enunciação

(gr. axioma; lat. enuntiatum, Enuntiatio; in. Sentence; fr. Enonce; al. Aussage; it. Enunciató).

1. Expressão linguística de sentido completo, que é verdadeira ou falsa. Neste sentido, também se costuma falar de enunciação indicativo ou declarativo, ou de asserção.

Conquanto corresponda ao logos apophantikos de Aristóteles (De interpr., 4, 17 a 2), essa noção foi formulada claramente pelos estoicos, que definiram o enunciação (axioma) como aquilo que pode ser verdadeiro ou falso e o distinguiram da interrogação, do comando, do juramento, da apóstrofe e da expressão dubitativa (Diógenes Laércio VII, 65-68). Nos gramáticos latinos ao termo estoico corresponde o termo effatum ou proloquium (Aulo Gélio, Noct. Att, XVI, 18, 2-8; Apuleio, De interpr., p. 205), e Cícero preferiu enunciatum (De fato, I, 1). Na lógica medieval, esse termo foi usado alternadamente com proposição. Pedro Hispano diz que “proposição”, “questão”, “conclusão” e “enunciação” são termos substancialmente idênticos que só se distinguem porque a questão é aquilo de que se duvida, a conclusão aquilo que se demonstra com um argumento, a proposição é aquilo que se põe na premissa e a enunciação é aquilo que se pronuncia sem condições (absoluté) (Summ. log., 5.06). Esta identificação continua na lógica posterior (cf. p. ex. Jungius, Logica hamburgensis, 1638, II, I, 2).

Frequentemente esse termo é usado com o significado acima definindo na lógica contemporânea (cf. Carnap, Introduction to Semantics, § 37; Church, Introduction to Mathematical Logic, § 04). Na lógica, enunciação não equivale à simples emissão de voz (utterance), mas a uma fórmula ou esquema repetível, uma norma aproximável. Quine considera-o uma sequência (em sentido matemático) dos seus sucessivos caracteres ou fonemas (Word and Object, § 40). Quando, conforme ocorre com frequência, se distingue enunciação de proposição, diz-se que o enunciação é verdadeiro quando exprime uma proposição verdadeira (Kneale and Kneale, The Development of Logic, 1962, p. 53). Sobre a relação entre enunciação e proposição, v. proposição.

2. Qualquer expressão linguística de sentido completo. Neste sentido, mais estritamente gramatical, o termo indica não só a expressão declarativa (asserção ou proposição), como também as dúvidas, os comandos, as exortações, as apóstrofes, etc, frases que não podem ser declaradas verdadeiras ou falsas.

3. Mais raramente, quaisquer expressões linguísticas, também de sentido não completo; p. ex., uma palavra isolada como “vermelho” ou “quadrado”. Quine também considera enunciação uma interjeição como “ai” (ouch) (Word and Object, 1960, §3). (Abbagnano)


O julgamento é o ato do espírito que compõe ou divide afirmando ou negando; a enunciação é o termo desse ato, o que se diz ou se pronuncia julgando. É esta expressão do julgamento que interessa ao lógico, o ato como tal diz respeito à psicologia. Como para a primeira operação do espírito, iremos considerar paralelamente a expressão mental e o sinal verbal do pensamento.

Divisão da enunciação.

As divisões essenciais de uma operação se tomam a partir de seu objeto. Ora, a enunciação, termo do julgamento, tem como objeto o próprio ser que ela afirma, ipsum esse. Portanto, é sob o ponto de vista do ser afirmado que se efetuarão as divisões essenciais relativas a esta operação: haverá tantos tipos gerais de enunciações quantos os modos específicos de afirmação do ser. Dentre eles, a filosofia escolástica conservou os três principais.

As enunciações simples. – O predicado é um esse essencial ou acidental, recebido num sujeito que preenche a função de substância ou de suposto: “homem”, “bípede”, “gramático” atribuído a “Pedro”. As enunciações correspondentes: “Pedro é homem” etc., são ditas simples ou categóricas, porque há uma simples atribuição de um predicado a um sujeito. Dir-se-á que se tem aí um julgamento de inerência, para distinguir este caso, onde apenas se afirma que o predicado convém (inere) ao sujeito, daquele em que se precisa o modo dessa inerência (proposições modais).

