Entende-se raramente por neo-escolástica a renovação da filosofia e teologia escolásticas iniciada em meados do século XVI; na maioria dos casos, pretende-se significar o movimento escolástico dos séculos XIX e atual. Pensam muitos não ser acertada tal denominação, porque facilmente pode dar a impressão de que se trata de mera ressurreição do antigo, quando, entanto, as intenções e tarefas, que a neo-escolás-tica se propõe, denotam muito maior alcance. Primeiramente, foi preciso retomar a corrente tradicional, quase desfeita na época do Iluminismo, tarefa essa empreendida primeiro na Itália por V. Buzzetti (+ 1824) e por seu discípulo S. Sordi (-)-1865), no sentido de um tomismo puro, que mais e mais se impôs, diante de orientações mais ecléticas (Tongiorgi e outros). Na Alemanha, vários pensadores (como Fr. von Baader, A. Gunther, M. Deutinger) intentaram, na primeira metade do século XIX, renovar a filosofia cristã, entabulando diálogo com o rico patrimônio intelectual do idealismo alemão. Entretanto, tais tentativas estavam condenadas a fracassar, porque eram empreendidas à margem da imponente tradição da Idade Média cristã. Tornava-se necessário começar pelo retorno àquela tradição, retorno esse sem dúvida menos propício para fazer obra criadora, ao qual abriu caminho principalmente J. Kleutgen, com sua obra “Philosophie der Vorzeit” (1.a edição, 1860). A neo-escolástica recebeu forte impulso com a publicação da encíclica “Aeterni Patris” dè Leão XIII (1879) sobre a filosofia de S. Tomás de Aquino. Não obstante, durante o século XIX continuou preponderando a orientação tradicional com fins escolares. Além da corrente tomista, cultivou-se nomeadamente na Espanha, mas também na Alemanha e França, o suarezianismo. Todavia, não se esqueça que nesta neo-escolástica se fizeram sentir igualmente ideias da escolástica do século XVIII influenciada pelo racionalismo.
Ultrapassando os limites da área escolar, a investigação histórica da escolástica medieval foi cultivada principalmente na Alemanha (H. Denifle, Fr. Ehrle, Cl. Baeumker, M. Grabmann) e na França (P. Mandonnet, E. Gilson). A escola franciscana (S. Boaventura, Scotus) foi também estudada com especial predileção (o centro principal destes estudos é o Colégio de S. Boaventura, em Quaracchi, perto de Florença, na Itália). Assim se foram salientando progressivamente o ingente esforço dos pensadores medievais e sua riqueza de ideias e tentativas de solução dos problemas propostos. Tais investigações reabilitaram novamente a filosofia medieval. Facilitam elas igualmente a tarefa de separar das condições histórico-temporais da época o que nessa filosofia há de perenemente válido. — O ulterior desenvolvimento sitemático realizou-se, procurando incorporar a moderna ciência natural e a psicologia empírica. A assimilação dos novos conhecimentos por parte da antiga filosofia natural e da psicologia filosófica exigiu reformas mais ou menos profundas em certos pontos de doutrina. Ao mesmo tempo, os progressos da fisiologia e da psicologia sensitiva fecunda-r am os estudos de crítica do conhecimento (“realismo crítico”). Neste particular, merecem especial menção o “Institut Supérieur de Philosophie” de Lovaina, fundado por Desiré Joseph Mercier, que logo foi nomeado Cardeal, bem como os pensadores alemães, J. Geyser e J. Fröbes. — Mas, quando após um período de orientação positivista, que reduzia a filosofia quase exclusivamente a epistemologia ( Neokantismo), pouco a pouco foi despertando, por fins do século, um filosofar dotado de conteúdo, os pensadores cristãos deram-se conta, cada vez mais claramente, de que a tarefa principal era a conciliação criadora com a filosofia moderna, e precisamente não só com a filosofia contemporânea, mas também com os grandes filósofos da Idade Moderna, sem os quais é absolutamente incompreensível o movimento filosófico atual. A tragédia da escolástica moderna, de modo especial a partir do século XVII, consistiu exatamente em não haver repercutido de maneira viva no ambiente intelectual da época, com o que deixou que a filosofia “moderna” seguisse mais e mais seu próprio caminho, converten-do-se ela, a escolástica, em assunto puramente interno de seminários e de escolas de Ordens religiosas. O que S. Tomás realizou em relação a Aristóteles, a Avicena e a Averróis, não o fez a escolástica relativamente aos pensadores da Idade Moderna. Contudo, se a filosofia escolástica quiser chegar a ser uma força viva, deve instalar-se na problemática atual e desenvolver, dentro dela, de maneira original, as grandes ideias fundamentais que lhe são peculiares. Isto implica também que, juntamente com o caráter comum de verdade perenemente válida, há de apresentar um cunho próprio em cada povo particular. Se deve ser filosofia verdadeiramente católica, não pode, p. ex., ser imposta aos alemães com um estilo mental românico; com maior razão, não poderá ser aceita pelos povos do Extremo-Oriente sob uma forma de cunho ocidental. A especial recomendação da filosofia de S. Tomás por parte da Igreja não se opõe à realização destas tarefas; os papas não se têm cansado de acentuar constantemente a necessidade de uma “liberdade razoável”. Não faltam importantes projetos, tendo em mira a solução dos problemas atuais. Recordemos os trabalhos histórico-filosóficos, p. ex., da Universidade Católica de Milão, fundada por A. Gemelli (F. Olgiati e outros), a entrada em contacto com a fenomenologia e a filosofia da existência, a-tentativa, a um tempo, atrevida e discutida de J. Marechal de uma conciliação interna da metafísica tomista do conhecimento com o método transcendental de Kant, e as enciclopédias católicas para o Japão e China, que levarão também aos povos orientais o patrimônio intelectual da filosofia cristã, de maneira adequada à índole peculiar deles. — De Vries. [Brugger]
Neo-escolásticos (séc. XIX)
Atentos ao desenvolvimento do pensamento cristão ao longo da historia, seguimos sua evolução apresentando as Escolas teológicas, as Escolas e universidades da Idade Média e Moderna. Em consonância com isto, demos os nomes daqueles autores que melhor as representam. São os chamados mestres da escolástica cristã, tanto do período medieval (séc. IX-XIV) quanto da escolástica tardia ou espanhola do barroco (séc. XVI-XVII).
