horizonte

(gr. periekon; lat. horizon; in. Horizon; fr. Horizon; al. Horizont; it. Orizzonté).

Limite que circunscreve as possibilidades de uma investigação, de um pensamento ou de uma atividade qualquer: limite que pode deslocar-se, mas que volta a mostrar-se após cada deslocamento. Esse termo foi introduzido na filosofia por Anaximandro (séc. VI a.C), que considerou o Princípio (infinito ou apeiron) como aquilo que “abarca todas as coisas e as dirige” (Aristóteles, Fís., III, 4, 203b 11).

No sentido moderno, esse conceito foi elucidado por Kant, que entendeu por horizonte o limite ou a medida de extensão do conhecimento e distinguiu o horizonte lógico, referente aos poderes cognoscitivos em relação ao interesse do intelecto, o horizonte estético, referente ao gosto em relação ao interesse do sentimento, e o horizonte pratico, referente ao útil em relação ao interesse da vontade. Em geral, “o horizonte concerne ao juízo e à determinação daquilo que o homem pode saber, consegue saber e deve saber”; pode ser objetivo, sendo então histórico ou racional, ou subjetivo, sendo então universal ou absoluto, particular ou privado (Logik, Einleitung, § VI, A).

Essa noção foi retomada na filosofia contemporânea primeiramente por Husserl, que entendeu o horizonte como limite temporal (compreendido como presente ou agora), no qual estão todas as vivências (Ideen, I, § 82), e depois por Jaspers, graças a quem passou para o atual uso filosófico. Jaspers diz: “Sempre vivemos e pensamos num horizonte circunscrito. Pelo fato forma, no passado, e que, portanto, o passado condiciona, em certos limites (considerados mais ou menos amplos), o futuro do homem. É neste sentido que Heidegger disse que o projeto é o modo de ser fundamental do horizonte (Sein und Zeit, § 31) e Sartre falou de um projeto fundamental do mundo (L’être et le néant, p. 540). No mesmo sentido, John Dewey falou da mutabilidade da natureza humana e dos seus chamados instintos ou impulsos fundamentais (Human Nature and Conduct, pp. 95 ss.; 106 ss.). Heidegger insistiu também sobre a limitação da possibilidade de projetar, uma vez que todo projeto incidiria e se achataria naquilo que já foi, nisso consistindo a facticidade do horizonte (v. Projeto). Sartre insistiu na liberdade absoluta da possibilidade de projetar e considerou puramente arbitrária ou gratuita a escolha de um projeto qualquer (L’être et le néant, p. 721). Por outro lado, Dewey retomou o conceito iluminista de racionalidade (que é ao mesmo tempo condicionamento e liberdade) dos projetos humanos, e o existencialismo positivo deu ênfase aos mesmos caracteres de auto-projeção (cf. Abbagnano, Possibilita e liberta, 1956,1, 7; II, 3; etc). Aliás, hoje parece que até os biólogos compartilham dessa concepção. G. G. Simpson diz: “O horizonte pode optar por desenvolver suas capacidades como animal superior e tentar erguer-se ainda mais, ou sua escolha pode ser outra. A escolha é responsabilidade sua e apenas sua. Não existe automatismo que o eleve sem escolha ou esforço, nem existe uma tendência unilateral na direção certa. A evolução não tem objetivos; o horizonte deve dar objetivos a si mesmo” (The Meaning of Evolution, 6S ed., 1952, p. 310). [Abbagnano]


A História, em qualquer época, desenha os contornos da presença do presente. E esses contornos contornam o seu horizonte. «Horizonte» quer dizer «limitante». Posso crer que o limite não seja sempre o mesmo, isto é, que, de época para época, a presença do presente se dilate e, portanto, que o horizonte histórico de hoje circunscreva os horizontes de épocas pretéritas: mas não posso crer que o futuro traga consigo uma época em que já não se ponha um termo à investigação da proveniência do atual. Isto é o que significa a existência de um limite, de um horizonte. O mover-se, a História, dentro do seu horizonte, o não poder transpô-lo, também se diz de um modo mais sugestivo: para a presença do presente há um «lugar» de exaustão dessa mesma presença, e o horizonte histórico é esse «lugar». O horizonte é efetivamente um limitante, porque a presença do presente ficou toda para o lado de cá, sem forças para excedê-lo — exausta daquilo que finalmente se exauriu: a força retroativa da atualidade, atraindo para si a contrapolar antiguidade. Que, do além-horizonte, não há história possível, é o que espero se tenha tornado evidente — por ora, só mediante o facto dogmaticamente indicado de que esse horizonte é precisamente o da História… Talvez não haja limite que não seja liminar. Mas o limite da História não é, certamente, o liminar de outra, nem um prolongamento da mesma, ainda que, traçado em outro plano, pareça respeitar a existência de uma descontinuidade ou, até, de um abismo. Não há, nem pode haver, duas Histórias. Mas, ainda assim, pode invadir-nos e de nós se apossar o irreprimível anseio de saber o que está para além da História. Isso acontece fatalmente àqueles que muito de perto se achegam à linha do horizonte, ou melhor, àqueles que nunca o perdem de vista, pois ninguém a alcançará jamais, por muitos e tão largos passos que se deem a seu encontro. Isso acontece necessariamente a quem muito se ocupa da Grécia antiga, e com ela se preocupa. [EudoroMito:342]