Renascimento

(in. Renaissance; fr. Renaissance; al. Renaissance; it. Rinascimento).

Designa-se com este termo o movimento literário, artístico e filosófico que começa no fim do séc. XIV e vai até o fim do séc. XVI, difundindo-se da Itália para os outros países da Europa. A palavra e o conceito de Renascimento têm origem religiosa, como ficou demonstrado pelos estudos de Hildebrand, Walser e Burdach: renascimento é o segundo nascimento, o nascimento do homem novo ou espiritual de que falam o Evangelho de São João e as Epístolas de São Paulo. Durante toda a Idade Média, tanto o conceito quanto a palavra designavam o retorno do homem a Deus, sua restituição à vida perdida com a queda de Adão. A partir do séc. XV, porém, essa palavra passa a ser empregada para designar a renovação moral, intelectual e política decorrente do retorno aos valores da civilização em que, supostamente, o homem teria obtido suas melhores realizações: a greco-romana. Assim, o Renascimento foi forçado a ressaltar as diferenças que o distinguiam do período medieval, em sua tentativa de vincular-se ao período clássico e de haurir diretamente dele a inspiração para suas atividades. Contudo não faltam elementos de continuidade entre a Idade Média e o Renascimento, e muitos dos problemas preferidos por humanistas e filósofos do Renascimento eram os mesmos já discutidos pela Idade Média, com as mesmas soluções. Isso explica por que a interpretação do Renascimento sempre oscilou entre dois extremos: de um lado, a oposição radical entre ele e a Idade Média; de outro, a continuidade intrínseca entre os dois. A primeira posição foi defendida por Burckhardt (Die Kulturder Renaissance in Italien, 1860), sendo repetida e ampliada por Gentile e seus discípulos. A segunda concepção inspira-se sobretudo na obra de K. Burdach (Vom Mittelalter zu Reformation, Renaissance, Humanismus, 19262) e ganhou forma extremada com G. Toffanin (História do humanismo, 1933). As características fundamentais do Renascimento podem ser brevemente re-capituladas da seguinte maneira:

1) Humanismo, como reconhecimento do valor do homem e crença de que a humanidade se realizou em sua forma mais perfeita na Antiguidade clássica (v., a respeito, humanismo).

2) Renovação religiosa, através da tentativa de reatar os laços com uma revelação originária, na qual se teriam inspirado os próprios filósofos clássicos, como é o caso do platonismo (Nicolau de Cusa, Pico della Mirandola, M. Ficino), ou através da tentativa de restabelecer o contato com as fontes originárias do cristianismo, ignorando a tradição medieval, como é o caso da Reforma protestante, (v. Reforma).

3) Renovação das concepções políticas; com o reconhecimento da origem humana ou natural das sociedades e dos Estados (Maquiavel) ou com a tentativa de voltar às formas históricas originárias ou à natureza das instituições sociais (jusnaturalismo).

4) Naturalismo, como novo interesse pela investigação direta da natureza, tanto na forma do aristotelismo, das manifestações de magia ou da metafísica da natureza (Campanella e Giordano Bruno) quanto na forma das primeiras conquistas da ciência moderna.

Sobre o Renascimento cf. a Bibliografia de H. Baron, “Renaissance in Italien”, em Archiv fur Kulturgeschichte, 1927,1931. (Em especial E. Cassirer, Indivíduo e cosmo na filosofia do Renascimento, e os textos de E. Garin; em particular: Idade Média e Renascimento, 1954). (Abbagnano)


É o ato de nascer de novo. Usa-se em geral esse termo para significar a revivência de certas práticas ou estilos de arte, em certos períodos da história, como o que se deu na Itália e no resto da Europa, nos séculos XV e XVI. O termo parece ter sido cunhado por Michelet, e tornado popular por Jacob Burckhardt, que considerava o individualismo, o reviver da antiguidade clássica e a descoberta do mundo e do homem como as características fundamentais desse período em oposição à Idade Média. Contudo esse conceito desde então passou a ser motivo de disputas, sendo várias as opiniões e interpretações que foram expostas. Para alguns há perfeita continuidade entre a Idade Média e o Renascimento, que apenas continuou a forma evolutiva já existente. Para outros, marca uma verdadeira revolução na história europeia.

