dikaiosyne

Excertos de I. Gobry

dikaiosyne (he): justiça. Latim: justitia.

Esse termo tem duplo significado: instituição ou justiça política; virtude, ou justiça moral. Os pensadores gregos preocuparam-se com esses dois aspectos; em primeiro lugar, Platão e Aristóteles. Sinônimos empregados às vezes: díke; dikaiótes; díkaion (tó): justo, o que é justo.

A justiça é essencialmente medida (mesótes; mesón). E, como esse caráter é o caráter da virtude em geral (Aristóteles, Ét. Nic, II,VIII), a justiça se torna a virtude mais importante e admirável; e Aristóteles (ibid., V, 1,15) cita a propósito um verso de Teógnides: “Na justiça está incluída toda a virtude.” Por outro lado, a partir de Platão, a justiça se torna uma das quatro virtudes principais, ao lado da temperança, da coragem e da sabedoria (Platão, Rep., IV, 429e-441c), ou ao lado da temperança, da coragem e da prudência (Zenão, Plotino, I, II, 7). v. areté.

Os pitagóricos tinham grande reverência pela justiça, pois, em seu sistema, a harmonia é o princípio de unidade cósmica, psíquica e moral; além disso, segundo diz Polos, o Pitagórico’, “a justiça é a harmonia da alma” (Ateneu, IX, 54). Um verso de Palavras de ouro exorta a praticar a justiça. Segundo Aristóxeno, Pitágoras afirmava que a justiça política devia ser baseada no “Princípio divino” Jâmblico, Vida de Pitágoras, 174). Arquitas escrevera um tratado Da lei e da justiça.

Platão estabeleceu um elo estreito entre a justiça moral e a justiça política, graças à noção pitagórica de harmonia. Moralmente, cada uma das outras três virtudes refere-se a uma parte da alma humana; por isso, parecem autônomas; é a justiça que estabelece o acordo entre as três; politicamente, cada uma das outras três virtudes refere-se a uma classe social específica; é a justiça que estabelece o acordo entre as três, visto que por ela cada uma das classes cumpre uma função que concorre para o bem comum da Polis (Rep., IV, 435b-443e).

Inversamente, a injustiça (adikía) é um desacordo entre as três partes da alma e as três classes da sociedade (Rep., IV,434b-c;444b-d).

Aristóteles propõe-se tratar separadamente justiça moral e justiça política, homem privado e homem público que exercem atividades diferentes (Pol, III, IV, 3-7). No entanto, não pode tratar da primeira (à qual dedica todo um livro) sem se referir à lei: o justo define-se pela igualdade e pela legalidade, pois só há justiça para homens que vivam sob uma lei, necessária para regrar suas relações (Ét. Nic, V, II,VI). No entanto,para que haja virtude, é necessário que a ação justa seja realizada voluntariamente (ibid., V, II, 1-3;V, 1;VIII, 1-4). Por outro lado,Aristóteles faz uma classificação, que se tornou famosa, das diferentes formas de justiça: justiça distributiva (essa palavra medieval não figura no texto), que reparte honrarias e riquezas (ibid., V, II, 12; III, 7; IV, 2); justiça contratual (synallagmatiké), que é voluntária e incide nas operações econômicas e comerciais (ibid.,V, IV, 12-13);justiça corretiva (diorthotiké), que é involuntária e obra do juiz para reparar a injustiça. Voltamos à lei. Em Política, em vez de considerar a justiça como instituição, Aristóteles a vê como virtude cívica, que consiste em servir o bem comum (III, IV, 1-7).

Para Arquelau, o justo e o injusto não existem por natureza, mas por convenção (D.L., II, 16). Depois dele, Epicuro reduz a justiça ao contrato (synthéke) e a fundamenta na utilidade (Máximas, 33, 36, 37). Plotino preocupa-se pouco com a justiça; existe uma justiça (díke) universal, assumida pela Alma, justiça que coordena o movimento dos astros (II, III, 8); e, para cada alma humana, a justiça consiste em escolher o corpo que lhe convém no momento de sua encarnação (IV, III, 13).

