A doutrina da “estimativa” e da “cogitativa” – se podemos traduzir assim os termos “estimativa” e “cogitativa” – é uma das mais notáveis concepções da psicologia do conhecimento sensível que estudamos.
É um fato que os animais buscam certos objetos ou deles fogem, não somente enquanto estes têm uma relação favorável ou desfavorável com tal sentido particular, mas ainda porque são úteis ou nocivos à natureza do indivíduo considerado em sua totalidade. A ovelha, gosta de repetir Tomás de Aquino, foge do lobo, não em razão de sua cor ou de sua forma, mas como nocivo à sua natureza; e, semelhantemente, o passarinho recolhe palhas, não por prazer dos sentidos, mas em vista do ninho a construir.
Ora, é claro que tais objetos, isto é, a razão da utilidade ou da nocividade, não caem sob nenhum dos sentidos próprios. Por outro lado, ao menos no animal, não se pode dizer que sejam percebidos por uma inteligência, que não existe. Resta, pois, que existe um poder sensível especial, tendo por objeto estas relações não sensíveis, “intentiones insensatae”, a partir das quais as potências afetivas e motoras poderão reagir.
A teoria da estimativa, acabamos de reconhecer, parece ter sido inventada para explicar certas reações originais dos animais. Mas, movimentos semelhantes não são encontrados também no homem, no nível de sua atividade sensível? Não há, portanto, razão alguma que proíba admitir, também no caso do homem, a existência deste sentido interno. Vê-se logo, todavia, que, em seu psiquismo mais elevado, esta potência terá uma condição especial, levando-se particularmente em conta a influência que sobre ela exercerá a inteligência, que é a faculdade superior de governo Mas aqui se reservou para ela um nome particular; na tradição agostiniana, fala-se em um sentido aproximado à ratio inferior. Tomás de Aquino fica com o termo cogitativa. De modo preciso, a “cogitativa” distingue-se da estimativa por ter um campo de exercício mais extenso e sobretudo por poder, em razão de sua proximidade com as faculdades superiores, efetuar, na ordem concreta, aproximações que confinam com as sínteses propriamente intelectuais.
Em virtude desta vizinhança com a vida do espírito, deve a “cogitativa” ter, no psiquismo humano, um papel extremamente importante. Entre o sentido, que considera o singular concreto, e a inteligência, que é a faculdade do universal abstrato, desempenha papel de mediadora. Intervém assim na constituição dos esquemas imaginativos que servirão de matéria à intelecção. E é a ela que encontramos quando se trata de adaptar os imperativos superiores da razão à ação no mundo sensível. Se, por exemplo, quero escrever, é a “cogitativa” que põe em relação, em meu espírito, esta caneta, que tenho entre meus dedos, com o fim a conseguir, isto é, com os caracteres a traçar sobre a página branca diante de mim.
Estudando esta faculdade, pensa-se evidentemente nos modernos estudos sobre o instinto. Não se duvida que a atividade do instinto esteja ligada a este círculo de fenômenos que são hoje em dia agrupados sob este título. Todavia devemos notar que, na análise antiga, era antes o aspecto cognitivo dos fenômenos desta ordem que era colocado em evidência. Um estudo do instinto, feito nesta linha, deveria aparecer portanto com um caráter intelectual ou imaginativo bem marcado, não se excluindo de modo algum a possibilidade de reflexos absolutamente independentes da atividade do conhecimento. [Gardeil]