individualidade

(lat. Individualitas; in. Individuality; fr. Individualité; al. Individualität; it. Individualita).

Termo de origem medieval: o modo de ser do indivíduo. (Abbagnano)


Por carácter (em grego ethos) entendo a manifestação social da individualidade. A individualidade manifesta-se de três maneiras, seguindo as três divisões radicais (não importa agora analisá-las) da inteligência, sensibilidade e vontade, ou se melhor julgarem, desejo — a faculdade pela qual nos exteriorizamos. E a esta que se liga o carácter, que é, já o dissemos, a manifestação social da individualidade. Dos outros dois elementos, a sensibilidade é extra-social, porque só ao indivíduo pertence e só a ele lhe importa, e a inteligência é supra-social, visto estar em relação com um meio mais largo do que o indivíduo, com um meio intenso a que não põe limites o espaço e que o tempo não encadeia.

Mas a inteligência, a sensibilidade, perguntarão, não pertencem ao carácter? Pertencem e não pertencem. Uma coisa é carácter; outra é individualidade.

(A individualidade tem 3 formas de se manifestar.)

O homem, um ser qualquer — é um modo-de-sentir posto diante de uma matéria qualquer, em si desconhecida, da combinação da qual com esse modo-de-sentir resulta uma representação, idêntica na generalidade, diversa nos detalhes, em todos os homens, em todos os seres (especialmente nos da mesma natureza).

Há pois em cada homem:

(1) Uma percepção universal em natureza da realidade, que ele tem de comum com os animais, com tudo que é consciente.

(2) Uma percepção geral do mundo que ele tem de comum com os homens ou seres da sua espécie,

(3) Uma percepção particular que não tem em comum, que lhe é especial a ele, a cada homem — em cada um diversa (Presumivelmente de 1914-1915). [Fernando Pessoa]


Essa igualdade moderna, baseada no conformismo inerente à sociedade, e que só é possível porque o comportamento substituiu a ação como principal forma de relação humana, difere, em todos os seus aspectos, da igualdade dos tempos antigos, e especialmente da igualdade na cidadeEstado grega. Pertencer aos poucos “iguais” (homoioi) significava ser admitido na vida entre os pares; mas o próprio domínio público, a pólis, era permeado por um espírito acirradamente agonístico: cada homem tinha constantemente de se distinguir de todos os outros, de demonstrar, por meio de feitos ou façanhas singulares, que era o melhor de todos (aien aristeuein). Em outras palavras, o domínio público era reservado à individualidade; era o único lugar em que os homens podiam mostrar quem realmente eram e o quanto eram insubstituíveis. Por conta dessa oportunidade, e por amor a um corpo político que a propiciava a todos, cada um deles estava mais ou menos disposto a compartilhar do ônus da jurisdição, da defesa e da administração dos assuntos públicos. [ArendtCH, 6]


Ora, há, no cristianismo, algo que constitui sua originalidade radical com respeito às outras grandes formas de espiritualidade: essa unidade absoluta entre todos os Si viventes, longe de significar ou de implicar a dissolução ou aniquilamento da individualidade de cada um deles, é, ao contrário, constitutiva dessa individualidade, na medida em que é na efetuação fenomenológica da Vida em seu Verbo que cada um está unido a si, é gerado em si mesmo como esse Si irredutivelmente singular, irredutível a qualquer outro. Tal é uma das significações decisivas da palavra intemporal de Mestre Eckhart: “Deus se engendra como eu mesmo”. Assim se esclarece um dos grandes paradoxos do cristianismo. Manter cada um- o mais humilde, o mais insignificante — na individualidade irredutivelmente singular que é a sua, em sua condição de Si transcendental, na essência em que ele ou ela são para sempre: eis o que, longe de dever ou de poder ser superado ou abolido em algum lugar, pode tirar o homem do nada. [361]

É essa irredutibilidade de cada um o que motiva a extraordinária atenção de Cristo em relação a cada um. A eliminação de toda consideração relativa a uma condição profissional, econômica, social, intelectual, étnica ou outra revela, por trás de todos os caracteres empíricos de dada individualidade, não sua condição de indivíduo (o homem dos “Direitos do Homem”, por exemplo), mas o homem no que ele tem de único. É assim que, como declara Cirilo: “Nem Paulo, por exemplo, pode ser ou ser considerado Pedro, nem Pedro ser ou ser considerado Paulo”. É assim ainda que, em sua primeira carta, João designa o próprio Cristo como Aquele — trata-se de viver “como Aquele viveu” (1 João 2,6) — ainda que se trate, a seus olhos, do princípio de todas as coisas. Que essa singularidade irredutível de cada um seja gerada no próprio princípio de toda geração e que, mais ainda, venha a ele e se aproprie dele no processo sem Fundo da Vida absoluta, aí está, sem dúvida, uma das intuições mais extraordinárias do cristianismo. (Michel Henry, MHE)


Por carácter (em grego ethos) entendo a manifestação social da individualidade. A individualidade manifesta-se de três maneiras, seguindo as três divisões radicais (não importa agora analisá-las) da inteligência, sensibilidade e vontade, ou se melhor julgarem, desejo — a faculdade pela qual nos exteriorizamos. E a esta que se liga o carácter, que é, já o dissemos, a manifestação social da individualidade. Dos outros dois elementos, a sensibilidade é extra-social, porque só ao indivíduo pertence e só a ele lhe importa, e a inteligência é supra-social, visto estar em relação com um meio mais largo do que o indivíduo, com um meio intenso a que não põe limites o espaço e que o tempo não encadeia.

Mas a inteligência, a sensibilidade, perguntarão, não pertencem ao carácter? Pertencem e não pertencem. Uma coisa é carácter; outra é individualidade.

(A individualidade tem 3 formas de se manifestar.)

O homem, um ser qualquer — é um modo-de-sentir posto diante de uma matéria qualquer, em si desconhecida, da combinação da qual com esse modo-de-sentir resulta uma representação, idêntica na generalidade, diversa nos detalhes, em todos os homens, em todos os seres (especialmente nos da mesma natureza).

Há pois em cada homem:

(1) Uma percepção universal em natureza da realidade, que ele tem de comum com os animais, com tudo que é consciente.

(2) Uma percepção geral do mundo que ele tem de comum com os homens ou seres da sua espécie,

(3) Uma percepção particular que não tem em comum, que lhe é especial a ele, a cada homem — em cada um diversa (Presumivelmente de 1914-1915). (Fernando Pessoa)