Ficaria incompleta a nossa visão se não apresentássemos o desenvolvimento do pensamento escolástico cristão em nossos dias. Esse pensamento recebe o nome de neo-escolástica. Designa o movimento filosófico-teológico contemporâneo “que aspira a restaurar os modelos de pensamento medieval, confrontando as teses centrais dos mesmos com as filosofias modernas”. Inicia-se na segunda metade do séc. XIX e chega até nossos dias.
Os traços estruturais desse movimento neo-escolástico poderiam ser os seguintes: aceitação e repetição de uma tradição herdada; fidelidade ao método dos grandes mestres da escola; tratamento de uma temática herdada dos clássicos e reelaborada em confrontação com modelos de pensamento moderno, junto a uma atitude excessivamente apologética quando se trata de fundamentar os próprios pressupostos fundamentais.
Não obstante, cabe assinalar os sérios esforços de renovação que, tanto na filosofia quanto na teologia neo-escolástica, se deram, como o demonstram os autores que oferecemos em diversos artigos deste dicionário. Deve-se levar em conta que a neo-escolástica teve de lutar não apenas com as correntes da filosofía kantiana e positivista-materialista do tempo, mas também com outras tendências católicas ecléticas como o semi-racionalismo alemão, o tradicionalismo francês e o ontologismo italiano.
Dentro da neo-escolástica, distinguem-se diversas tendências. Surgida do impulso de Leão XIII em sua encíclica Aeterni Patris, essa nova escola promoveu o professorado a escolásticos convictos, e criou novas instituições universitárias. Na Universidade Gregoriana de Roma surgiram, no primeiro terço do século, J. J. Urráburu e L. Billot, entre muitos outros. No Angelicum, também de Roma, surgiu um número importante de filósofos e teólogos como E. Hugón e R. Garrigou-Lagrange. Em Lovaina, M. Mercier e M. de Wulf. No Sacro Cuore de Milão, A. Gemelli. Em Salamanca, Santiago Ramírez e G. Fraile. E assim em outras universidades como Comillas, Toronto, Nimega, Washington, Dublin, Friburgo da Suíça, Instituto Católico de Paris etc.
Não em todos esses centros se entenderam e se cultivaram da mesma forma a ciência e a filosofia. Sob uma orientação eclesiástica e conservadora na Itália e na Espanha, vemos os autores escolásticos centro-europeus em contextos universitários não clericais, abertos a caminhos e a métodos mais amplos. O Instituto Superior de Filosofia da Univesidade de Lovaina, por exemplo, com Mercier à frente, pratica o estudo histórico-crítico dos clássicos da escolástica e amplia a temática filosófica: psicologia experimental, epistemologia, fenomenologia etc. A neo-escolástica germânica prefere os estudos histórico-críticos, como se pode ver em H. Denifle, M. Grabmann e outros. Na França encontramos um grupo de pensadores mais independentes e mais sintonizados com o pensamento contemporâneo. Servem de exemplo, P. Rousselot, J. Marechal, o neotomista J. Maritain e o historiador do período medieval E. Gilson.
Na Espanha são dignos de menção entre os precursores da neo-escolástica e do neotomismo: Jaime Balmes (1810-1848) e Ceferino González. Balmes representa, em parte, a corrente que contribuiu para a reafirmação e florescimento da neo-escolástica, exercendo uma notável influência sobre o cardeal Mercier e a escola de Lovaina. Balmes contribuiu também com a filosofia política, especialmente com vistas a situações concretas colocadas na Espanha do seu tempo. Também não se deve menosprezar o trabalho apologético desenvolvido em sua obra El protestantismo comparado con el catolicismo (1842) e Cartas a un escético en matéria de religión (1841). A moderação e o bom senso encobrem, às vezes, sua postura conservadora.
