola neotomista, sempre viva, e que procura incorporar ao tomismo as escolas mais recentes (atualmente, a fenomenologia e o existencialismo). Filósofos como Jacques Maritain e sobretudo Etienne Gilson procuraram destacar o que o tomismo tem de universalmente válido. [Larousse]
Tomás de Aquino, Santo (1224-1274)
Conhecido com diferentes nomes, como “Doctor Angellicus”, “Doctor Communis”, “Divus Thomas”, “Anjo das escolas” e outros. Encontramo-nos diante de uma figura excepcional, tanto por seu pensamento e por sua obra, quanto por sua influência na vida e no pensamento da Igreja posterior.
Tomás, da família dos condes de Aquino, nasceu no castelo de Rocaseca (Aquino-Nápoles). Realizou seus primeiros estudos na abadia beneditina de Monte Cassino. Iniciou os estudos superiores na Universidade de Nápoles, ingressando em 1243 nos dominicanos dessa mesma cidade. De 1245 a 1248 estudou em Paris sob o magistério de Santo Alberto Magno, a quem seguiu até Colônia, onde permaneceu entre 12481252. Nesse último ano voltou a Paris como “leitor” da Escritura e das sentenças de Pedro Lombardo no studium genérale dos dominicanos, incorporado à universidade. Os anos 1252-1259 constituíram a primeira etapa de sua docência na Sorbonne, caracterizada pelas lutas dos seculares contra os mendicantes. Tomás foi objeto da ira e das invectivas dos canônicos e mestres seculares, até o ponto de ver diminuída e suprimida a sua faculdade de ensinar. Superada a contenda, foi nomeado, em 1257, mestre da Universidade de Paris. Em 1259 voltou à Itália, desempenhando o cargo de mestre em teologia na corte pontifícia de Agnani, Orvieto e Viterbo. Em 1265 foi encarregado de organizar os estudos da ordem em Roma. Retornou a Paris em 1269 para lecionar durante três anos em sua cátedra de teologia. Dedicou os últimos anos de sua vida à Universidade de Nápoles, onde começou como estudante (1272-1274). Morreu no mosteiro cisterciense de Fossanova, enquanto se dirigia ao Concílio de Lyon.
Em sua curta vida realizou uma profundo e vasto trabalho “verbo et calamo”. Chama a atenção sua grande atividade falada e escrita. Além das aulas, em menos de 20 anos, de 1252 a 1274, escreveu 895 lições sobre os livros de Aristóteles, 803 sobre a Escritura, 850 capítulos sobre os evangelhos, 2.652 artigos na Summa theologica. A edição de suas obras completas é de 25 volumes in folio.
Numa tentativa de síntese, podemos fazer esta classificação de suas obras: 1) Comentários às obras de Aristóteles, Boécio, Pseudo-Dionísio e outros. 2) Questões disputadas (Quaestiones disputatae): Temas que apresentava o mestre em datas determinadas do curso acadêmico. 3) Quaestiones quodlibetales: Temas de livre escolha a que o professor submetia os alunos em momentos solenes do curso. Como seu nome indica, eram temas livres. Restam umas 12 dessas questões. 4) Comentários da Sagrada Escritura, fruto das aulas de teologia, em que o texto da Bíblia era a base. O mestre in sacra página devia explicar e comentar em aula o texto sagrado. 5) Opúsculos ou estudos breves sobre dogma, moral, filosofia etc. Entre eles está seu primeiro opúsculo De ente et essentia, base de sua filosofia (1252). 6) Summas: Obras de criação pessoal ou manuais para estudantes de uma matéria determinada. De Santo Tomás restam-nos dois: a) Summa de veritate fidei catholicae contra gentiles (12591264), composta como manual para missionários e pregadores para o triplo mundo judeu, árabe e pagão da Idade Média, b) Summa Theologiae ou Summa Theologica, sua obra mestra, cujas duas primeiras partes foram escritas entre 1265-1271, enquanto que a terceira, até a questão 90, foi escrita de 1271 a 1273. Amorte impediu-o de concluir essa obra. 7) Conferências e sermões, frutos de sua prédica que foi simultânea com a cátedra ao longo de sua vida.
A simples trajetória de sua vida como mestre de teologia e o elenco de seus livros tal como acabamos de expor não nos diz na realidade quem e como era esse homem. Chesterton viu nele certo tipo “não tão comum na Itália como o é entre raros italianos. Sua corpulência fez com que se comparasse humoristicamente a essas cubas ambulantes, comuns nas comédias de muitas nações. Ele mesmo brincava sobre isso… Mas, principalmente, sua cabeça era suficientemente poderosa para reger aquele corpo. Sua cabeça era de um tipo muito real e facilmente reconhecível, a julgar pelos retratos tradicionais e pelas descrições pessoais”.
