(in. Reformation; fr. Reformation; al. Reformation; it. Riformà).
Renovação religiosa ocorrida na Europa durante o séc. XVI, como retorno às origens do cristianismo. Preparada pelo humanista Erasmo de Roterdã (1466-1536), a Reforma foi iniciada pelo monge agos-tiniano Martinho Lutero (1483-1546), que, em 1517, afixou nas portas da catedral de Wittenberg noventa e cinco teses contra a venda das indulgências. Em sua orientação global, a Reforma protestante apresenta-se como uma das vias de realização do retorno aos princípios, lema do Renascimento. No domínio religioso, o retorno aos princípios levava a negar o valor da tradição, portanto da Igreja, que se julgava sua depositária e intérprete. No texto Contra Henrique VIII da Inglaterra (1522), Lutero contrapunha à tradição eclesiástica e a todos os rituais e interpretações por ela acumulados durante séculos o retorno direto à palavra de Jesus Cristo, concretizada no Evangelho. Segundo Lutero, o ensinamento fundamental do Evangelho é a justificação por meio da fé, que implica dois corolários fundamentais. 1) Um deles é a negação do valor das obras como técnicas religiosas (ritos, sacrifícios, cerimônias), com a redução dos sacramentos aos mencionados na Bíblia (batismo, penitência e eucaristia), mas sem qualquer supervisão sacerdotal, sendo eles considerados expressão da relação direta do homem com Deus. Ao culto sacerdotal, Lutero opôs o exercício dos deveres civis, como único “serviço divino” com valor religioso. 2) O outro é a negação da liberdade humana e o reconhecimento da predestinação por parte de Deus. A fé é o sinal seguro dessa predestinação, portanto indício de salvação (De libertate christiana, 1520). Foi este aspecto que deu origem à polêmica entre Erasmo e Lutero: à Diatribe de libero arbítrio (1524) de Erasmo, Lutero respondeu com De servo arbítrio (1525), em que insistia no caráter imperscrutável da escolha divina (cf. predestinação).
Das outras duas figuras principais da Reforma protestante, Ulrich Zwinglio (1484-153D e João Calvino (1509-1564), o primeiro foi bem além de Lutero na negação das formas religiosas tradicionais, atribuindo ao próprio sacramento da eucaristia valor meramente simbólico e negando a obediência passiva à autoridade política; o segundo considerou o retorno aos princípios especialmente como retorno à religiosidade do Antigo Testamento. Em Instituição da religião cristã (publicada em latim em 1536 e em francês em 1541 [essa tradução é o primeiro texto literário da prosa francesa]), Calvino propôs-se efetivamente a mostrar a unidade do Antigo e do Novo Testamentos, extraindo daquele o princípio de que o bom sucesso nas atividades da vida é prova evidente do favorecimento de Deus, sinal de sua predileção. Foi esse princípio que transformou o calvinismo em ética inspiradora da burguesia capitalista emergente, com seu espírito ativo e agressivo, marcado pelo desprezo por sentimentos e orientado para o bom êxito dos negócios. (Abbagnano)
Reforma (séc. XVI)
O termo Reforma aplica-se primordialmente à revolução religiosa que teve lugar na Igreja do Ocidente no século XVI. A Reforma levou consigo alguns homens que a tornaram possível, uma doutrina ou literatura e algumas consequências que poderíamos concretizar num estilo ou talante diferenciados.
A respeito dos autores da Reforma ou reformadores, seu pensamento e atividade podem ser consultados neste mesmo dicionário nos termos Lutero, Calvino, Zwinglio, Melanchton etc. Sua leitura fala não de uma, mas de várias reformas. O talante e a cultura do reformador e do lugar deram fôlego às distintas reformas ou Igrejas reformadas.
Não obstante, fala-se da Reforma como algo diferente das reformas ocorridas na Igreja antes e depois. Os reformadores do século XVI — diferentemente dos anteriores, sobretudo medievais — não somente atacaram a corrupção da Igreja, mas também foram a raiz teológica do problema, como era a perversão da doutrina da Igreja sobre a Redenção e a graça. Lutero e os demais reformadores deploraram e atacaram o sistema das indulgências como acobertador e falseador do livre dom da graça de Deus. Insistiu na não autoridade do papa sobre o purgatório e na não consistência dos méritos dos santos sobre a base do Evangelho. Daí passou a descobrir a chave teológica e moral de reforma da Igreja: a) a volta à Escritura com única norma (sola Scriptura); b) a fé, não as obras, como princípio da justificação (sola fldes). A Reforma, em sua origem, procura voltar à primeira forma do cristianismo, tal como aparece nas fontes do Novo Testamento. Leva, portanto, uma intenção de crítica, revisão, interpretação e vivência do fato cristão. Isto se produziu ao longo dos séculos XVI-XVII.
