mentira

(gr. pseudos; lat. mendacium; in. Lie; fr. Mensonge; al. Lüge; it. Menzogna).

Aristóteles distingue duas espécies fundamentais de mentira, a jactância, que consiste em exagerar a verdade, e a ironia , que consiste em diminuí-la. Estas são mentiras que não dizem respeito às relações de negócios nem à justiça; nesses casos não se trata de simples mentira, mas de vícios mais graves (fraude, traição, etc.) (Et. Nic, IV, 7, 1127 a 13). Tomás de Aquino deu minuciosa classificação da mentira do ponto de vista da moral teológica (S. Th., II, 2, q. 110). [Abbagnano]


3.3 Portanto, é necessário compreender o que seja a mentira. Pois não é todo aquele que diz algo falso que está mentindo, se crê ou opina ser verdade o que diz. Crer e opinar são diferentes nisto: às vezes aquele que crê sente que não tem conhecimento daquilo em que acredita – mesmo que não duvide em hipótese alguma que não saiba aquilo que ignora, se crê firmemente. Porém, quem opina, julga saber o que desconhece. Ora, quem quer que enuncie algo que, em sua mente, tenha acreditado ou opinado, mesmo que seja falso, não mente. Pois deve isso à enunciação de sua : profere, por meio dela, aquilo que tem em mente e acredita ser como profere. Entretanto, não é sem vício, porque ainda que não minta, caso acredite em coisas nas quais não deveria acreditar ou ignore se sabe aquilo que pensa, toma o desconhecido pelo conhecido. É por isso que diz uma mentira quem tem uma coisa em sua mente e enuncia outra por meio de palavras ou quaisquer outros signos. Daí que se diga que o coração do mentiroso é duplo, ou seja, que nele existe um raciocínio duplo: pensa ou sabe a verdade de uma coisa, mas não a exprime, e diz outra no lugar daquela, sabendo ou pensando que é falsa. Do que resulta que se pode dizer que é falso aquele que não mente, se pensa ser verdade o que diz, e que é possível considerar verdadeiro aquele que mente, caso pense enunciar o falso no lugar do verdadeiro, embora seja realmente o contrário que enuncia.

Portanto, é a partir da opinião de sua mente, e não das próprias coisas, que deve ser julgada a verdade ou a falsidade daquele que está mentindo ou não. E, assim, aquele que enuncia o falso no lugar do verdadeiro, julgando ser o falso verdadeiro, pode ser considerado errôneo ou temerário, mas não pode ser tido, de maneira isenta, como mentiroso, porque, ao enunciar, não tem um coração duplo, nem deseja enganar, mas é enganado. Porém, a culpa do mentiroso é o desejo de mentir enunciado em sua própria alma: ou quando engana, caso se dê crédito àquilo que ele diz, ou não engana: seja quando não se acredita nele seja quando enuncia uma verdade que pensa não ser verdadeira com a intenção de enganar. Porque, quando se crê nele, em todo caso, não engana, embora desejaria enganar: somente engana na medida em que se julga que ele sabe ou pensa como enuncia. [AGOSTINHO, Santo. Sobre a mentira. Tr. Alessandro Jocelito Beccari. Petrópolis: Vozes, 2019 (ebook)]