Visto que sei por certo que existo, e, não obstante, não advirto que a minha natureza ou a minha essência lhe convenha necessariamente outra coisa, mas que eu sou algo que pensa, concebo muito bem que minha essência consiste somente em ser algo que pensa, ou ser uma substância cuja essência ou natureza toda é só pensar. E mesmo que por acaso, ou melhor, certamente, como direi depois, eu tenha um corpo ao qual estou estreitamente unido, no entanto, visto que por um lado tenho uma ideia clara e distinta de mim mesmo, segundo a qual sou só algo que pensa e não extenso, e, por outro lado, tenho uma ideia distinta do corpo, segundo a qual este é uma coisa extensa, que não pensa, torna-se claro que eu, isto é, minha alma, pela qual sou o que sou, é inteira e verdadeiramente distinta de meu corpo, podendo ser e existir sem o corpo. (Descartes – Meditationes de prima philosophia, VI.)