(in. Statistics; fr. Statistique; al. Statistik; it. Statisticá).
Coleta e interpretação de dados numéricos em determinado campo; ou então, em geral, a ciência que tem por objeto os métodos para a coleta e a interpretação dos dados numéricos. Nascida no terreno da observação dos fatos sociais, a E. estendeu-se já a numerosos campos de investigação e, em primeiro lugar, ao domínio da física, inicialmente para a formulação de teorias especiais (a teoria cinética dos gases), depois para a formulação das leis da mecânica quântica. O conceito de lei E., ou seja, da uniformidade relativa da frequência de certo acontecimento, considerado numa escala numérica suficientemente extensa, foi formulado pela primeira vez pelo astrônomo e matemático belga A. J. Quetelet (Physique sociale, 1869). A corrente probabilista da ciência moderna levou esse conceito a muitos campos de indagação (v. causalidade; condição; física; ciência). [Abbagnano]
A estatística aplica-se aos fatos que se determinam quantitativamente por meio de um número maior ou menor de verificações individuais, fatos esses que são distintos desses elementos individuais e que não ocorrem como tais em nenhuns deles.
Noutros termos, a estatística permite determinar os caracteres de um grupo, comuns ao grupo inteiro, mas que se não descobririam em membro algum desse grupo tomado à parte e isoladamente; por exemplo, a duração média de vida num grupo de homens não é, em geral, a duração de vida exata de nenhum desses homens, tomados ao acaso, que, não obstante, é certa, pois que a tornamos a achar idêntica, para o mesmo grupo, em várias épocas sucessivas e, na mesma época, para vários grupos compostos de indivíduos distribuídos da mesma maneira quanto à idade.
Cumpre, no entanto, que estes grupos apresentem uma certa realidade, uma certa consistência enquanto grupos. Nem toda contagem é estatística. Nenhum naturalista se entretém a calcular o porte médio dos animais de um estábulo, reunidos no mesmo lugar por razões de acaso ou de fantasia. Também a média de preços recolhidos ao acaso: preços por grosso, de retalho, salários, preços de serviços, preços de renda, não é uma estatística. É uma estatística, pelo contrário, o cálculo do porte médio dos animais de uma espécie, ou dos preços por grosso de um país e numa época dada. O mesmo acontece com séries consideradas no tempo. A média de preços colhidos a dez anos, ou mesmo a cinco anos de distância, não é uma estatística enquanto se não sabe se, do ponto de vista econômico, há uma ligação ou uma relação de semelhança entre esses anos e que movimentos se efetivaram de um a outro. A média dos preços colhidos para todos os anos sucessivos de um período de alta, ou de um período de baixa, o acréscimo anual médio dos preços em cada um desses períodos, pelo contrário, já é uma estatística, porque a série dos anos de cada uma representa um grupo real com consistência. Conjunto no tempo, conjunto no espaço, pressupondo uma organização e uma ligação entre as partes, e estudado como tal: é esse o objeto a que se aplica a estatística. […]
Houve quem dissesse que a estatística era a ciência das médias e das curvas. Não é talvez definição suficiente. No entanto, é exato que, por exemplo, para eliminar as variações sasonárias do desemprego, temos de calcular médias anuais, e, para as avaliar, médias mensais. Simiand considerava mesmo a sociologia quantitativa como equivalente do método experimental. Mas temos aqui de tomar precauções complementares, que não são necessárias na física, porque não dispomos do meio de verificação que se oferece ao físico, ou seja a verificação material. Se o físico tiver eliminado fenômenos essenciais, não se produz o fenômeno. Em sociologia os números são sempre susceptíveis de combinação com outros números. Para nos certificarmos de que as médias ou os seus índices correspondem à realidade, que é muito mais complexa que na física, é indispensável que o estatístico calcule também valores típicos complexos, medianas por exemplo, com quartis, decis, e que calcule vários valores de gêneros diversos, que multiplique os agrupamentos. Quanto às curvas, devem cingir-se a todas as sinuosidades do fenômeno, representar todas as suas fases, mas também abranger toda a sua extensão e todas as suas partes: assim, por exemplo, representaremos os movimentos de salário por várias curvas, tanto quanto possível contínuas, justapostas, e também tão numerosas quanto houver de dados correspondentes a grupos diferentes: agricultura, indústria, e diversas espécies e formas de indústria, grandes cidades, cidades médias e pequenas. Exige isto esforço e atenção múltipla, ao mesmo tempo abstrata e concreta. Mas este método empírico é o único que garante um contato tão estreito quanto possível com a realidade.
M. Halbwachs, «La statistique en sociologie», comunicação à VII Semana Internacional de Síntese, 1935, in La Statistique, 1944, pp. 114-131.
As leis da estatística são válidas somente quando se lida com grandes números e longos períodos de tempo, e os atos ou eventos só podem aparecer estatisticamente como desvios ou flutuações. A justificativa da estatística é a de que os feitos e eventos são ocorrências raras na vida cotidiana e na história. Contudo, o pleno significado das relações cotidianas revela-se não na vida do dia-a-dia, mas em feitos raros, tal como a importância de um período histórico é percebida somente nos poucos eventos que o iluminam. Aplicar à política ou à história a lei dos grandes números e dos longos períodos equivale a obliterar voluntariamente o próprio objeto dessas duas; e é uma empresa inútil buscar o significado na política ou a importância na história quando tudo o que não é comportamento cotidiano ou tendência automática é descartado como irrelevante.
Não obstante, como as leis da estatística são perfeitamente válidas quando lidamos com grandes números, é óbvio que cada aumento populacional significa um aumento da validade e uma nítida diminuição dos “desvios” Politicamente, isso significa que, quanto maior é a população de qualquer corpo político, maior é a probabilidade de que o social, e não o político, constitua o domínio público. Os gregos, cuja cidade–Estado foi o corpo político mais individualista e menos conformista que conhecemos, tinham plena consciência do fato de que a pólis, com a sua ênfase na ação e no discurso, só poderia sobreviver se o número de cidadãos permanecesse restrito. Grandes números de pessoas amontoadas desenvolvem uma inclinação quase irresistível na direção do despotismo, seja o despotismo de uma pessoa ou do governo da maioria; e embora a estatística, isto é, o tratamento matemático da realidade, fosse desconhecida antes da era moderna, os fenômenos sociais que possibilitaram esse tratamento – grandes números justificando o conformismo, o behaviorismo e o automatismo nos assuntos humanos – eram precisamente o que, no entendimento dos gregos, distinguia da sua a civilização persa.
A triste verdade acerca do behaviorismo e da validade de suas “leis” é que, quanto mais pessoas existem, maior é a possibilidade de que se comportem e menor a possibilidade de que tolerem o não–comportamento. Estatisticamente, isso resulta em um declínio da flutuação. Na realidade, os feitos terão cada vez menos possibilidades de opor-se à maré do comportamento, e os eventos perderão cada vez mais a sua importância, isto é, a sua capacidade de iluminar o tempo histórico. A uniformidade estatística não é de modo algum um ideal científico inócuo; é sim o ideal político, não mais secreto, de uma sociedade que, inteiramente submersa na rotina da vida cotidiana, aceita pacificamente a concepção científica inerente à sua própria existência. [ArendtCH, 6]