ícone

De modo semelhante à distinção saussuriana entre significante e significado, Charles Sanders Peirce diferenciava no representamen (o signo) as “qualidades materiais” e seu “interpretante imediato”. À diferença do mestre genebrino, contudo, que afirmava o caráter de arbitrariedade do signo (V. arbitrariedade do signo), o linguista norte-americano observava que o representamen abrange três tipos, o ícone, o índice e o símbolo. O ícone se caracteriza por nele se dar uma similitude de fato entre o significante e o significado, o que vale dizer, por haver uma motivação entre os dois. São icônicas tanto as representações figurativas de um objeto ou de um animal na pintura, quanto as formas onomatopaicas, muito embora se deva notar a propósito destas que raramente a onomatopeia é motivada natural e não culturalmente. O índice se caracteriza por se realizar mediante uma contiguidade de fato entre o significante e o significado. A fumaça é proverbialmente índice de fogo, a aceleração do pulso, índice da febre. O estudo da propaganda, visualizada sob este ângulo, por outro lado, apresenta uma vasto elenco de índices industrialmente provocados, a exemplo de expressões como “a pausa que refresca”, “sabor pra frente”, etc. Ao símbolo, por fim, corresponde a ideia de signo. Este se distingue das duas modalidades anteriores pela ausência de qualquer similitude ou contiguidade entre suas partes constituintes. Assim sendo, se compreende tanto que a maior parte dos léxicos das línguas pertença a esta espécie, quanto o fato de a linguagem poética implicar o esforço de saída de seus limites em busca da motivação encontrada nas modalidades anteriores. [Luiz Carlos Lima – DCC]


Na filosofia grega o substantivo1 designa um modo já qualificado da aparição do visível, a saber sua natureza imaginária de simulacro e de ilusão. Platão prefere em geral os derivados de phainen, tais como2, phantasma, phasma, que indicam claramente a desvalorização ontológica daquilo que significam. É a teologia bizantina que deu ao ícone, enquanto imagem religiosa, suas modalidades plásticas, seus uso litúrgicos e sua significação disciplinar. Não somente o pensamento patrístico do ícone nutriu da reflexão contemporânea na fenomenologia da imagem, mas o termo mesmo de ícone foi diretamente retomado pelas filosofias da arte que tratam da “iconologia” ou da “iconografia” (p.ex. Erwin Panofsky) e as semiologias em continuidade ao pensamento de C.S. Peirce. O ícone designa então de modo muito geral tudo aquilo que está na dependência do campo impenetrável da representação e só mantém com a tradição icônica a ligação definição que o fundamenta desde o início enquanto signo relacional, tendo estatuto de imagem. [NP]


Que não se vá dizer, portanto, que a forma simbólica só é boa para o vulgar; o contrário é que seria verdade; ou, melhor ainda, ela é boa para todos, pois ajuda a compreender, de modo mais ou menos completo e mais ou menos profundo, a verdade que representa, na medida das possibilidades intelectuais próprias de cada um. É assim que as mais altas verdades, que não seriam de modo algum comunicáveis ou transmissíveis por qualquer outro meio, tornam-se acessíveis até certo ponto, desde que sejam, se pudermos assim dizer, incorporada aos símbolos, que as dissimularão sem dúvida a muitos, mas que as manifestarão em todo seu resplendor aos olhos daqueles que sabem ver.

Isso quer dizer, então, que o uso do simbolismo é uma necessidade? Aqui, é preciso estabelecer uma distinção: em si e de modo absoluto, nenhuma forma exterior é necessária; todas são de igual modo contingentes e acidentais em relação ao que expressam ou representam. É assim que, de acordo com o ensinamento dos hindus, uma figura qualquer; por exemplo, uma estátua que simboliza algum aspecto da Divindade, só deve ser considerada como um “suporte”, um ponto de apoio para a meditação; trata-se, pois, de um simples “auxiliar” e nada mais. Um texto védico oferece a esse respeito uma comparação que esclarece perfeitamente o papel dos símbolos e das formas exteriores em geral: tais formas são como o cavalo que permite ao homem concluir mais rápido uma viagem e com muito menos esforço do que se tivesse que empreendê-la através de seus próprios recursos. Sem dúvida, se esse homem não tivesse um cavalo à sua disposição, poderia apesar de tudo alcançar o seu objetivo, mas quão maior não seria a dificuldade. Se ele pode servir-se de um cavalo, seria um grande contrassenso recusá-lo, a pretexto de ser mais digno não recorrer a qualquer ajuda. Não será assim, precisamente, que agem os detratores do simbolismo? Além disso, se a viagem for longa e penosa, mesmo que não haja uma impossibilidade absoluta de se fazê-la a pé, pode ocorrer uma verdadeira impossibilidade prática de se chegar à meta. O mesmo se passa com os ritos e os símbolos: eles não são necessários por causa de uma necessidade absoluta, mas sim, de algum modo, por necessidade de conveniência, face às condições da natureza humana. (Guénon)


  1. eikon ↩

  2. phantasia ↩