1. Ou Poios de Lucânia, que não deve ser confundido com o sofista Poios de Agrigento.

2. Segundo Cícero (Rep., III, 8), Aristóteles escrevera um tratado Da justiça em quatro livros.


DIKAIOSYNE = JUSTIÇA, RETITUDE, RETIDÃO, RIGOR


Evangelho de Jesus:
*beatitudes: bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça; bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça
*buscai primeiro o reino de deus

Dicionário Teológico do Novo Testamento, coenen, Beyreuther, Bietenhard
dikaiosyné = justiça; díkaios = justo; dikaióô = justificar, reabilitar; dikaíoma = requisito jurídico, precepto legal; dikaíósis = justificação, reabilitação.

António Caeiro: A arete como possibilidade extrema do humano
A excelência (arete), enquanto justiça justificada (dikaiosyne), é a possibilidade única a escolher, quando nos encontramos na situação destruidora e perversa (kakia) provocada pela presença do desejo de prazer (hedones epithymia) na nossa existência.

Reto, Retidão, Justiça (Recht, Gerechtigkeit) (Recht: reto, justo, exato; Gerechtigkeit. retidão, justiça)

Justiça (Gerechtigkeit) diz respeito à retidão, pois contém a palavra recht, que significa reto, direito, no sentido de ereto. Portanto, sem curvas, torturas e torneios, sem desvios, sem senões e titubeios, de alguém que está aberto na fidelidade da sua identidade ao que é da identidade do outro. O justo é quem sabe corresponder à identidade do outro, plenamente, deixando-o ser. Essa conotação da precisão na fidelidade da identidade sua e do outro, faz-nos entender o reto como justo, afeito à precisão da medida própria de cada ente. Ser reto, ereto, conota o estar de pé, cabeça erguida, não na empáfia da pretensão orgulhosa, mas no erguer-se, no identificar-se com, no levantar-se a partir da sua nascividade, da sua natureza. Quem é natural assim é o filho, livre, com o direito à herança, que se move no clã como quem está em casa, e não como escravo, encurvado debaixo de um poder a ele inadequado, imposto de fora. O homem justo, isto é, reto, ereto, está na medida verdadeira, isto é, ajustada na identidade do seu ser. E o ser do homem, na sua essência é igualdade com Deus, ser filho no Filho de Deus, na filiação divina. Estar solto, livre, sem nada, nada tendo nem acima nem abaixo, nem à direita nem à esquerda, estar assim à vontade, em casa, no ser filho de Deus é a liberdade. Esse modo de ser livre é a retidão, a Gerechtigkeit, a justiça. (Nota do tradutor Enio Giachini, aos Sermões de Mestre Eckhart)


Poderíamos acrescentar aqui que a qualidade da razão é a justiça, que é objetiva; a da imaginação é a vigilância, que é prospectiva; e a da memória é a gratidão, que é retrospectiva.
A injustiça é uma provação, mas a provação não é uma injustiça. As injustiças vêm dos homens, ao passo que as provações vêm de Deus. Aquilo que, da parte dos homens, é injustiça e, consequentemente, mal, é provação e destino da parte de Deus. Temos o direito ou, eventualmente, o dever de combater esse mal, mas devemos nos resignar à provação e aceitar o destino. Isso significa que é preciso combinar as duas atitudes, considerando que toda injustiça que sofremos da parte dos homens é, ao mesmo tempo, uma provação que nos chega da parte de Deus.
É importante não confundir as duas dimensões de que acabamos de falar: o fato de Deus nos enviar uma provação não impede que, no plano humano, ela possa ser uma injustiça; o fato de os homens nos tratarem injustamente não impede que isto seja justiça da parte de Deus. Portanto, devemos evitar dois erros: acreditar que um mal é no seu próprio plano um bem ou porque Deus no-lo envia, ou porque Deus o permite, ou porque tudo vem de Deus; e acreditar que uma provação, como tal, é um mal porque a sua forma é um mal e porque nós somos vítimas. Seria errado, também, acreditar que merecemos diretamente uma injustiça porque Deus permite, pois se assim fosse não haveria injustiça e os injustos seriam justos. Seria, também, inteiramente errado pensar que não merecemos uma provação porque nada fizemos que a tenha provocado logicamente.

