princípio de não contradição

VIDE contradição; princípio de contradição

E sob que fórmula convém exprimir este princípio? Aristóteles nos propõe esta: “É impossível que o mesmo atributo pertença e não pertença ao mesmo tempo ao mesmo sujeito soba mesma relação”. O que Tomás de Aquino traduz:

Impossibile est eidem simul inesse et non inesse idem secundum idem.

E que se traduz também frequentemente por esta fórmula equivalente: “É impossível afirmar e negar ao mesmo tempo a mesma coisa soba mesma relação.”

Assim formulado, o princípio de não-contradição é diretamente relativo às operações do espírito, atribuição e não atribuição, afirmação e negação das quais declara a incompatibilidade em certas condições. Mas se observarmos que o espírito julgando é manifestamente determinado pelo real que lhe serve de objeto — por exemplo, se julgo que o céu é azul, é porque vejo que é realmente assim — será mais conforme com a própria estrutura do conhecimento formular o princípio de não-contradição em relação ao seu conteúdo objetivo. Dir-se-á então: “O ser não pode não ser” — “o que é não é o que não é”

Ens non est non ens.

Em metafísica, onde nos colocamos no ponto de vista objetivo do ser, é evidentemente esta fórmula objetiva que deve ter nossas preferências.

Tentemos ver de mais perto como o espírito é levado a reconhecer este princípio. Tal princípio resulta evidentemente do relacionamento de duas noções, a de ser e a de não-ser. A noção de ser não é outra coisa senão este primeiro dado da inteligência que já nos é familiar. Se considerarmos agora a noção de não-ser, observaremos imediatamente que não contém nada a mais de positivo do que a noção precedente de ser; difere da primeira devido a uma pura atividade intelectual, a negação, reação absolutamente original do espírito, que se define por si mesma: eu ponho o ser, em seguida eu o nego, e é assim que obtenho a noção ou a pseudo-noção de não-ser.

Se agora, aproximo as duas noções que acabo de distinguir, constato que elas não podem convir, e esta incompatibilidade se impõe a mim como algo de imediatamente percebido, como um dado primitivo: o ser, de modo algum e enquanto tal, é não-ser. Há oposição entre estas duas noções, e daí resulta — reencontramos a primeira formulação do princípio — que é impossível afirmar e negar ao mesmo tempo e sob a mesma relação a mesma coisa, pois isto seria identificar ser e não-ser, o que acabamos de recusar de modo absoluto. Em tudo isso, intervieram uma noção positiva, a de ser, duas atividades negativas sucessivas do espírito, e a visão objetiva da incompatibilidade finalmente proclamada.

É possível dar uma justificação diversa daquela que traz consigo essa visão objetiva do nosso princípio? É evidentemente certo que não se pode sonhar com uma demonstração direta, uma vez que tal demonstração se apoiaria em uma verdade anteriormente reconhecida, o que certamente não pode ter lugar aqui, já que nada é anterior ao ser. Mas não se poderia falar de uma demonstração indireta ou de uma refutação por absurdo? De modo geral, a refutação por absurdo consiste em mostrar que, sustentando uma certa tese, se é levado necessariamente à contradição. É fácil ver que sob esta forma comum a refutação por absurdo é aqui sem significação, uma vez que é precisamente isto que é afirmado pelo adversário, isto é, a possibilidade de contradição. Nesse caso, não é à contradição que é preciso levar o adversário. mas ao silêncio. Afirmar a identidade dos contraditórios é não ter mais nenhum objeto distinto de pensamento, é em realidade não pensar em nada; pois desde que se quer pensar em algo, é preciso que se tenha diante de si um objeto determinado. No momento em que o adversário concede que pensa em algo de determinado, que dá uma significação a uma palavra, reconhece por isto mesmo que o ser não é contraditório, e se ele mantém por um puro artifício verbal sua tese da contradição do ser, não tem mais nenhum objeto distinto de pensamento. A alternativa é aqui pensar em alguma coisa ou não pensar. Se quereis pensar, vos é necessário fixar um objeto determinado, isto é, reconhecer o valor do ser.

Qual é, portanto, a extensão ou o campo de aplicação deste princípio de não-contradição? Uma vez que tem sua raiz na noção de ser, considerada nela mesma e sem nada de restritivo, ele deve valer para todas as modalidades do ser, para todo o ser, e correlativamente para todo pensamento se reportando ao ser. Mas que se tome cuidado, os seres que nos são dados, múltiplos e cambiantes, não são plenamente ser: sob certos aspectos são ser, enquanto que sob outros são não-ser. O princípio de não-contradição só se aplica a eles sob certos pontos de vista e dentro de certos limites: na medida em que serão ser, não serão não-ser; tal princípio somente vale de modo absoluto para o ser absoluto, para Deus. [Gardeil]