Vorstellen
représentation
A filosofia moderna faz a experiência dos entes como objetos. O ente se lhe contrapõe, através da percepção, para a percepção. O percipere prende, como Leibniz viu com tanta clareza, como appetitus o ente, apreende-o a fim de, através desse prender, trazê-lo a si numa compreensão conceitual, referindo ao percipere a sua apresentação (repraesentare). A repraesentatio, a representação determina-se como o ante-por-se a si (o eu) em percebendo o que aparece.
Dentre as peças doutrinárias da filosofia moderna, sobressai uma sentença que deve agir como uma espécie de solução para todo aquele que a utiliza na tentativa de esclarecer a sentença de Parmênides. Trata-se da sentença de Berkeley, cujo ponto de sustentação é o posicionamento metafísico fundamental de Descartes. Ela diz: esse = percipi, ser é igual a representar-se. Ser fica submetido ao representar no sentido da percepção. É essa frase que cria o espaço em que a sentença de Parmênides se torna susceptível de uma interpretação científica, escapando, assim, do círculo empoeirado de uma intuição meio poética, com a qual se costumava caracterizar o pensamento pré-socrático. Esse = percipi, ser é representar-se. Ser é em virtude do representar. Ser é igual a pensar à medida que a objetividade dos objetos se constitui na consciência capaz de representações, composta do “eu penso alguma coisa”. À luz desse enunciado sobre a relação de pensar e ser, a sentença de Parmênides adquire a posição de uma indiscutível forma prévia da doutrina moderna acerca da realidade e de seu conhecimento. (GA7 208)
Estamos refletindo sobre a essência da ciência moderna com a intenção de reconhecer o seu fundamento metafísico. Que concepção do ente e que conceito da verdade tornam possíveis que a ciência se torne investigação?
O conhecimento, enquanto investigação, pede contas ao ente acerca de como e até que ponto ele está à disposição da representação. A investigação dispõe do ente quando consegue calculá-lo antecipadamente em seu futuro transcurso ou calculá-lo a posteriori como passado. No cálculo antecipado quase se instaura a natureza, no cálculo histórico a posteriori quase a história. Natureza e história se convertem em objeto da representação explicativa. Esta representação conta com a natureza e ajusta contas com a história. Somente aquilo que se converte desta maneira em objeto é, vale como algo que é. A ciência chega somente a ser investigação desde o momento em que se busca o ser<ser do ente na chamada objetividade.
Esta objetivação do ente tem lugar em uma re-presentação cuja meta é a de colocar todo ente diante de si de tal modo que o homem que calcula possa estar seguro do ente ou, o que é o mesmo: possa ter certeza dele. A ciência se converte em investigação única e exclusivamente quando a verdade se transformou em certeza da representação. O ente se determina pela primeira vez como objetividade da representação e a verdade como certeza da mesma na metafísica de Descartes. O título de sua obra principal diz: “Meditationes de prima Philosophia”, isto é, “Considerações Sobre a Filosofia Primeira”. Prote philosophia é o nome aristotélico para aquilo que mais tarde se chamará metafísica. Toda a metafísica moderna, incluindo a de Nietzsche, se manterá dentro da interpretação do ente e da verdade iniciada por Descartes. (DZW)
O termo representação, que desnaturalizou toda a teoria da comunicação, diz Mairena em curso de retórica, presta-se a numerosas confusões que podem ser funestas para o poeta. As coisas são presentadas na consciência ou ausente dela. Não é fácil demonstrar que foram representadas na consciência. Mas, mesmo se admite-se que existe na consciência uma espécie de espelho que reflete imagens mais ou menos semelhantes às coisas mesmas, deve-se perguntar sempre: como a consciência percebe as imagens de seu próprio espelho? Pois uma imagem em um espelho impõe o mesmo problema de percepção que o objeto ele mesmo. Parece acordado atribuir ao espelho da consciência o poder miraculoso de ser consciente, e dá-se por aceito que uma imagem da consciência é a consciência de uma imagem. Assim esquiva-se da eterna questão, evidente para o bom senso: aquela da absoluta heterogeneidade entre os atos de consciência e seus objetos.
Quem se destina à poesia, artistas criadores de imagens, é convidado a refletir sobre isso. Pois terão que batalhar com presenças e ausências, em qualquer caso com cópias, traduções ou representações. (Juan de Mairena – Da essencial heterogeneidade do ser)