metafísica

ARISTÓTELES – Metafísica

Métaphysique – table des matières

Metaphysics

O termo “metafísica” aparece, em sua acepção atual, pela primeira vez, em fins do século V d. C, no neoplatônico Simplício. A ciência, por ele designada, já havia começado a ser sistematicamente elaborada por Aristóteles, no século IV a. C. Ocupa-se ela com o metafísico, com o que se encontra para além do físico. O significado que os Gregos atribuíram ao “físico” não coincide de maneira nenhuma com o sentido que hoje tem esta palavra, mas designa a totalidade da realidade empírica corpórea, enquanto submetida à physis ou seja, ao nascer e, em geral, ao devir. Por conseguinte, denomina-se metafísico o que, por essência, é inexperimentável, imutável e, de algum modo, espiritual, não o incognoscível (Inteligibilidade), como pretende N. Hartmann. — De acordo com Aristóteles, vemos que o metafísico se apresenta em duas formas. Primeiramente, há alguma coisa que não pode ser objeto de experiência e que está entranhado no experimentável como seu âmago mais íntimo: o ser indeterminado ou geral que penetra ou domina todo ente. Existe, em seguida, um Inexperimentável que ultrapassa o empírico como sua origem primeira: o Ser infinito e divino, criador de todo ente finito. Com isto se indicam os dois ramos da metafísica. A doutrina do ser considera todo ente desde o ponto de vista do ser, em geral, indagando-lhe a essência, propriedades e leis; dá-se-lhe ordinariamente o nome de ontologia (Du Hamel, 1661, foi quem primeiro se serviu deste vocábulo). A doutrina de Deus considera todo ente em relação ao Ser divino, do qual investiga a essência, existência e atividade; Aristóteles denominou-a theologike, e mais tarde recebeu o nome de teologia natural (em oposição à teologia baseada na revelação sobrenatural) e também (menos felizmente) de teodiceia. — Ontologia e teologia formam, em conjunto, a metafísica geral ou pura, porque se referem a todo ente e se aplicam ao estudo do próprio ser metafísico. Podemos contrapor-lhe, como metafísica especial ou aplicada, a doutrina filosófica do mundo (cosmologia) e do homem (psicologia e antropologia), porque exploram peculiares domínios do ente, penetrando até à sua mais íntima estrutura, recorrendo ao ser e a suas leis.

Do que fica exposto se infere a importância da metafísica. Representa ela a zona medular da filosofia, a ciência filosófica fundamental, uma vez que subministra a todos os domínios peculiares da filosofia seus últimos fundamentos. Por isso, Aristóteles a chama filosofia primeira, porque se ocupa com o que há de primeiro; na verdade, o ser e Deus são o que há de primeiro na ordem real, aquilo donde tudo o mais procede e pelo qual se mantém. — O método da metafísica, em especial da ontologia, não pode ser puramente analítico, nem puramente indutivo. 0 racionalismo (p. ex., Spinoza) procede por via analítica; isto é impossível, porque não logramos obter as ulteriores determinações do ser pela só dissecação do seu conceito. Uma metafísica indutiva é reclamada por certos pensadores provenientes das modernas ciências naturais (p. ex., Kulpe e Becher). Pretendem eles chegar às mais compreensivas leis do ser por meio de progressiva generalização indutiva; contra eles devemos afirmar que toda indução pressupõe já como válidas as leis ontológicas supremas. Entre estas duas tendências unilaterais encontra-se a metafísica da síntese apriórica ou da necessidade sintética, a qual acrescenta, de algum modo, ao ser suas ulteriores determinações, mas concebendo-as, a um tempo, como consequências intrínsecas, essencialmente necessárias e, por isso mesmo, aprióricas do mesmo ser.

Em nossos dias, materialistas (Materialismo) e positivistas (Positivismo) rejeitam a metafísica. Mas ao mesmo tempo está-se assistindo a um retorno a ela; ainda recentemente se descobriu em Kant o metafísico, sem que, em todo caso, se tenham superado sempre os limites de seu pensamento. Assim, por exemplo, N. Hartmann não vai além da ontologia, porque reserva à metafísica a só tarefa de delimitar os problemas últimos e insolúveis de todos os domínios do saber. A metafísica irracionalista, mostrando-se também eivada das doutrinas de Kant, muitas vezes só vê no saber metafísico matéria de ou de mundividência, nunca uma ciência. Quanto ao método, é insuficiente a metafísica indutiva, a qual, se fosse cultivada de maneira radical, a si mesma se aniquilaria. Heidegger (filosofia da existência) procura superar a metafísica, na medida em que esta, do mesmo modo que a ontologia, se circunscreveu a investigar o ente sem se propor a questão ontológica básica acerca do ser; mas nessa tarefa menospreza a elucidação do ser, que precisamente a metafísica tem, desde há muito, levado a cabo. — Lötz


Na linguagem filosófica universal o termo metafísica designa a parte superior da filosofia, isto é aquela que pretende dar as razões e os princípios últimos das coisas; tal termo remonta a Andronicus de Rhodes (1 século antes de Cristo) que, editando os escritos de Aristóteles, tomou a iniciativa de classificar sob o título de Meta ta Phisika (após os Físicos) uma coleção de quatorze livros cujo conteúdo parecia fazer logicamente sequência àquele dos livros de física. O próprio Aristóteles havia falado, para designar este conjunto, de Filosofia primeira ou de Teologia.