Os testemunhos que seus companheiros e primeiros biógrafos deixaram são coincidentes. “Uma de suas principais recreações corporais era passear sozinho pelo claustro com a cabeça erguida.” “Seus sonhos eram sonhos diurnos, eram sobre o dia e sobre o dia de batalha. Como os sonhos do galgo, eram sonhos de caça, perseguindo o erro como se persegue a verdade, seguindo todos os subterfúgios e volteios da falsidade.” “Tomás foi muito cortês — diz Dante — , era de bom trato para conversar e suave no falar.” “Não parecia perturbar-se por nada, olhando sempre para as coisas superiores. Jamais quis falar de si mesmo. Conhecemos anedotas de sua vida, mas o segredo ficou com ele. Sua experiência contemplativa e mística foi-nos transmitida.
Sabemos os argumentos do professor, mas ignoramos sua experiência mística.
O volume de sua obra e atividade permite-nos perceber sua capacidade de trabalho e sua entrega à verdade. Pelo que nos restam de seus manuscritos, sabemos que estão cheios de emendas, censuras, supressões e aditamentos. Há parágrafos que passaram por três ou quatro redações. Com letra corrida e quase taquigráfica, nervosa, vamos seguindo o escritor em seu robusto pensamento. Três ou quatro amanuenses redigiram o que ele preparou em rascunho ou notas amplas. Seus biógrafos calcularam de 16 a 18 horas de trabalho diário.
A essa capacidade de trabalho temos de acrescentar sua prodigiosa memória — sabia de cor a Bíblia e as Sentenças de Pedro Lombardo — , sua curiosidade insaciável e sua capacidade intelectual. É um puro intelectual, distinguido pelo respeito à opinião dos outros, por sua capacidade crítica e por sua criação e elaboração de síntese. Vejamo-lo na síntese de sua obra:
— Santo Tomás marca uma etapa decisiva na filosofia e na teologia escolástica. Culmina a obra de seu mestre Alberto Magno. Graças à especulação tomista, o aristotelismo faz-se flexível e dócil a todas as necessidades da interpretação dogmática.
Para isso, tratou primeiro de estabelecer o verdadeiro significado do aristotelismo, tomando-o dos textos originais do Estagirita, que traduziu diretamente do grego. Dos intérpretes islâmicos valeu-se como fontes independentes. Em seus textos originais, Aristóteles é para Santo Tomás o fim último da pesquisa filosófica, pois chega até onde poderia chegar a razão. Para além está somente a verdade sobrenatural da fé.
— Harmonizar a filosofia com a fé, a obra de Aristóteles com as verdades que Deus revelou ao homem e das quais a Igreja é depositária, esse é o trabalho a que se propôs Santo Tomás.
Para isso vale-se de dois pressupostos: a) Separar claramente a filosofia da teologia; a pesquisa racional, baseada em princípios evidentes da teologia, cujo pressuposto é a revelação que aceitamos pela fé. b) Fixar um critério que permita ver a disparidade e a separação entre o objeto da filosofia e o da teologia, do ser das criaturas e de Deus.
— Esse princípio é a chave do sistema tomista. E o que ajudará: a) a determinar as relações entre razão e fé; b) a estabelecer a regula fidei; c) a centrar ao redor da função da abstração, a capacidade de conhecer do homem; d) a formular as provas da existência de Deus como dato a posteriori da experiência: dos efeitos, da ordem, do nascimento, da contingência e da finalidade dos seres; e) a esclarecer os dogmas fundamentais da fé.
Esse princípio ficou formulado em sua primeira obra De ente et essentia como distinção real entre essência e existência. E fica expresso também na analogia do ser, que tanto utiliza. Para Santo Tomás não há identificação entre o ser de Deus e o das criaturas. Os dois significados do termo ser (ens a se–ens ab alio) nem são idênticos nem completamente diferentes. Santo Tomás o expressa dizendo que o ser não é unívoco nem equívoco, e sim análogo, o que implica proporções diferentes. Essa proporção é uma relação de causa e efeito: o ser divino (ens a se) é causa do ser finito (ens ab alio).
— Santo Tomás constrói sobre essas bases a síntese mais completa e sistemática da doutrina cristã. Daí para a frente impõe-se nas escolas, não sem dificuldade, essa interpretação que Santo Tomás tem de Deus, do homem, da alma, do conhecimento humano, da ordem social, do poder político, da Igreja e da vida sobrenatural.
BIBLIOGRAFIA: Obras: Summa contra gentiles; Summa theologica; Suma 7feo/ógica,Tradução em português de Alexandre Correia, S.Paulo 1934s; S. Ramirez, Introducción a Tomás de Aquino (BAC), com a bibliografia publicada; C. Copleston, El pensamiento de Santo Tomás de Aquino, 1960; E. Gilson, A filosofia na Idade Média, 488ss.; Pedro R. Santidrián, Tomás de Aquino (Biblioteca de grandes personagens). Madrid 1984. [Santidrián]