BIBLIOGRAFIA: Para a neo-escolástica, ver Introduction a la Philosophie néo-scholastique, 1904; Ferrater Mora, Diccionario de filosofia, Neoescolástica. Para Balmes: Obras completas. Ed. de P. I. Casanova. Barcelona 1925-1927, 33 vols. Reedição na BAC. Madrid 1948-1950, 8 vols.; J. M” Garcia Escudero, Antologia politica de Balmes (BAC). Madrid, 2 vols. (Santidrián)
Neo-escolásticos (séc. XIX)
Atentos ao desenvolvimento do pensamento cristão ao longo da historia, seguimos sua evolução apresentando as Escolas teológicas, as Escolas e universidades da Idade Média e Moderna. Em consonância com isto, demos os nomes daqueles autores que melhor as representam. São os chamados mestres da escolástica cristã, tanto do período medieval (séc. IX-XIV) quanto da escolástica tardia ou espanhola do barroco (séc. XVI-XVII).
Ficaria incompleta a nossa visão se não apresentássemos o desenvolvimento do pensamento escolástico cristão em nossos dias. Esse pensamento recebe o nome de neo-escolástica. Designa o movimento filosófico-teológico contemporâneo “que aspira a restaurar os modelos de pensamento medieval, confrontando as teses centrais dos mesmos com as filosofias modernas”. Inicia-se na segunda metade do séc. XIX e chega até nossos dias.
Os traços estruturais desse movimento neo-escolástico poderiam ser os seguintes: aceitação e repetição de uma tradição herdada; fidelidade ao método dos grandes mestres da escola; tratamento de uma temática herdada dos clássicos e reelaborada em confrontação com modelos de pensamento moderno, junto a uma atitude excessivamente apologética quando se trata de fundamentar os próprios pressupostos fundamentais.
Não obstante, cabe assinalar os sérios esforços de renovação que, tanto na filosofia quanto na teologia neo-escolástica, se deram, como o demonstram os autores que oferecemos em diversos artigos deste dicionário. Deve-se levar em conta que a neo-escolástica teve de lutar não apenas com as correntes da filosofía kantiana e positivista-materialista do tempo, mas também com outras tendências católicas ecléticas como o semi-racionalismo alemão, o tradicionalismo francês e o ontologismo italiano.
Dentro da neo-escolástica, distinguem-se diversas tendências. Surgida do impulso de Leão XIII em sua encíclica Aeterni Patris, essa nova escola promoveu o professorado a escolásticos convictos, e criou novas instituições universitárias. Na Universidade Gregoriana de Roma surgiram, no primeiro terço do século, J. J. Urráburu e L. Billot, entre muitos outros. No Angelicum, também de Roma, surgiu um número importante de filósofos e teólogos como E. Hugón e R. Garrigou-Lagrange. Em Lovaina, M. Mercier e M. de Wulf. No Sacro Cuore de Milão, A. Gemelli. Em Salamanca, Santiago Ramírez e G. Fraile. E assim em outras universidades como Comillas, Toronto, Nimega, Washington, Dublin, Friburgo da Suíça, Instituto Católico de Paris etc.
Não em todos esses centros se entenderam e se cultivaram da mesma forma a ciência e a filosofia. Sob uma orientação eclesiástica e conservadora na Itália e na Espanha, vemos os autores escolásticos centro-europeus em contextos universitários não clericais, abertos a caminhos e a métodos mais amplos. O Instituto Superior de Filosofia da Univesidade de Lovaina, por exemplo, com Mercier à frente, pratica o estudo histórico-crítico dos clássicos da escolástica e amplia a temática filosófica: psicologia experimental, epistemologia, fenomenologia etc. A neo-escolástica germânica prefere os estudos histórico-críticos, como se pode ver em H. Denifle, M. Grabmann e outros. Na França encontramos um grupo de pensadores mais independentes e mais sintonizados com o pensamento contemporâneo. Servem de exemplo, P. Rousselot, J. Marechal, o neotomista J. Maritain e o historiador do período medieval E. Gilson.
Na Espanha são dignos de menção entre os precursores da neo-escolástica e do neotomismo: Jaime Balmes (1810-1848) e Ceferino González. Balmes representa, em parte, a corrente que contribuiu para a reafirmação e florescimento da neo-escolástica, exercendo uma notável influência sobre o cardeal Mercier e a escola de Lovaina. Balmes contribuiu também com a filosofia política, especialmente com vistas a situações concretas colocadas na Espanha do seu tempo. Também não se deve menosprezar o trabalho apologético desenvolvido em sua obra El protestantismo comparado con el catolicismo (1842) e Cartas a un escético en matéria de religión (1841). A moderação e o bom senso encobrem, às vezes, sua postura conservadora.
BIBLIOGRAFIA: Para a neo-escolástica, ver Introduction a la Philosophie néo-scholastique, 1904; Ferrater Mora, Diccionario de filosofia, Neoescolástica. Para Balmes: Obras completas. Ed. de P. I. Casanova. Barcelona 1925-1927, 33 vols. Reedição na BAC. Madrid 1948-1950, 8 vols.; J. M” Garcia Escudero, Antologia politica de Balmes (BAC). Madrid, 2 vols. (Santidrián)