repetição

(in. Repetition; fr. Répétition; al. Wiederbolung; it. Ripetizioné).

1. Termo introduzido na terminologia existencialista por Kierkegaard. Este, para esclarecer sua significação, aproximou-o da expressão aristotélica quod quid erat esse (v. essência; substância), que, significando literalmente aquilo que o ser era, expressa a necessidade e a imutabilidade do ser, a sua repetição. Kierkegaard valeu-se desse conceito sobretudo para descrever a natureza da vida ética: à diferença da vida estética, que procura evitar a repetição, buscando novidades a todo instante (sendo por isso simbolizada por Don Juan), a vida ética baseia-se na continuidade, na escolha repetida que o indivíduo faz de si mesmo e de sua tarefa, sendo, pois, simbolizada pelo matrimônio (Die Wiederbolung, 1843; cf. Diário, IV, A, 15 6). Heidegger, por sua vez, utilizou esse conceito para caracterizar a existência autêntica, como ela se realiza na angústia. A angústia, por libertar o homem “das possibilidades nulas e liberá-lo para as autênticas”, consiste em retomar, para o porvir, as possibilidades que já foram no passado: isso é repetição (Sein und Zeit, § 68 b). Desse ponto de vista, repetição é decisão autêntica: “A repetição é a transmissão explícita, ou seja, o retorno às possibilidades do ser-aí que é já tendo sido. A autêntica repetição de uma possibilidade de existência que já foi, o fato de o ser-aí escolher seus heróis, baseia-se existencialmente na decisão antecipa-dora, porque é nela que se escolhe a escolha que liberta para a sucedaneidade da luta e para a fidelidade àquilo que deve ser repetido” (Ibid. § 74). Isso quer dizer que a decisão autêntica, em que consiste a historicidade da existência humana, é uma repetição ou, pelo menos (como Heidegger diz no mesmo trecho), uma réplica de possibilidades passadas.

2. Na filosofia da ciência, o conceito de repetição é empregado para expressar o fundamento das proposições indutivas, que (segundo Hume) seriam a expressão da repetição de casos (cf. Hume, Inq. Conc. Underst., V, 1). Desse ponto de vista, a repetição muitas vezes foi considerada a justificação das proposições universais. K. Popper criticou essa doutrina, que ele chama “doutrina do primado da repetição” (The Logic cf Scientific Discovery, 1959, pp. 420 ss.) (V. indução; teoria). [Abbagnano]