As experiências mais correntes e mais fáceis do pavlovismo são aquelas que consistem em associar uma série de respostas reflexas ao instinto fundamental da fome. As experiências sobre a salivação dos cães tornaram-se clássicas. O bater de um metrônomo faz salivar um cão à representação da carne, se toda vez que lhe derem carne fizerem preceder esse ato pelo bater do metrônomo. O metrônomo estabelece na zona cortical um arco reflexo, que nos animais superiores se condiciona rapidamente (o condicionamento de reflexos é possível até nos peixes, cujo córtex é dos mais rudimentares); o reflexo estabelece a ligação entre um estímulo do meio ambiente e um centro cortical, mas essa ligação é temporária, desaparecendo brevemente, se a experiência não for repetida. O reflexo simples da salivação ao soar do metrônomo pode ser enriquecido e tornado cada vez mais subtil segundo a capacidade do paciente e a vontade do experimentador; pode-se por exemplo condicionar o reflexo fazendo com que o cão salive tantos ou quantos segundos ou mesmo minutos depois de cessado o som do metrônomo. Podem determinar-se reflexos em cadeia e pode-se, principalmente, depois do fenômeno da excitação, determinar o reflexo da inibição. Dá-se o caso da inibição externa, por exemplo, se ao metrônomo, que desencadeia a salivação, se associar inesperadamente um excitante não habitual, como o toque estridente de uma campainha; produz-se imediatamente a reação incondicionada da atenção e da defesa; e o precário reflexo condicionado da salivação se extingue subitamente.
Esta mecânica da excitação e da inibição, sugerindo a ideia da antítese, foi já transpolada para a terminologia filosófica, como ilustração de uma dialética do sistema nervoso; tese, a excitação; antítese, a inibição; síntese, o reflexo condicionado, visto como fusão temporária dum excitante indiferente e de um excitante incondicionado. Hegel teria talvez aprovado esta linguagem, típica do seu método; mas há nesta transpolação um erro grosseiro, porque a síntese — reflexo — não é aqui senão uma síntese da análise, isto é, uma decomposição do todo em suas partes e uma soma artificial dessas partes na recomposição do todo. A dialética hegeliana é um jogo e uma sucessão de antíteses sustidas pela unidade do Espírito subjacente, que se torna uma infinidade de outros sem deixar de ser sempre si mesmo. Mas esta dialética, uma vez abolido o Espírito que lhe dá unidade e sentido, se converte aqui num recurso linguístico da mecânica pavloviana; não havendo o substractum metafísico do Espírito, ou da Vida, mas apenas o jogo dos contrastes, a dialética fica sendo apenas um jogo pelo jogo, uma escolha arbitrária de teses e antíteses sem sentido, a menos que se restaure alguma unidade do metafísico, na variedade das manifestações dialéticas. Se os discípulos de Pavlov não se detiverem a tempo no uso da terminologia hegeliana, correrão o perigo de transformar a fisiologia dos reflexos numa espécie de panlogismo do absurdo. Porque a dialética de Hegel só tem sentido no idealismo absoluto de Hegel. [Barbuy]