adiaphoron

sem diferença, moralmente indiferente ou estado neutral

1. Uma vez que a finalidade do homem é, de acordo com as fórmulas estóicas mais antigas, viver harmoniosamente com a natureza (ver nomos), o bem consistirá nas coisas que são úteis e têm algum valor para esta espécie de vida, enquanto o mal residirá naquelas que para tal não contribuem (D. L. VII, 94, 105). Entre estas duas classes de atos absolutamente úteis ou perniciosos (justiça, prudência, moderação, etc, por um lado, covardia, injustiça, imoderação, pelo outro) existe outro grupo de coisas como a vida, a saúde e o prazer que são caracterizadas como moralmente indiferentes (adiaphora) pelo facto de não terem ligação imediata com a finalidade última do homem (D. L., VII, 101-103). Contudo, estes, na realidade, contribuem para ou impedem indiretamente essa finalidade e por isso são posteriormente divididos (D. L., VII, 105-106) em atos preferíveis (proegmena), atos que se devem evitar (apoproegmena) e aotos absolutamente indiferentes, constituindo a primeira categoria os «deveres» (officia) dos moralistas romanos que são definidos como aqueles atos para cujas realizações se pode dar alguma justificação racional (eulogos, probabilis) (Cícero, De fin. III, 17, 58).

2. Estas últimas distinções provocaram considerável controvérsia tanto na Stoa como na Academia. Estava fora de questão o ter-se a obrigação moral de escolher o bem; o que estava em causa eram as implicações morais de dividir os adiaphora em atos justificáveis ou não-justificáveis. Havia aqueles moralistas rigorosos como Aríston de Quios e o céptico Pirro que negaram que qualquer valor moral pudesse estar ligada a estas atividades racionalmente justificáveis e por isso «convenientes» (kathekonta) (Cícero, ” De fin. IV, 25, 68). Mais tarde, os ataques dos cépticos à certeza epistemológica tiveram os seus efeitos inevitáveis na esfera moral e vemos as duas eminências da Academia Nova ou Céptica, Arcesilau e Carnéades, lançar a teoria de que uma vez debilitada a certeza, o acto moral só pode ser aquele a que podemos dar uma justificação racional, aproximando-se o primeiro dos agora nucleares kathekonta, ao aplicar um critério intelectual (racionalmente provável, eulogon; Sexto Empírico, Adv. Math. VII, 158) e Carnéades ao apresentar um critério experimental (o praticamente provável, pithanon; idem, Pyrrh. I, 227-229).

3. Estas atitudes, associadas, no caso de Carnéades, a uma crítica aguda da epistemologia estóica, tiveram o seu efeito no pensamento da Stoa, no que se refere à ética, como resulta evidente da atenção que dá à escolha correta dos kathekonta, como o problema nuclear da vida moral (Estobeu, Ecl. II. 761. e do seu afastamento da anterior insistência de Zenão em que a virtude só por si (neste contexto, a vida em harmonia com a natureza) basta para a felicidade do homem, e da sua admissão da necessidade de satisfações provenientes da escolha correta dos kathekonta (D. L., VII, 128). [FEPeters]


Termo composto a partir de -PHOROS, um derivado de phero (portar) cuja raiz indo-europeia é bharati. Na moral estóica o termo designa as coisas que não são nem boas nem más, mas moralmente indiferentes porque não estão ligadas ao fim do homem que é de viver em harmonia com a natureza (D.L. VII 86-87, 101-103). Tais são a vida, a saúde e o prazer. As adiaphora eram divididas em coisas preferíveis (proegmena) porque tinham um valor positivo, como a riqueza e a saúde, em coisas a evitar (apoproegmena) porque tinham um valor negativo, como a pobreza e a doença, e em coisas absolutamente indiferentes, como o número de cabelos na cabeça (D.L. VII 105-107). Mas esta divisão deu lugar a numerosas discussões no interior da escola que multiplicou as classificações de bens morais. (Y. Lafrance — Le Notions philosophiques, PUF, 1990)