NIETZSCHE (Friedrich), filósofo alemão (Rökken, perto de Lutzen, 1844 — Weimar 1900). Estudante em Bonn e Leipzig, e amigo de Richard Wagner, lecionou em Bale de 1869 a 1878. Morreu louco. Um entusiasmado amor pela vida foi o princípio invariável de sua filosofia. A procura de uma síntese entre o mundo dionisíaco dos desejos e o mundo apolíneo da sabedoria (Origem da tragédia, 1872), a recusa da moral cristã, ou “moral dos escravos” (Humano demasiado humano, 1878; Para além do bem e do mal, 1886), sua “inversão de valores”, que substitui as teorias dos valores preestabelecidos por uma moral criadora, sua teoria do “super-homem” (Assim falou Zaratustra, 1885; A genealogia da moral, 1887; O crepúsculo dos ídolos, 1888) assim como a teoria do “retorno eterno” das coisas da vida humana são os principais temas de seu pensamento. O esforço de sua moral foi o de sair do pessimismo mais profundo, reconhecendo, entretanto, todas as experiências negativas, as “desgraças” que a vida pode reservar ao homem; sua máxima foi a de “fazer com o mais profunda desespero a esperança mais invencível”, graças a um heróico esforço da vontade e da imaginação. Seu lirismo, que implica numa contemplação estética da vida e dá natureza, aproxima-o das filosofias da natureza próprias ao romantismo alemão (Schelling, Schopenhauer). A teoria do retorno eterno influenciou certas filosofias da história, principalmente a teoria dos “ciclos de cultura” de Spengler ou Toynbee; sua moral individualista marcou certas obras literárias — a de Gide, por exemplo. A exploração de sua filosofia pelo fascismo e o nacional-socialismo deveu-se a uma deformação do pensamento do filósofo que sempre opôs a “besta prussiana” à civilização francesa. (Larousse)
Friedrich Nietzsche (1844-1900) nasceu em Roecken, Prússia, filho de um pastor protestante e de remota origem polaca. Desde moço aprofundou seus estudos em filosofia, estudando entusiasticamente a literatura grega. Por sua grande cultura, foi aprovado sem exames na Universidade de Leipzig, por voto unânime da Congregação. Aos 24 anos de idade, foi nomeado lente de filosofia na Universidade de Basileia (Suíça), onde por seu precário estado de saúde, teve de aposentar-se, vivendo, desde aí, em solidão. A leitura da obra de Schopenhauer (“O Mundo como Representação e como Vontade”) levou-o ao pessimismo, reagindo logo para uma concepção “otimista trágica” e para um “dionisismo”, diríamos, existencial, que colimou em seu lema do Amor fati, que consiste no amor à vida com todas as suas alegrias e tristezas. Influenciado pelas filosofias dos pré-socráticos, dos Vedanta, e por outros mais modernos, entre eles Lichtenberg, Pascal, Spinoza, Hegel, formulou um ataque extremado a todos os valores religiosos, filosóficos e científicos tradicionais, como também aos postulados do cientificismo do século XIX.
Acusou os metafísicos, defendeu o sentimento artístico contra a frieza da razão, aceitando para a arte uma justificação suficiente da existência, concebendo o Universo como a obra de um demiurgo artista. Afirmou a existência de um instinto poderoso no homem, que o impulsiona à procura da verdade, que o impele à arte; à vitória sobre si mesmo, energia essa que é essência da vida (Vontade de Potência), essência que compõe até os átomos que não são mais que partículas de “vontade de potência”, o Todo, e até Deus, que ele mesmo define como “Vontade de Potência”. O homem, assim como superou o “homo faber”, tem de superar o “homo sapiens”. O homem é uma ponte para uma super-humanidade de homens, que vencem suas fraquezas e se libertam da tirania de seus instintos e da razão, para a conquista de uma plena liberdade. É esse o ideal do super-homem, acessível somente aos que desejam ir além de si mesmo. Esse ideal não é um fim. Nietzsche é dinamista, dialético-trágico. O próprio super-homem conhecerá superações. Suas contribuições à sociologia e à psicologia são avultadas, havendo influído decisivamente em toda a concepção existencialista moderna da filosofia, e na obra dos psicologistas profundos, que decorrem de Freud, Adler e Jung, como de Spengler, Scheler, etc.