O objeto próprio da metafísica no peripatetismo, será, nós o veremos, o ser<ser enquanto tal e suas propriedades. Mas esta definição, que S. Tomás manterá, não deriva de maneira imediata da leitura da obra em questão. Um primeiro inventário descobre, com efeito, como que três concepções sucessivas desta ciência; e os liames orgânicos que as ligam entre si não se revelam de pronto. S. Tomás, que tomara consciência plenamente desta ambiguidade, apresenta deste modo, no Prooemium de seu comentário da Metafísica, esta triple concepção:

1º Em oposição às outras ciências, que não remontam senão a causas ou a princípios mais imediatos, a metafísica aparece de início como a ciência das primeiras causas e dos primeiros princípios. Esta definição se liga manifestadamente à concepção geral da ciência, conhecimento pelas causas, que é um dos primeiros axiomas do peripatetismo. A denominação de “Filosofia primeira” refere-se a este aspecto da metafísica que domina no livro A.

2º A metafísica se afirma em seguida como a ciência do ser enquanto ser e dos atributos do ser enquanto ser. Vista sob este aspecto, ela se apresenta como tendo o mais universal de todos os objetos, e considerando as outras ciências apenas um domínio particular do ser. Esta concepção toma corpo no livro da coleção de Aristóteles e parece se impor nos seguintes. É a ela que corresponde propriamente o vocábulo “Metafísica”.

3º Enfim, a metafísica pode ser definida como a ciência do que é imóvel e separado, ao contrário da física e da matemática que consideram sempre seu objeto sob um certo condicionamento da matéria. Deste ponto de vista, sendo Deus a mais eminente das substâncias separadas, a metafísica pode reivindicar a denominação de “Teologia”. Este aspecto prevalece na obra a partir do livro 6.

Este prólogo de S. Tomás é importante demais para não ser lido de perto. A metafísica, a quem cabe reger todas as outras ciências, não pode ter por objetivo senão os mais inteligíveis e não pode ser senão a mais intelectual das ciências. Ora, nós podemos considerar o mais inteligível segundo três pontos de vista diferentes:

“Em primeiro lugar, segundo a ordem do conhecimento. Com efeito, as coisas a partir das quais o intelecto adquire a certeza parecem ser as mais inteligíveis. Assim, como a certeza da ciência ligada à inteligência é adquirida a partir das causas, o conhecimento das causas parece ser o mais intelectual: e, em consequência, a ciência que considera as primeiras causas é, parece, ao máximo reguladora das outras.

Em segundo lugar, do ponto de vista da comparação da inteligência e do sentido; pois, o sentido tendo por objeto os particulares, a inteligência parece diferir dele na medida em que abarca os universais. A ciência mais intelectual é, portanto, aquela que concerne aos princípios mais universais, os quais são o ser e o que é consecutivo ao ser como o uno e o múltiplo, a potência e o ato. Ora tais noções não devem permanecer completamente indeterminadas. . . nem ser estudadas em uma ciência particular… Devem, pois, ser tratadas em uma ciência única e comum que, sendo a mais intelectual, será reguladora das outras.

Em terceiro lugar, do ponto de vista mesmo do conhecimento intelectual. Se uma coisa tem virtude intelectiva pelo fato de que se encontra desprovida de matéria, é necessário que seja o mais inteligível o que é o mais separado da matéria… Ora são mais separadas da matéria as coisas que não apenas se abstraem de tal maneira determinada… mas totalmente da matéria sensível: e isto não sãmente segundo a razão, como os objetos matemáticos, mas do ponto de vista do ser, como Deus e os espíritos. A ciência que trata destas coisas parece, em consequência, ser a mais intelectual e gozar diante das outras do direito de principado e de regência.”

Ciência das primeiras causas e dos primeiros princípios, isto é, sabedoria, ciência do ser enquanto ser, ciência do que é absolutamente separado da matéria, tal se nos revela sucessivamente a metafísica. Iremos retomar cada uma destas concepções a fim de melhor apreender-lhes a envergadura. Neste estudo teremos o cuidado de marcar a ligação de cada doutrina com o movimento geral do pensamento grego. Assim a elaboração aristotélica nos aparecerá, ao mesmo tempo que uma obra de especulação vigorosa, como que a culminância e a síntese da reflexão sobre os princípios dos três séculos que a precederam. (Gardeil)


Na linguagem filosófica universal o termo metafísica designa a parte superior da filosofia, isto é aquela que pretende dar as razões e os princípios últimos das coisas; tal termo remonta a Andronicus de Rhodes (1 século antes de Cristo) que, editando os escritos de Aristóteles, tomou a iniciativa de classificar sob o título de Meta ta Phisika (após os Físicos) uma coleção de quatorze livros cujo conteúdo parecia fazer logicamente sequência àquele dos livros de física. O próprio Aristóteles havia falado, para designar este conjunto, de Filosofia primeira ou de Teologia.

