gr. θεοί = deuses; plural de θεός (theos, deus)
79. Mágica de todas as mágicas, é-o a religião, na trans-objetividade. Nenhuma ação humana, nenhuma ação natural é «e-ficiente»: todas são «in-ficientes», porque os «feitos» fazem-se todos dentro do símbolo que, por base, tem o homem e o mundo, porque eles são produtos do deus que simbolicamente os integra, que os integra como duas partes de si mesmo. Ato humano e mundano são interdependentes. Um gesto do homem altera, de algum modo, o mundo, assim como um sobressalto do mundo, de algum modo, altera o homem. Nisto consiste a simpatia e a sinergia, adentro do símbolo «deus–homem–mundo». Por isso, o religioso da trans-objetividade não age como quer, mas só como pode: não excede o círculo do que de cada vez é sagrado, isto é, só desempenha, no drama ritual, o papel bem determinado pelo aceno do deus que o acena de forma que ele próprio (o drama) o revele a ele (o deus) como o que é, nas duas partes em que se repartiu seu ser de mensageiro de uma só mensagem da Origem, nas duas metades que, reunidas, dele fazem o simbolizante do primeiro de todos os símbolos, do símbolo arquetípico, da primeira de todas as «religações», a do homem e do mundo — homem e mundo que não devem ser entendidos abstratamente, mas em toda a sua concreção dramática, este homem e este mundo interdependentes, porque dependentes, ambos, do ser de um só de entre os deuses que podem, um de cada vez, simbolizar, mediante outro drama, outra concreção que será a «daquele» homem e «daquele» mundo. No que dissemos acima, mal ou bem (cremos que mais mal do que bem) ficou dito o que tínhamos a dizer de uma «religião elementar», aponta para o que cremos que seja [167] «elemento» de que vive e em que vive qualquer religião historiada ou historiável. É, por conseguinte, o trans-histórico em toda a história das religiões. A palavra «deus» pode ser substituída pelo nome de Dioniso ou de Cristo, sem que, assim, pretendamos paganizar o cristianismo ou cristianizar o paganismo. Só não podemos pôr em seu lugar «Deus» ou o «Absoluto-Secreto» ou a «Excessividade Caótica» ou o «Ser» ou o «Ultra-Ser», em suma, o que quer que esteja para Além-Horizonte Extremo. Claro que deixamos em aberto todas as questões, fechadas ou não pela teologia ortodoxa, no que se refere a Cristologia. Não é assunto de nossa competência.
80. Os «acenantes mensageiros da Divindade» ainda são apenas «acenantes» de acenos que a filosofia determinará como mensagem do Deus que, «a partir do oculto reinar» dos deuses, aparecerá «no seu ser, que o subtrai a todo o confronto com o que é presente». Os deuses, por ora, são só os possessores do homem que, «possesso», desempenha o drama ritual simbolizante, em que o símbolo-simbolizado se compõe de homem e mundo — mundo «mundante» ou «desmundante» do homem, e homem «humanizante» ou «desumanizante» do mundo — e neste símbolo arquetípico, o que simboliza é o deus que, na sua possessão, se apossa das disponibilidades de cada espécie (face ou aspecto) de homem, conjugada com cada espécie (face ou aspecto) de mundo, de modo que as duas espécies sejam desocultação do mesmo deus, em corpo e alma. Poderíamos — e já o fizemos de modo simplesmente alusivo — invocar a polaridade alma–corpo, e dizermos que esse mundo se faz corpo, e esse homem se faz alma do mesmo deus possessor. Cada polaridade singular, homem–mundo, constitui-se pela singularidade de uma desocultação de qualquer dos deuses-mensageiros de cada mensagem de Deus. Mas esta ainda não está em questão. [EudoroMito:167-168]