relação com o outro

É essa relação com o outro no sentido de outro Si o que se encontra expresso nos textos iniciáticos do cristianismo primitivo de um modo que nunca tinha sido ainda considerado pelo espírito humano. Qualquer que seja a dificuldade dos pensadores cristãos das gerações seguintes para conceitualizar a natureza de tal relação no horizonte grego, permanece este fato decisivo: é essa relação com o Outro Si absoluto que é Deus que se atualiza constantemente nas práticas litúrgicas e sacramentais trazidas pela nova religião.

Do ponto de vista fenomenológico, convém lembrar que tal relação deve ser compreendida ali onde ela se cumpre: fora do mundo, antes dele. O que é que advém antes do mundo? Nós o sabemos: é a relação de interioridade fenomenológica recíproca entre a Vida absoluta e o Primeiro Vivente na medida em que ela se experimenta n’Ele que se experimenta nela. Se experimentar-se a si mesmo, se fruir de si, é amar-se a si mesmo de tal modo que essa fruição de si, produzindo-se na Vida absoluta como a geração, por ela, do primeiro Si em que ela se experimenta e se ama assim a si mesma — experimentando-se esta a si mesma nessa Vida absoluta que se ama n’Ele –, sucede que cada um se ama num “outro” que (estando afastada aqui toda exterioridade) jamais lhe é exterior, mas, ao contrário, lhe é interior e consubstancial. Assim se cumpre a relação inaudita de que falamos: “Tu me amaste antes da criação do mundo”. (Michel Henry MHE)