O objeto próprio da metafísica no peripatetismo, será, nós o veremos, o ser<ser enquanto tal e suas propriedades. Mas esta definição, que S. Tomás manterá, não deriva de maneira imediata da leitura da obra em questão. Um primeiro inventário descobre, com efeito, como que três concepções sucessivas desta ciência; e os liames orgânicos que as ligam entre si não se revelam de pronto. S. Tomás, que tomara consciência plenamente desta ambiguidade, apresenta deste modo, no Prooemium de seu comentário da Metafísica, esta triple concepção:

1º Em oposição às outras ciências, que não remontam senão a causas ou a princípios mais imediatos, a metafísica aparece de início como a ciência das primeiras causas e dos primeiros princípios. Esta definição se liga manifestadamente à concepção geral da ciência, conhecimento pelas causas, que é um dos primeiros axiomas do peripatetismo. A denominação de “Filosofia primeira” refere-se a este aspecto da metafísica que domina no livro A.

2º A metafísica se afirma em seguida como a ciência do ser enquanto ser e dos atributos do ser enquanto ser. Vista sob este aspecto, ela se apresenta como tendo o mais universal de todos os objetos, e considerando as outras ciências apenas um domínio particular do ser. Esta concepção toma corpo no livro da coleção de Aristóteles e parece se impor nos seguintes. É a ela que corresponde propriamente o vocábulo “Metafísica”.

3º Enfim, a metafísica pode ser definida como a ciência do que é imóvel e separado, ao contrário da física e da matemática que consideram sempre seu objeto sob um certo condicionamento da matéria. Deste ponto de vista, sendo Deus a mais eminente das substâncias separadas, a metafísica pode reivindicar a denominação de “Teologia”. Este aspecto prevalece na obra a partir do livro 6.

Este prólogo de S. Tomás é importante demais para não ser lido de perto. A metafísica, a quem cabe reger todas as outras ciências, não pode ter por objetivo senão os mais inteligíveis e não pode ser senão a mais intelectual das ciências. Ora, nós podemos considerar o mais inteligível segundo três pontos de vista diferentes:

“Em primeiro lugar, segundo a ordem do conhecimento. Com efeito, as coisas a partir das quais o intelecto adquire a certeza parecem ser as mais inteligíveis. Assim, como a certeza da ciência ligada à inteligência é adquirida a partir das causas, o conhecimento das causas parece ser o mais intelectual: e, em consequência, a ciência que considera as primeiras causas é, parece, ao máximo reguladora das outras.

Em segundo lugar, do ponto de vista da comparação da inteligência e do sentido; pois, o sentido tendo por objeto os particulares, a inteligência parece diferir dele na medida em que abarca os universais. A ciência mais intelectual é, portanto, aquela que concerne aos princípios mais universais, os quais são o ser e o que é consecutivo ao ser como o uno e o múltiplo, a potência e o ato. Ora tais noções não devem permanecer completamente indeterminadas. . . nem ser estudadas em uma ciência particular… Devem, pois, ser tratadas em uma ciência única e comum que, sendo a mais intelectual, será reguladora das outras.

Em terceiro lugar, do ponto de vista mesmo do conhecimento intelectual. Se uma coisa tem virtude intelectiva pelo fato de que se encontra desprovida de matéria, é necessário que seja o mais inteligível o que é o mais separado da matéria… Ora são mais separadas da matéria as coisas que não apenas se abstraem de tal maneira determinada… mas totalmente da matéria sensível: e isto não sãmente segundo a razão, como os objetos matemáticos, mas do ponto de vista do ser, como Deus e os espíritos. A ciência que trata destas coisas parece, em consequência, ser a mais intelectual e gozar diante das outras do direito de principado e de regência.”

Ciência das primeiras causas e dos primeiros princípios, isto é, sabedoria, ciência do ser enquanto ser, ciência do que é absolutamente separado da matéria, tal se nos revela sucessivamente a metafísica. Iremos retomar cada uma destas concepções a fim de melhor apreender-lhes a envergadura. Neste estudo teremos o cuidado de marcar a ligação de cada doutrina com o movimento geral do pensamento grego. Assim a elaboração aristotélica nos aparecerá, ao mesmo tempo que uma obra de especulação vigorosa, como que a culminância e a síntese da reflexão sobre os princípios dos três séculos que a precederam. (Gardeil)