As enunciações compostas. – O predicado afirmado exprime, neste caso, o laço existente entre enunciações simples. Ex.: “Se a chuva cai, a terra é molhada”.

Tais enunciações são ditas de conjunção ou compostas; a cópula não é mais o verbo “é”, mas partículas tais como “ou”, “se”, “e”. Vê-se que se trata de um caso’ muito diferente do precedente: a modalidade de ser que se afirma não é mais uma parte da essência ou um acidente de um sujeito, mas o próprio laço (causalidade ou coexistência) que une várias realidades. Os elementos de tal enunciação são já enunciações constituídas; daí lhes vem a denominação de enunciação composta (ou hipotética). Entretanto, não se trata ainda de um verdadeiro raciocínio, uma vez que não existe ainda, propriamente falando, um movimento do espírito a partir de verdades adquiridas em direção a uma nova verdade. -A enunciação composta, que tem seu fundamento na pluralidade do ser e nas relações que resultam dessa pluralidade, corresponde, no âmbito da segunda operação do espírito à divisão e à definição no âmbito da primeira, que são atividades relativas à pluralidade das essências e a suas relações.

As enunciações modais. – O predicado afirmado é o próprio modo de ligação dos dois termos de um julgamento “é necessário que o justo seja recompensado”. Estes modos, afetando a cópula ou o verbo, são, nós o veremos, o possível, o impossível, o necessário, e o contingente. A afirmação assim constituída tem como objeto a modalidade de ipsum esse que ela considera.

A teoria dos modais é longamente desenvolvida por Aristóteles no Peri hermeneias; a das proposições compostas, ao contrário, não remonta senão à lógica estoica.

Propriedades das enunciações.

As enunciações, consideradas como um todo e umas em relação às outras, têm propriedades. A mais essencial dessas propriedades é a oposição, que decorre do próprio caráter de afirmação ou de negação que necessariamente apresenta todo julgamento. Quando eu declaro que “este objeto é branco”, estou afirmando, por isso mesmo, uma oposição a toda outra proposição que possa ser-lhe contrária, tal como: “este objeto não é branco”.

A noção de “oposição” tem um lugar considerável nos escritos lógicos de Aristóteles. É estudada, em particular, quando se trata da proposição, no Peri hermeneias (a partir do c. 6), mas já tinha sido encontrada antes, a respeito dos termos (Categorias, c. 10 e 11); (ef. igualmente: Metafísica, A, c. 10 e I, c. 4 e seg.). Ler a este respeito, em Le Système d’Aristote de Hamelin o capítulo consagrado à oposição (p. 128 e seg.).

É possível descobrir-se, na filosofia anterior, uma dupla origem para esta teoria: na física pré-socrática, por um lado, onde já se dava grande importância à contrariedade das qualidades, quente-frio, sêco-úmido, e onde se concebia a mudança como a passagem de um contrário a outro contrário; por outro lado, nas especulações sobre a possibilidade da atribuição (as de Antístene, notadamente), onde se supunha necessariamente admitida a exclusão parmenidiana do ser e do não-ser. Na filosofia moderna, essa noção da oposição foi de novo posta em evidência: alguns idealistas, Hegel, Hamelin, e sob um outro ponto de vista Meyerson, a consideram praticamente como o fato primitivo ou o dado essencial sobre o qual deve repousar toda a metafísica.

A teoria aristotélica, para voltar a ela, compreende duas peças principais que iremos considerar sucessivamente: 1. uma teoria geral da oposição com sua distinção em quatro tipos fundamentais; 2. a teoria especial da oposição das proposições. (Gardeil)


O julgamento é o ato do espírito que compõe ou divide afirmando ou negando; a enunciação é o termo desse ato, o que se diz ou se pronuncia julgando. É esta expressão do julgamento que interessa ao lógico, o ato como tal diz respeito à psicologia. Como para a primeira operação do espírito, iremos considerar paralelamente a expressão mental e o sinal verbal do pensamento.

Divisão da enunciação.

As divisões essenciais de uma operação se tomam a partir de seu objeto. Ora, a enunciação, termo do julgamento, tem como objeto o próprio ser que ela afirma, ipsum esse. Portanto, é sob o ponto de vista do ser afirmado que se efetuarão as divisões essenciais relativas a esta operação: haverá tantos tipos gerais de enunciações quantos os modos específicos de afirmação do ser. Dentre eles, a filosofia escolástica conservou os três principais.