A Reforma realizou-se frente à Igreja de Roma, insistindo nestes pontos-chave, além dos dois acima mencionados: 1) Sacerdócio universal dos fiéis, a quem foi dirigida diretamente a palavra da Bíblia, que podem interpretar livremente. 2) A supremacia e direção interior de Cristo versus a supremacia e poder exterior do papa. 3) O aspecto interior da fé e da graça que nos vem diretamente pela fé e aceitação da Palavra. Tudo isso supõe a crítica e revisão do sistema sacramental, as indulgências, as devoções, o celibato, a vida religiosa consagrada etc. 4) A revisão do próprio conceito de Igreja. E algo exterior ou é somente interior? Quem são os que pertencem à Igreja?
A Reforma é, pois, uma nova maneira de entender e viver o “fato cristão”. Supõe, ao mesmo tempo, uma tarefa permanente de chegar ao ideal cristão ou utopia descrito no Evangelho. Além disso, abre um processo baseado no princípio de “Ecclesia semper reformanda”.
Foi uma revolução e, como tal, dolorosa e catastrófica. “Em toda a história da Igreja, a reforma protestante constitui a maior das catástrofes, já que trouxe consigo males maiores do que as heresias da Idade Antiga, as seitas medievais e mesmo o cisma oriental de 1054” (G. Martina, De Lutero a nuestros días. I. Época de la Reforma).
Em primeiro lugar, a Reforma pôs fim à unidade europeia, ou pelo menos à unidade religiosa baseada no catolicismo. O historiador Lortz resume os frutos do protestantismo no subjetivismo que deságua no racionalismo que leva ao laicismo, no nacionalismo e, finalmente, na subordinação da Igreja ao Estado. Com a mesma imparcialidade, os historiadores modernos reconhecem os valores parciais que constituem o estilo e o talante das Igrejas e dos homens da Reforma. Advirta-se, no entanto, que pelo fato de esta tê-los afirmado e colocado em primeiro plano, não se conclui que não existam na Igreja católica. Existem neles verdades parciais que a Igreja do séc. XVI era propensa a deixar um pouco na penumbra e que foram revalorizados pelos reformadores. “E certo que a Igreja Católica reconhece tais valores como parte de seu patrimônio doutrinal, mas isso não nos dispensa de reconhecer como um mérito do protestantismo a afirmação e a defesa de algumas verdades, embora parciais, e de alguns valores, embora unilaterais” (G. Martina). Entre muitos outros, assinalamos os seguintes: a aspiração a uma religião mais pura e íntima, baseada numa relação mais direta com o Deus vivo; o sentido do mistério ante o onipotente; certa austeridade de vida, alheia a compromissos fáceis com o mundo; o cultivo e a leitura frequente da Bíblia em medida muito mais ampla do que se fazia entre os católicos; a importância atribuída à graça na vida cristã; participação mais ativa e responsável da liturgia, assim como maior consciência do verdadeiro sacerdócio dos fiéis; exaltação da liberdade e da interioridade da consciência etc.
Todos esses traços e outros dão às Igrejas e homens da Reforma o estilo e o talante de que antes falamos.
BIBLIOGRAFIA: Ricardo G. Villoslada, Martin Lutero. (BAC). Madrid 1973,2 vols.; J. Lortz, Historia de la Reforma. Madrid 1963,2 vols.; E. G. Leonard, Histoire Genérale du Protestantisme, I. Paris 1961; M. Weber, La ética protestante y el espíritu del capitalismo. Madrid 1952. (Santidrián)
Reforma (séc. XVI)
O termo Reforma aplica-se primordialmente à revolução religiosa que teve lugar na Igreja do Ocidente no século XVI. A Reforma levou consigo alguns homens que a tornaram possível, uma doutrina ou literatura e algumas consequências que poderíamos concretizar num estilo ou talante diferenciados.
A respeito dos autores da Reforma ou reformadores, seu pensamento e atividade podem ser consultados neste mesmo dicionário nos termos Lutero, Calvino, Zwinglio, Melanchton etc. Sua leitura fala não de uma, mas de várias reformas. O talante e a cultura do reformador e do lugar deram fôlego às distintas reformas ou Igrejas reformadas.