Burckhardt pouco valor deu a parte filosófica desse período, enquanto outros acentuaram esse aspecto que, inegavelmente, é de máxima importância. Há uma mudança no modo de pensar que em muito se opõe ao que predominava na Idade Media, já que neste período a filosofia torna-se mais profana, a ciência conhece novas possibilidades e marcha para separar-se daquela. [MFSDIC]


Renascimento (séc. XV-XVI)

Este não seria o lugar para definir os limites do espaço e do tempo desse período da história que conhecemos como Renascimento. Embora difícil, e com risco de cair em tópicos, damos alguns traços da natureza específica desse movimento, que resiste até hoje a uma definição que seja comumente aceita. O Renascimento, como movimento europeu dos séculos XIV a XVI, vem caracterizado:

1) Por sua diferença com a Idade Média. Para alguns, o Renascimento pressupõe uma ruptura radical com a cultura medieval. Há quem veja nele uma exaltação da razão e das artes por trás da intolerância e do obscurantismo da Idade Média. Os primeiros em advertir a oposição com a idade precedente foram os humanistas e os historiadores da arte contemporânea dos grandes artistas. Essa diferença é interpretada por outros a partir da teoria da continuidade. O Renascimento descobriu no período medieval seus predecessores, isto é, seus aspectos cristãos e seus fermentos racionalistas. Finalmente, outros se mantêm num meio termo, qualificando-o como a diversidade dentro da continuidade. “Tanto literária quanto moralmente, o Renascimento consistiu mais em desenvolver plenamente certas tendências profundas do período medieval, com o risco às vezes de hipertrofiá-las do que de opor-se a elas” (Gilson).

2) Afirmação exasperada da autonomia do temporal. “O Renascimento segue uma tendência favorável a uma autonomia relativa do temporal e termina por exagerá-la. Na Idade Média há um impulso para a fuga do mundo, para a renúncia aos valores terrenos, manifestada nos livros como De contemplu mundi e a Imitação de Cristo, por exemplo. Há também a tendência a subordinar direta e indiretamente à religião todas as atividades humanas, como se estas não tivessem outro fim imediato do que o de favorecer a difusão e o desenvolvimento do cristianismo. História, arte, filosofia, política etc. aparecem normalmente concebidas e apoiadas somente em função da Igreja, da religião.

O Renascimento reage contra as duas primeiras tendências: a fuga do mundo e a subordinação direta de tudo à religião; afirma-se numa terceira posição, reconhecendo a necessidade de uma autonomia real das atividades humanas com sua racionalidade específica intrínseca, mas termina por extremar tal autonomia e tende a transformá-la em independência e separação” (G. Martina).

Resumindo: tanto o Renascimento quanto seu aspecto literário, o Humanismo, não podem ser considerados como intrinsecamente pagãos, naturalistas, imanentistas, mas abrem uma nova problemática, típica da Idade Moderna: o velho equilíbrio que em alguns casos construíra o período medieval, e ao qual muitas vezes se aproximara fatigadamente, rompe-se agora sem que surja ainda um novo equilíbrio. Não se limita o sobrenatural, mas sim passa-o a segundo plano. Não se nega a autoridade da Igreja, mas a aceitação do espírito crítico empurra à desconfiança com relação a ela. A polêmica anticlerical contra a cúria, o clero secular e regular, diminui o prestígio da Igreja. Neste sentido e dentro destes limites, o espírito do Renascimento, nas antípodas, por outros tantos capítulos, como o da Reforma, prepara-lhe o terreno, pelo menos na Itália, e facilita-lhe o caminho.

Do ponto de vista literário, que é o que mais nos interessa aqui, supõe uma grande riqueza de pensamento, de autores e de instituições. Remetemos aos conceitos: humanistas; educadores cristãos; Ratio studiorum; Reforma; Contra-Reforma, e aos correspondentes autores da época.

BIBLIOGRAFIA: J. Burckhardt, La cultura dei Renacimiento en Italia. Barcelona 1964; J. Huizinga, El otoño de la Edad Media. Tradução de J. Gaos, Madrid 1962; P. O. Kristeller, Renaissance Thought. Nova York 1961-1965, 2 vols.; Humanismo y Renacimiento. Tradução e seleção de Pedro R. Santidrián, Madrid 1986; Enciclopedia del Renacimiento. Alianza, Madrid 1985. (Santidrián)