A lista dos predicamentos que em aristotelismo tem um lugar tão importante, apresenta-se, no primeiro livro do Organon, como uma coleção dos modos mais gerais do ser. Aí eles são apresentados em número de dez. Em outras partes a lista se verá um pouco reduzida. A tradição escolástica consagrou a lista completa de dez. Eis como Aristóteles a apresentou: (Categ., C. 4, 1 b 25) .
“As expressões sem qualquer ligação significam a substância, a quantidade, a qualidade, a relação, o lugar, o tempo, a posição, a possessão, a ação, a paixão. É substância, para o dizer em uma só palavra, por exemplo, homem, cavalo; quantidade, por exemplo, do tamanho de dois côvados, do tamanho de três côvados; qualidade, branco, gramático; relação, menor, maior; lugar, no Liceu, no Forum; tempo, ontem, no último ano; posição, ele está deitado, ele está sentado; possessão, ele está calçado, ele está armado; ação, ele corta, ele queima; paixão, ele se queima, se corta.”
As categorias constituem como que a última resposta e, a mais profunda, às questões que se podem colocar sobre a natureza das coisas. O que é isto? Uma substância, uma qualidade, será a última resposta.
Perguntou-se como Aristóteles teria constituído sua relação das categorias. Pretenderam alguns que tinha sido a partir de uma análise das formas da linguagem. Nós julgamos que se tal análise pôde, com efeito, esclarecer Aristóteles a este respeito, parece, entretanto, mais fundamentado descobrir nessa lista uma origem empírica ou indutiva, a partir do dado exterior.
Em seguida houve quem quisesse demonstrar que este quadro das categorias era necessário e suficiente. As razões apresentadas não são certamente sem valor, mas é necessário não esquecer que se trata de uma sistematização posterior à descoberta das categorias.
Categoria, no sentido etimológico da palavra, significa predicado e, de fato, nove das dez categorias enumeradas por Aristóteles são aptas a se tornarem predicados; apenas a substância, a que designa o primeiro sujeito, faz exceção. Essa particularidade nos permite dividir o conjunto das categorias em dois grupos gerais, dos quais o primeiro não contém senão uma única categoria, a substância, sendo que o segundo une todas as categorias que podem ser atribuídas à substância, os acidentes. Estes podem ser divididos, por afinidade, em quatro classes:
– Os acidentes fundamentais: quantidade, qualidade, relação;
– os que têm relação com a atividade: ação, paixão;
– os que situam as coisas: tempo, lugar, posição;
– um predicamento extrínseco: possessão.
As categorias, divisões essenciais do ser, podem, em consequência ser ordenadas da seguinte maneira:
Ens: substantia, accidentia.
Accidentia:
1. Quantitas, qualitas, relatio.
2. Actio, passio.
3. Quando, ubi, situs.
4. Habitus.
Este esquema representa o que se chama a divisão do ser segundo os dez predicamentos: ens dividitur secundum decem praedicamenta. Essa divisão se situa, de início, sob o ponto de vista metafísico ou das primeiras intenções, e é neste sentido que Aristóteles certamente a compreendeu. Mas pode-se dar-lhe uma significação propriamente lógica, quer dizer, considerá-la sob o ponto de vista das segundas intenções, como iremos fazer.
Metafisicamente considerados, os predicamentos exprimem os modos gerais do ser, mas cada um deles pode, por sua vez, ser relacionado com as modalidades mais particulares do ser, onde o ser se encontra: a substância, por exemplo, com as substâncias espirituais, corporais, etc. Obtém-se, assim, a classe de todos os seres que são substância. Como a substância e os outros predicamentos são os atributos mais elevados, eles podem, por extensão, ser chamados gêneros: são os gêneros supremos, abaixo dos quais se ordenam os gêneros menos elevados até às espécies, últimas. A série ordenada dos gêneros e das espécies, comandada por um dos dez predicamentos, se chama um predicamento lógico. Pode-se defini-lo:
Series generum et specierum sub uno supremo genere ordinatorum.
Subordinando-se a cada um dos dez predicamentos uma série de gêneros e de espécies, obtém-se uma classificação geral em que toda modalidade de ser terá o seu lugar, e que poderá servir de base para as definições. Precisemos logo que se trata aí de uma visão totalmente teórica que, apesar das aparências, não é difícil de realizar. Os autores costumam representar, para o caso mais accessível da substância, a série ordenada dos gêneros e das espécies que, partindo do gênero supremo, substância, desce até a uma de suas últimas espécies, o homem.
O esquema assim estilizado é a famosa árvore de Porfírio.
Arbor porphyriana:
Substantia: materialis, immaterialis.
Substantia materialis: corpus.
Corpus: Animatum, inanimatum.
Corpus animatum: Vivens.
Vivens: Sensibile, insensibile.
Vivens sensibile: animal.
Animal: Rationale, irrationale.
Animal rationale: homo.
Homo: Socrates, Plato, Aristotelis.
Essa ordenação dos gêneros e das espécies da substância é certamente bem fundamentada, uma vez que se baseia sobre a diferenciação das grandes classes ou reinos da natureza. Mas não se deve esperar dela mais do que ela pode dar. Ela não apresenta, com efeito, senão as linhas do predicamento substância, que pela série das diferenças, material, animada, sensível, racional, chega a uma única das espécies de substâncias concretas, o homem. As diferenças correspondentes, imaterial, animado, insensível, irracional, que permanecem indeterminadas, deixam aberto o mundo muito mais dificilmente penetrável das hierarquias angélicas e dos reinos minerais, vegetais e animais. Observemos, além disso, que as definições que se podem formar por gêneros e diferenças específicas “o homem é animal racional” etc. não têm sentido a não ser que se tenha compreendido verdadeiramente as diferenças e os gêneros superiores: diga-se isto para que não se acredite que a filosofia pode dar lugar a um psitacismo vazio. [Gardeil]