Sua doutrina, devido ao choque das contradições, oferece campo para interpretações díspares. Há inúmeras exegeses da sua obra e quase todas as correntes ideológicas da atualidade disputam a sua doutrina. Nietzsche faleceu nos albores deste século, havendo, porém, em 1888, perdido inteiramente a razão, devido a seus grandes padecimentos. [MFS]
Foi Nietzsche um dos filósofos do século passado de maior nomeada e de pior sorte intelectual. Durante dezenas de anos falou-se dele longamente, foi lido e comentado e mal compreendido; no geral, costumou-se abordá-lo pela superfície, pelo mais brilhante e atrativo de sua obra,. o que nela era literatura — na verdade excelente —, inclusive por seus erros mais graves, porém não se soube desprender de tudo isso o fundo de autêntica filosofia que seus livros encerram. Por esse motivo, ainda hoje, depois de tantos anos de inquieto rumor em torno a sua figura, Nietzsche reclama uma compreensão adequada e filosófica de seu pensamento.
Seu curriculum vitae é bem conhecido: nasce em 1844, estuda filologia em Bonn e Leipzig; em 1869 é professor dessa disciplina em Basileia, onde se intensifica seu contato com Erwin Rohde e Burckhardt; em 1879, sua má saúde obriga-o a deixar sua cátedra e dedicar-se somente a seu trabalho de escritor; dez anos depois perde a razão, e morre sem recobrá-la, com o século, em 1900. Sua obra — aforística e dispersa — acusa a influência de Schopenhauer e de Wagner, e ressente-se de imprecisão, de predomínio artístico sobre o conceitual e sistemático, de arrebatamentos apaixonados que frequentemente o impelem para o erro; como um exemplo, quando se refere ao cristianismo, que interpretou sempre de um modo torcido, sem sequer suspeitar que algumas de suas ideias mais valiosas guardavam uma filiação cristã indubitável.
Ocupou-se Nietzsche longamente do tema da vida, e suas descobertas nesse campo, embora ainda não utilizadas com precisão suficiente, foram decisivas. Entre Kierkegaard e a suma maturidade de Dilthey, Nietzsche preenche um lugar insubstituível na história da conquista da realidade vital, e é isto o que atualmente mais interessa nele. [Marías]
Escritor e filósofo alemão. Cursou seus estudos nas Universidades de Bonn e Leipzig, onde se especializou em filologia clássica, entusiasmando-se com a filosofia de Schopenhauer e a música de Wagner. Em 1870 foi nomeado professor de filologia clássica em Basileia, atividade que deixou em 1878 por grave enfermidade. O restante de seus dias esteve em Sils Maria, na Riviera, e em diversas cidades da Itália e da Alemanha, quase sempre solitário e rodeado, às vezes, de seus escassos amigos e discípulos. Na última década de sua vida foi vítima de um obscurecimento mental e paralisia, fruto de uma depressão nervosa que vinha sofrendo há muitos anos.
No pensamento e atividade de Nietzsche costumam distinguir-se três períodos. O primeiro — que vai desde seus estudos até 1878 — caracteriza-se por seus primeiros trabalhos de interpretação e crítica da cultura do Ocidente e do cristianismo, e pela exaltação e devoção que sente por Schopenhauer e Wagner. Deste período são as suas obras: A origem da tragédia (1872); A filosofia na época trágica dos gregos (1874) e Considerações intempestivas (1875-1876). No segundo — a partir da ruptura com Wagner (1878) — manifesta sua exaltação pela cultura e espírito livres. Está representado por obras como Humano, demasiado humano (1876-1880); Aurora (1881); .4 gaia ciência (1882). Finalmente, o terceiro, chamado período de Zaratustra ou da vontade de poder, com obras como Assim falou Zaratustra (1883); Para além do bem e do mal (1889); Genealogia da moral (1887). A essas seguiram-lhe outras bem conhecidas como O anticristo; O imoralista; A vontade de poder; Ensaio de uma transmutação de todos os valores; O niilismo europeu; Os princípios de uma nova escala de valores, e os aforismos definitivos sobre o Eterno retorno.
