gosto

(in. Taste; fr. Goüt; al. Geschmack; it. Gustó).

Critério ou cânon para julgar os objetos do sentimento. Visto que só a partir do séc. XVIII o sentimento começou a ser reconhecido como faculdade autônoma, distinta da faculdade teorética e da prática, a noção de gosto foi-se determinando, no mesmo período, em correlação com a noção do critério ao qual essa faculdade, em suas valorações, está adequada ou deve adequar-se. A faculdade do sentimento logo recebeu como atribuição a atividade estética: assim, entende-se por gosto sobretudo o critério do juízo estético, e foi com esse sentido que essa palavra se incorporou no uso corrente. Em seu sentido mais geral, o gosto é definido por Vauvenargues como “disposição para julgar corretamente os objetos do sentimento” (Intr. à la connaissance de l’esprit humain, 1746, 12); e por Kant, que declara, em Antropologia (§ 69): “O gosto (enquanto uma espécie de sentido formal) leva a compartilhar com outros os sentimentos de prazer e dor e implica a capacidade — agradável, graças a esse mesmo compartilhar — de sentir satisfação (complacentia) em comum com outrem”. Em alguns de seus Ensaios morais e políticos (1741), Hume entendeu o gosto em sentido mais estritamente estético, conquanto também ligue o gosto estreitamente com o sentimento em geral. A beleza é de fato um sentimento, e, como todo sentimento é justo, não se referindo a nada além de si mesmo, cada espírito percebe uma beleza diferente. Isso, porém, não impede que haja um critério do gosto, pois existe uma espécie de senso comum que restringe o valor do velho ditado “Gosto não se discute”. Pode-se determinar um critério do gosto recorrendo às experiências e às observações dos sentimentos comuns da natureza humana, sem pretender que em todas as ocasiões os sentimentos dos homens se conformem a esse critério. “Em cada criatura”, diz Hume, “há um estado são e um estado de doença; só o primeiro nos dá o verdadeiro critério de gosto e de sentimento. Se no estado de saúde do organismo houver uniformidade completa ou considerável de sentimentos entre os homens, poderemos daí inferir uma ideia da beleza perfeita, do mesmo modo como a aparência dos objetos, à luz do dia e aos olhos de um homem em bom estado de saúde, é considerada a cor verdadeira e real dos objetos, ainda que tanto durante o dia quanto durante a noite a cor seja apenas um fantasma dos sentidos” (Essays, I, p. 272). Por sua vez, E. Burke dizia: “Pela palavra gosto entendo apenas a faculdade, ou faculdades, da mente que são impressionadas pelas obras da imaginação e pelas belas-artes, formulando um juízo sobre elas” (A Philosophical Inquiry into the Origin of Our ldeas of the Sublime and Beautiful, 1756, Intr.; trad. it., p. 47). Para Kant, o gosto é uma espécie de senso comum , aliás o senso comum em seu significado mais exato, porque pode ser definido como “a faculdade de julgar aquilo que torna universalmente comunicável o sentimento suscitado por dada representação, sem a mediação do conceito” (Crít. do Juízo, § 40). Portanto, a universalidade do juízo de gosto não é a mesma do juízo intelectual, pois não se baseia no objeto, mas na possibilidade de comunicação com os outros. Em outros termos, o juízo de gosto só é universal porque se fundamenta na comunicabilidade do sentimento (Crít. do Juízo, § 39).

Kant também fez a distinção entre o gosto como faculdade de julgar e o gênio como faculdade de produzir (Ibid., § 48). Croce identifica essas duas faculdades, considerando idênticos o processo de criação e o de reprodução de uma obra de arte (Estética, cap. 16). Mas com isso o conceito de gosto não muda; na realidade, a estética moderna e contemporânea conservou ou reproduziu, com modificações irrelevantes (do ponto de vista conceptual), a noção de gosto elaborada pelos tratadistas do séc. XVIII, cujas características fundamentais expusemos. [Abbagnano]