O trabalho a que nos referimos nos parágrafos anteriores ensombra e obscurece o reino do lúdico, onde as coisas se acrescem do seu «ser–origem», quero dizer, os símbolos em que se constituem os nós da rede mitológica, que é linguagem do mistério, e este, por sua vez, tênue (mas não enganador) reflexo das Fulgurações Ofuscantes do Ser, ou da Caótica Excessividade, ou do Deus que, oculto, habita lá por cima dos três patamares das teogonias, das cosmogonias e das antropogonias, mediante os quais se abriu [119] algum acesso do Além–Horizonte para o Aquém-Horizonte. Só neste, nos assalta a angústia das «coisas» diabolicamente separadas do «ser–origem» ou desprovidas da Originalidade do Ser. E como se, na descida, transpuséssemos os três limites-liminares do Real Absoluto, da Trans-Objetividade e da Objetividade; é como se, sucessivamente, a «subjetividade irredutível», que é minha, ponto absoluto instalado no Real Absoluto, dele fosse expulso ou, simplesmente, dele se retirasse, ao permitir envolver-se por todos os invólucros que, ao fim e ao cabo, haviam de fazer de mim — do «mim», que, ao princípio, eu nada tinha que fazer — a personalidade racional e voluntariosa que viria a ser, na pretensão de ser concêntrica aos círculos do Objetivo, do Trans-Objetivo e da pura Realidade. Caminhando de lá para cá, desci aos Infernos; participei da única e verdadeira catábase, que é uma queda da altura do Ser na humilhação das «coisas». Catábases nunca foram aventuras divinas ou heroicas, semelhantes a outras quaisquer; sempre foram aventuras transcendentes a todas as demais. Mas aventura que todas as demais transcende é ter chegado a percebermos do que as «coisas» são. Nada mais propriamente chamamos «coisas», do que falando de «objetos» e, ainda por cima, de objetos mais ou menos diminutos, que bem sabemos terem sido fabricados. [EudoroMito:119-120]