Schopenhauer

SCHOPENHAUER (Arthur), filósofo alemão (Dantzig 1788 — Francforte-sobre-o-Meno 1860). Pretende não ligar-se a nenhuma escola (senão de longe à filosofia hindu), e contrapõe-se expressamente à escola pós-kantiana (Fichte, Hegel). Na verdade, sua filosofia da “vontade” como fundamento da “representação” é uma variação da filosofia de Fichte. Em 1813, sustenta sua tese em Iena sobre A quádrupla raiz do princípio de razão suficiente e em 1818 publica sua principal obra, O mundo como vontade e representação. Leciona em Berlim de 1820 a 1831, data em que deixa o ensino e opõe-se a tudo que é universitário. Sua teoria da representação, inspirada em Kant, baseia-se, segundo ele, numa concepção da vontade de viver inspirada em filósofos da índia. Seu pessimismo, que une as noções de sofrimento e de vida, leva-o a pregar o ascetismo. Sua moral, baseada na piedade, é uma crítica, às vezes profunda, da moral formal de Kant (Ensaio sobre o livre arbítrio, 1839). Seu estilo muito rico, cheio de metáforas, recobre de fato uma doutrina que, na filosofia do idealismo alemão (Kant, Fichte, Schelling e Hegel) comporta poucos elementos originais. (Larousse)


É Schopenhauer quem põe um término brutal ao reino da metafísica da representação, ao declarar que essa última não exibe em si nada que possa pretender à condição do ser real ou da existência verdadeira – determinando em demasia essa asserção decisiva com uma segunda não menos essencial, a saber, que a vida é o ser que jamais advém como ob-jeto de um sujeito, nem mesmo para esse sujeito, e que, nessa recusa principial da ob-stância, ela define a realidade. A interpretação do ser como Vida é o acontecimento crucial da cultura moderna, o momento em que ela retorna ao Começo e se dá de novo o modo de se unir a ele.

É preciso compreender o alcance do que a invenção schopenhauriana, ao repetir a de Descartes, tornava possível. Com uma filosofia da vida, são as determinações fundamentais da existência que são projetadas no primeiro plano: o corpo, a ação, a afetividade – é o solo no qual o pensamento sempre se edifica que é, enfim, levado em consideração. E, com efeito, vê-se surgir e desenvolver-se, em Schopenhauer, uma temática nova no que diz respeito à corporeidade, ao instinto, à sexualidade, ao amor, à vergonha, à crueldade e até aos problemas particulares e, todavia, decisivos que se abordam, ou melhor, estão em jogo nesse nível – os “dramas”, teria dito Politzer – como a escolha que os amantes fazem um pelo outro.

Mas a afirmação de que o totalmente outro da representação, – aquilo que lhe é diferente –, e o que nunca se mostra nela é o único que define o ser verdadeiro, essa mesma afirmação, escapa apenas da especulação para chegar à posição efetiva do que Schopenhauer denomina Vontade, e isso se esse totalmente outro da representação se revelar em si mesmo e em seu reino próprio. Sem isso, o ser irrepresentável é apenas o númeno kantiano, precisamente uma entidade especulativa, que o idealismo alemão se esforçará por reabsorver no pensamento, quer dizer, ainda na representação, deixando-o, por conta disso, escapar de novo. Só uma fenomenologia verdadeiramente radical, suscetível de apreender a essência da vida como a essência do aparecer originário, é capaz de, ao separar essa vida dos fantasmas e dos mitos de um trans-mundo [arrière-monde], retê-la ali onde ela está: em nós, como aquilo mesmo que somos.

É essa fenomenologia radical que Schopenhauer não tem meios filosóficos para construir. Ele estabelece, de modo verdadeiramente genial, que o outro da representação nunca pode ser apercebido nela; designa então uma corporeidade primitiva como o lugar de seu cumprimento e, ao mesmo tempo, como o que nos identifica com ele. Por outro lado, todavia, a teoria kantiana do sentido interno que reduz este último, quer dizer, a subjetividade absoluta, à ek-stasis do tempo e, assim, a uma representação, impede-o de dar uma significação fenomenológica à imanência que define, no final das contas, a Vontade. Essa última se encontra recolocada sob o jugo do pensamento ocidental e submetida ao seu destino, o de se produzir na luz da ek-stasis temporal ou de soçobrar na noite: ou a representação ou o inconsciente. A vida se perdeu no momento mesmo em que se nomeia, e Freud já está aí por completo. [MHPsique:42-44]


Schopenhauer, Arthur (1788-1860)

Filósofo alemão que influenciou grandemente a filosofia e a literatura dos séculos XIX e XX. Professor da Universidade de Berlim (1820), abandonou o ensino em 1831 para viver em seu retiro de Frankfurt. Sua filosofia é uma reação ao idealismo de Hegel e prepara, de alguma forma, a filosofia existencial do pessimismo. Seu pensamento foi fortemente influenciado pela filosofia e pelas concepções religiosas da índia.

Schopenhauer inicia sua obra antes de chegar a ser professor em Berlim com a obra que o tornou conhecido em todo o mundo: O mundo como vontade e representação (1818). O restante surgiu ao longo dos 28 anos do seu retiro de Frankfurt. Destacam-se: A vontade na natureza (1836); O livre-arbítrio (1839); Os dois problemas fundamentais da ética (1841); Dores do mundo; A vontade de amar. E as duas obras póstumas: Aforismos sobre filosofia de vida e Pensamentos e fragmentos.

Constrói toda a sua filosofia sobre a representação que compreende o sujeito e o objeto e sobre o conceito de vontade e de força. O mundo é uma representação — não pode ser concebido senão como representado numa inteligência — e o substrato deste mundo aparente ou fenomênico é o que ele chama de “vontade”. A realidade portanto se reduz a sua aparência. Para além dessa aparência, coloca-se a coisa em si, que devemos interpretar como uma vontade que se mostra em forma de impulso cego e irracional e que é sempre uma vontade de viver.

Em cada um de nós, tal vontade manifesta-se como exigência de felicidade e autoafirmação que jamais está satisfeita. Por sua vez, o mundo é campo de luta onde cada um quer dominar. O mal, a dor e a crueldade do mundo expressam a natureza básica da realidade. O mal nunca poderá ser vencido, porque faz parte da realidade. A libertação da dor e do mal inspiraram Schopenhauer à análise pessimista das condições da vida que caracterizou sua filosofia. Pela contemplação estética, a castidade que nega a espécie e o ceticismo que esgota os desejos e paixões, o homem conseguirá libertar-se, refugiando-se no nirvana da religião da índia. A salvação é alcançada assim mediante a renúncia à vontade de viver, da qual resulta a resignação. Nem o teísmo nem o panteísmo podem fazer nada contra o mal. O melhor é rejeitá-los. Nessa resignação, Schopenhauer fundamenta sua moral na piedade, que procede da consciência de identidade essencial dos seres.

BIBLIOGRAFIA: Obras: O mundo como vontade e representação; Sobre a vontade na natureza, 1934; O livre arbítrio, 1934; O fundamento da moral, 1896; Parerga e Paralipômena, 1926, 2 vols.; Adalbert Hamel, A. Schopenhauer y la literatura espanola, 1925. (Santidrián)