(Frithjof Schuon: O ESOTERISMO COMO PRINCÍPIO E COMO VIA)


A noção de Justiça na tradição chinesa aparece assim como o atributo essencial, fundamental, do poder imperial antigo. Um imperador injusto expõe ao piores perigos físicos, materiais, todo o Império. As colheitas serão perdidas, o gado perecerá, o comércio estará em risco, monstros nascerão, o «Céu» e a «Terra» testemunharão de sua cólera por cataclismos sem número. Eis poque quase todas as sociedades secretas chinesas que se propunham a derrubar uma dinastia reinante só tinham uma palavra de ordem: «lutar pela Justiça» que não se deve evidentemente interpretar como a afirmação de uma ética sem cometer assim um grave contrassenso. Em realidade, o camponês, o negociante chinês compreendia de pronto o que significava, praticamente, o retorno ao equilíbrio assim exigido: melhores colheitas, afazeres prósperos, etc. ( René Alleau: ASPECTS DE L’ALCHIMIE TRADITIONNELLE )


¿Cómo se explica esta situación? Zhuangzi contesta que toda esta confusión tiene su origen en la tendencia natural de la Razón a pensar todo en función de la oposición entre lo «correcto» y lo «erróneo». Esta tendencia natural es producto de un concepto esencialista del Ser. La Razón natural es susceptible de pensar que una cosa «correcta» o «errónea» desde el punto de vista convencional o subjetivo es lo uno o lo otro en esencia. Sin embargo, en realidad, nada es esencialmente «correcto» o «erróneo». Lo «correcto» y lo «erróneo» son cuestiones relativas.

De acuerdo con esta postura no esencialista, Zhuangzi afirma que la única actitud justificable consiste en conocer, ante todo, la relatividad de lo «correcto» y lo «erróneo», y transcender dicho relativismo para pasar a la fase de «igualación» de todas las cosas, fase en que todo está esencialmente indiferenciado, si bien cada cosa, en un grado inferior de la realidad, es relativamente diferente y distinta de las demás. Zhuangzi da a esta actitud característica del «hombre verdadero» el nombre de tian ni (Nivelación celestial), tian jun (Igualación celestial) o man yan (Ausencia de límites).

Lo «correcto» no es «correcto» y «así» no es «así». Si ( lo que uno considera como ) «correcto» fuera ( absolutamente ) «correcto», sería ( absolutamente ) diferente de lo que no es «correcto», y no tendría sentido discutir sobre ello. Y si «así» fuera [[absolutamente) «así», sería ( absolutamente ) diferente de «no así», y no cabría discusión alguna.

Por tanto, en el perpetuo proceso de las «tesis cambiantes», (como «correcto» ➔ «incorrecto» ➔ «correcto» ➔ «incorrecto» etc., las tesis y las antítesis) dependen unas de otras. Y ( dado que esta dependencia relativiza toda la cadena de tesis y antítesis, ) se puede considerar que no se oponen entre sí.

[[Ante esta situación, la única actitud razonable] es armonizar todas esas ( tesis y antítesis ) en la Nivelación celestial y devolver ( las perpetuas oposiciones entre los existentes ) al estado de Ausencia de límites. (Toshihiko Izutsu – Sufismo e Taoismo)


Raimundo Lulio: JUSTIÇA
EL JUSTO Y SU GENERACIÓN