(gr. automaton; lat. automaton; in. Automaton; fr. Automate; it. Automo).
O que se move por si, em geral, uma coisa inanimada que se move por si ou, mais especificamente, um aparelho mecânico que realiza algumas das operações consideradas próprias do animal ou do homem.
Tem-se notícia de autômatos fabulosos, construídos pelos antigos. No séc. XVIII, um mecânico francês construiu um autômato que tocava flauta. Samuel Butler, em textos romanceados (Darwin entre as máquinas, 1863; Lucubratio ebria, 1865; Erewhon, 1872), falava de máquinas que tinham poderes humanos e entravam em conflito com o homem. O inglês Charles Babbage (1792-1871) projetou uma máquina calculadora que, contudo, nunca foi construída.
Um autômato lógico, ou seja, uma máquina capaz de combinar proposições e delas tirar conclusões, foi construído por Stanley Jevons em 1869. Em 1881, John Venn construiu um diagrama que podia ser empregado para ilustrar as relações entre os valores de verdade das proposições. Em 1885, Allan Marquand projetou uma máquina análoga à de Jevons e em 1947, em Harvard, T. A. Kalin e W. Burkhart construíram uma calculadora elétrica para a solução de problemas elaborados com base na álgebra de Boole, cujo objeto são variáveis que podem assumir só dois valores (verdadeiro ou falso, indicados, respectivamente, com 1 e 0), podendo, por isso, ser aplicada em todos os casos em que se tenha escolha entre duas alternativas.
A teoria dos autômatos em sentido moderno, ou seja, das máquinas calculadoras, foi desenvolvida por A. M. Turing em 1936. Em geral, as calculadoras executam o programa com base no qual foram projetadas, mas realizam as operações com rapidez e segurança muito maiores do que as do homem. Por isso, essas calculadoras são “poupadoras de tempo”. O biólogo inglês R. W. Ashby distinguiu-as dos “amplificadores da inteligência”, que, em certo grau, têm aquilo que, no homem, se chama de “iniciativa”. Entre estes, estão em fase de execução ou de estudo os autômatos que jogam e os autômato que aprendem. Von Neumann também falou de autômatos que se reproduzem ( Theory of Self-Reproducing Automata, 1966). Para as teorias relativas a esses autômatos, ver cibernética. (Abbagnano)
O que é um homem que não é um eu, um homem esvaziado de sua capacidade de se experimentar a si mesmo e, assim, de “viver”? No fundo, isso implica perguntar: O que é um homem reduzido à sua aparência na verdade do mundo? Um autômato, um complexo de computadores, um robô – uma aparência exterior de homem sem o que faz [371] dele um homem. O que faz dele um homem: o Si transcendental. Nenhum Si transcendental, no entanto, traz a si mesmo à condição que é a sua. Dado a ele mesmo e experimentando-se a si mesmo na autodoação da Vida absoluta e nela somente, todo Si transcendental é Filho desta vida.
Filho da Vida ou autômato – aí está o que João percebe no fulgor da visão profética. O autômato é a Besta – nem sequer a Besta, para dizer a verdade. Pois a Besta contém ainda uma referência oculta ao que seria algo como esta subjetividade vivente e harmoniosa que nos habita, esta subjetividade fenomenológica que faz de nós seres de Luz no seio mesmo de nossa Noite. A Besta ainda arremeda a vida. O que se propõe e se define como o homem esvaziado do que faz dele um homem, isso não é portanto a Besta, isso não é nem sequer o Monstro. Não é a Besta monstruosa que fazia fremir Marx quando, entrando numa indústria mecânica de seu tempo, ele via no dispositivo material a funcionar sozinho uma espécie de caricatura aterrorizante do agir humano, do “trabalho vivente”. Pois, quando o dispositivo material que funciona sozinho é realmente separado de toda relação com uma atividade humana qualquer e se define por essa exclusão, então já não é de uma Besta que se trata, mas daquilo mesmo que, estranho a todo sentir, a todo agir, a todo viver, à capacidade de se experimentar a si mesmo, se comporta, no entanto, como algo que age. O que o olhar inquieto de Descartes chamava pelo nome que se dava em sua época, “autômato”, João o percebe em sua nudez, despojado do que seria ainda a condição subjetiva desse funcionamento, desse “automatismo”: não a Besta, mas sua cópia inerte, inanimada, a “imagem da Besta” (Apocalipse 13,15).
“Autômato”, “imagem da Besta”: com que condição? Com a condição de que todo Si transcendental seja destruído, aniquilado – negado. Mas como um Si transcendental pode ser negado? Ele o é se as condições são as expostas pelo nascimento transcendental deste Si sem o qual nenhum homem é possível. Elas remetem à geração do Primeiro Si na Ipseidade original em que a Vida se autogera a si [372] mesma: a Cristo. Aquele que nega não a existência do homem, mas sua própria possibilidade, aquele que enceta o processo de eliminação principiai e a priori do homem – eliminação que precede e leva à eliminação efetiva e radical de todos os homens –, é este mesmo que nega a Cristo: o Anticristo. (Michel Henry MHSV)