As enunciações simples. – O predicado é um esse essencial ou acidental, recebido num sujeito que preenche a função de substância ou de suposto: “homem”, “bípede”, “gramático” atribuído a “Pedro”. As enunciações correspondentes: “Pedro é homem” etc., são ditas simples ou categóricas, porque há uma simples atribuição de um predicado a um sujeito. Dir-se-á que se tem aí um julgamento de inerência, para distinguir este caso, onde apenas se afirma que o predicado convém (inere) ao sujeito, daquele em que se precisa o modo dessa inerência (proposições modais).

As enunciações compostas. – O predicado afirmado exprime, neste caso, o laço existente entre enunciações simples. Ex.: “Se a chuva cai, a terra é molhada”.

Tais enunciações são ditas de conjunção ou compostas; a cópula não é mais o verbo “é”, mas partículas tais como “ou”, “se”, “e”. Vê-se que se trata de um caso’ muito diferente do precedente: a modalidade de ser que se afirma não é mais uma parte da essência ou um acidente de um sujeito, mas o próprio laço (causalidade ou coexistência) que une várias realidades. Os elementos de tal enunciação são já enunciações constituídas; daí lhes vem a denominação de enunciação composta (ou hipotética). Entretanto, não se trata ainda de um verdadeiro raciocínio, uma vez que não existe ainda, propriamente falando, um movimento do espírito a partir de verdades adquiridas em direção a uma nova verdade. -A enunciação composta, que tem seu fundamento na pluralidade do ser e nas relações que resultam dessa pluralidade, corresponde, no âmbito da segunda operação do espírito à divisão e à definição no âmbito da primeira, que são atividades relativas à pluralidade das essências e a suas relações.

As enunciações modais. – O predicado afirmado é o próprio modo de ligação dos dois termos de um julgamento “é necessário que o justo seja recompensado”. Estes modos, afetando a cópula ou o verbo, são, nós o veremos, o possível, o impossível, o necessário, e o contingente. A afirmação assim constituída tem como objeto a modalidade de ipsum esse que ela considera.

A teoria dos modais é longamente desenvolvida por Aristóteles no Peri hermeneias; a das proposições compostas, ao contrário, não remonta senão à lógica estoica.

Propriedades das enunciações.

As enunciações, consideradas como um todo e umas em relação às outras, têm propriedades. A mais essencial dessas propriedades é a oposição, que decorre do próprio caráter de afirmação ou de negação que necessariamente apresenta todo julgamento. Quando eu declaro que “este objeto é branco”, estou afirmando, por isso mesmo, uma oposição a toda outra proposição que possa ser-lhe contrária, tal como: “este objeto não é branco”.

A noção de “oposição” tem um lugar considerável nos escritos lógicos de Aristóteles. É estudada, em particular, quando se trata da proposição, no Peri hermeneias (a partir do c. 6), mas já tinha sido encontrada antes, a respeito dos termos (Categorias, c. 10 e 11); (ef. igualmente: Metafísica, A, c. 10 e I, c. 4 e seg.). Ler a este respeito, em Le Système d’Aristote de Hamelin o capítulo consagrado à oposição (p. 128 e seg.).

É possível descobrir-se, na filosofia anterior, uma dupla origem para esta teoria: na física pré-socrática, por um lado, onde já se dava grande importância à contrariedade das qualidades, quente-frio, sêco-úmido, e onde se concebia a mudança como a passagem de um contrário a outro contrário; por outro lado, nas especulações sobre a possibilidade da atribuição (as de Antístene, notadamente), onde se supunha necessariamente admitida a exclusão parmenidiana do ser e do não-ser. Na filosofia moderna, essa noção da oposição foi de novo posta em evidência: alguns idealistas, Hegel, Hamelin, e sob um outro ponto de vista Meyerson, a consideram praticamente como o fato primitivo ou o dado essencial sobre o qual deve repousar toda a metafísica.

A teoria aristotélica, para voltar a ela, compreende duas peças principais que iremos considerar sucessivamente: 1. uma teoria geral da oposição com sua distinção em quatro tipos fundamentais; 2. a teoria especial da oposição das proposições. (Gardeil)