Não obstante, fala-se da Reforma como algo diferente das reformas ocorridas na Igreja antes e depois. Os reformadores do século XVI — diferentemente dos anteriores, sobretudo medievais — não somente atacaram a corrupção da Igreja, mas também foram a raiz teológica do problema, como era a perversão da doutrina da Igreja sobre a Redenção e a graça. Lutero e os demais reformadores deploraram e atacaram o sistema das indulgências como acobertador e falseador do livre dom da graça de Deus. Insistiu na não autoridade do papa sobre o purgatório e na não consistência dos méritos dos santos sobre a base do Evangelho. Daí passou a descobrir a chave teológica e moral de reforma da Igreja: a) a volta à Escritura com única norma (sola Scriptura); b) a fé, não as obras, como princípio da justificação (sola fldes). A Reforma, em sua origem, procura voltar à primeira forma do cristianismo, tal como aparece nas fontes do Novo Testamento. Leva, portanto, uma intenção de crítica, revisão, interpretação e vivência do fato cristão. Isto se produziu ao longo dos séculos XVI-XVII.
A Reforma realizou-se frente à Igreja de Roma, insistindo nestes pontos-chave, além dos dois acima mencionados: 1) Sacerdócio universal dos fiéis, a quem foi dirigida diretamente a palavra da Bíblia, que podem interpretar livremente. 2) A supremacia e direção interior de Cristo versus a supremacia e poder exterior do papa. 3) O aspecto interior da fé e da graça que nos vem diretamente pela fé e aceitação da Palavra. Tudo isso supõe a crítica e revisão do sistema sacramental, as indulgências, as devoções, o celibato, a vida religiosa consagrada etc. 4) A revisão do próprio conceito de Igreja. E algo exterior ou é somente interior? Quem são os que pertencem à Igreja?
A Reforma é, pois, uma nova maneira de entender e viver o “fato cristão”. Supõe, ao mesmo tempo, uma tarefa permanente de chegar ao ideal cristão ou utopia descrito no Evangelho. Além disso, abre um processo baseado no princípio de “Ecclesia semper reformanda”.
Foi uma revolução e, como tal, dolorosa e catastrófica. “Em toda a história da Igreja, a reforma protestante constitui a maior das catástrofes, já que trouxe consigo males maiores do que as heresias da Idade Antiga, as seitas medievais e mesmo o cisma oriental de 1054” (G. Martina, De Lutero a nuestros días. I. Época de la Reforma).
Em primeiro lugar, a Reforma pôs fim à unidade europeia, ou pelo menos à unidade religiosa baseada no catolicismo. O historiador Lortz resume os frutos do protestantismo no subjetivismo que deságua no racionalismo que leva ao laicismo, no nacionalismo e, finalmente, na subordinação da Igreja ao Estado. Com a mesma imparcialidade, os historiadores modernos reconhecem os valores parciais que constituem o estilo e o talante das Igrejas e dos homens da Reforma. Advirta-se, no entanto, que pelo fato de esta tê-los afirmado e colocado em primeiro plano, não se conclui que não existam na Igreja católica. Existem neles verdades parciais que a Igreja do séc. XVI era propensa a deixar um pouco na penumbra e que foram revalorizados pelos reformadores. “E certo que a Igreja Católica reconhece tais valores como parte de seu patrimônio doutrinal, mas isso não nos dispensa de reconhecer como um mérito do protestantismo a afirmação e a defesa de algumas verdades, embora parciais, e de alguns valores, embora unilaterais” (G. Martina). Entre muitos outros, assinalamos os seguintes: a aspiração a uma religião mais pura e íntima, baseada numa relação mais direta com o Deus vivo; o sentido do mistério ante o onipotente; certa austeridade de vida, alheia a compromissos fáceis com o mundo; o cultivo e a leitura frequente da Bíblia em medida muito mais ampla do que se fazia entre os católicos; a importância atribuída à graça na vida cristã; participação mais ativa e responsável da liturgia, assim como maior consciência do verdadeiro sacerdócio dos fiéis; exaltação da liberdade e da interioridade da consciência etc.
Todos esses traços e outros dão às Igrejas e homens da Reforma o estilo e o talante de que antes falamos.
BIBLIOGRAFIA: Ricardo G. Villoslada, Martin Lutero. (BAC). Madrid 1973,2 vols.; J. Lortz, Historia de la Reforma. Madrid 1963,2 vols.; E. G. Leonard, Histoire Genérale du Protestantisme, I. Paris 1961; M. Weber, La ética protestante y el espíritu del capitalismo. Madrid 1952. (Santidrián)