Considera-se frequentemente como real (de res) tudo quanto se opõe a possível. Considera-se como real o ser atual (e não apenas em potência) o ser que constitui uma realidade objetiva, o que não é puro pensamento (captado ou realizado pelo ato de pensar), sem correspondência extra-mentis.
Neste caso, o real opõe-se extrinsecamente ao nada. É um diferente absoluto deste. Não se pode propriamente dizer que o real mantém uma relação de oposição extrínseca ao nada, por faltar a este realidade, o que tornaria tal relação sem consistência de res. Mas como podemos conceber o nada por oposição ao ser, o nada seria a total e absoluta recusa de ser ao ente, o que dá, portanto, realidade à relação entre o real e o nada, o primeiro como esquema noético, abstrato portanto, mas consistente, e nada, como esquema abstrato noético da recusa de toda prefixação sistencial e, ademais, recusa de toda e qualquer sistência.
Se considerarmos assim, tem realidade tudo quanto é alguma coisa, tudo quanto não lhe podemos predicar a recusa total e absoluta de ser alguma coisa.
Portanto tudo quanto é entitas. isto é, tem a propriedade do que possui o ser, em qualquer sentido e em qualquer grau que seja, é real. é aliquid res.
Colocado neste ponto, real opor-se-ia apenas a impossível, pois o nada é impossível e o que realmente podemos predicar ou apontar impossibilidade é nada (realmente, aqui, refere-se à proposição fundada na realidade da recusa, não no impossível, que não é entitas com perseidade, mas apenas o que conceituamos da impossibilidade, cuja realidade noética lhe é dada pela proporção à realidade recusada).
Se considerarmos que real é apenas o que tem atualidade, excluímos desse conceito o possível. Mas o possível não contradiz o ser. E o possível não pode ser considerado mero nada. Se não é nada, é alguma coisa (aliquid); se é alguma coisa tem entitas, tem ser em um certo grau, ao menos, e se o tem, tem realitas. (Pode o que concebemos possível não o ser; neste caso a não realidade do possível, tomado em si noeticamente, é uma realidade noética, embora falsa. Neste caso a elaboração noética é real, não o é a referência tomada como fato. Ou em outras palavras: há uma realidade noética e uma irrealidade ôntica.
Em “Teoria do Conhecimento”, tivemos ocasião de examinar a posição dos escolásticos e as polêmicas travadas entre eles sobre o real e a realidade.
Se considerarmos que é real tudo quando se põe afirmativamente, em si ou em outro, teríamos uma realidade em si e uma realidade em outro. Um ser de razão seria uma realidade em outro, uma existência em outro, de realidade mais restrita que um ser que tivesse perseidade, como um ser físico, que seria real–físico, enquanto o primeiro seria real–ideal (ou ficcional, ou conceitual, etc).
O tema da realidade interessa sobremaneira à filosofia moderna, e foi estudado com o máximo cuidado por Nicolai Hartmann, veja nosso resumo em “real e ralidade”. [MFS]