Apesar desses períodos de seus contrastes e contradições, os críticos encontraram em Nietzsche uma unidade de pensamento em toda a sua obra. Reduzida a um esquema, poderia ser o seguinte: a) A distinção entre o apolíneo e o dionisíaco na cultura grega e em toda a cultura ocidental leva-o a uma exaltação de Dionísio como “afirmação religiosa da vida total, não renegada nem fragmentada”. É a exaltação do mundo tal como ele é, sem diminuição, sem exceção e sem eleição: exaltação infinita da vida infinita, b) A inversão dos valores — na qual Nietzsche via a sua missão e o seu destino — aparece em sua obra como uma crítica da moral cristã, reduzida por ele substancialmente à moral da renúncia e do ascetismo. A moral cristã é a rebelião dos inferiores, das classes subjugadas e escravas, contra a casta superior e aristocrática. Seu verdadeiro fundamento é o ressentimento: o ressentimento daqueles a quem é proibida a verdadeira reação da ação, e que encontram sua compensação numa vingança imaginária, c) Os fundamentos da moral cristã: o desinteresse, a abnegação, o sacrifício são o fruto do ressentimento do homem fraco diante da vida. d) O tipo ideal da moral corrente, o homem bom, existe somente às custas de uma fundamental mentira: negar a realidade, tal como está feita. O último resultado é negar a vida, não aceitá-la. e) Como contraposição, Nietzsche exalta tudo o que é terreno, corpóreo, anti-espiritual, irracional. “Eu ensino aos homens uma vontade nova: seguir voluntariamente o caminho que os homens seguiram cegamente, aprovar esse caminho e não tentar refugiar-se como os doentes e decrépitos” (Assim falou Zaratustra). Tal é a vontade de viver ou de poder: porque a vida é o valor supremo.
Para a conquista da vida e do mundo, Nietzsche propõe o eterno retorno e o super-homem. Porque o “eterno retorno” nada mais é do que o sim que o mundo diz a si próprio, é a auto-aceitação do mundo, a vontade cósmica de reafirmar-se e de ser ela mesma: expressão cósmica daquele espírito dionisíaco que exalta e bendiz a vida. “Esse mundo tem em si uma necessidade, que é sua vontade de reafirmar-se e, por isso, voltar eternamente sobre si mesmo.”
E se a fórmula do “eterno retorno” é a fórmula central, cósmica, do filosofar de Nietzsche, a do super-homem é a sua palavra final. “O homem deve ser superado — diz Zaratustra — . O super-homem é o sentido e o fim da terra. É a expressão e encarnação da vontade de poder. Portanto, o homem deve ser superado.” O que significa que todos os valores da moral corrente — que é moral gregária — devem ser transmudados. Para conseguir esse super-homem, deve-se renunciar aos valores constitutivos da cultura ocidental: a filosofia, a metafísica e a ética platônicas, juntamente com a contribuição judaico-cristã a ela.
Nietzsche propõe um niilismo absoluto e total para a consecução do super-homem. Consiste em fazer tabula rasa de todo pensamento filosófico grego e cristão. O super-homem exige a morte de Deus, do Deus dos metafísicos, do Deus monoteísta, do Deus moral das contraposições metafísicas entre o bem e o mal, mundo real e mundo aparente. Somente assim será possível a liberdade, característica do super-homem. Somente assim se construirá uma vida e uma moral acima e além do bem e do mal.
Dificilmente se pode dizer, em poucas palavras, o que significou e ainda significa Nietzsche para o cristianismo. Filósofo da “suspeita”, assim como Marx e Freud, “criou uma filosofia onde não há um acontecer objetivo, uma garantia estável, onde Deus morreu e onde o homem só pode existir como super-homem”. Nietzsche quis realizar o infinito para o homem e no homem. Transmudou os valores eternos pelos do mundo.
BIBLIOGRAFIA: Obras em português: O Anticristo; Crepúsculo dos ídolos; A genealogia da moral; A origem da tragédia; Assim falava Zaratustra; A minha irmã e eu; Além do bem e do mal; Ecce Homo: como cheguei a ser o que sou e outras; Eugen Fink, La filosofia de N, 1969; Gonzalo Sobejano, Nietzsche en Espana, 1967. (Santidrián