A Sabedoria

(gr. sophia; lat. Sapientia; in. Wisdom; fr. Sagesse; al. Weisheit; it. Sapienzà).

É o conhecimento superior das coisas excelentes. Caracteriza-se: 1) por ser o grau mais elevado de conhecimento, ou seja, o mais sólido e completo; 2) por ter como objetivo as coisas mais elevadas e sublimes, que são as coisas divinas.

Esse, pelo menos, foi o conceito inicial para distinguir os dois tipos de sabedoria, o que ocorreu em Aristóteles. Até ele, e mesmo em Platão, o conceito era um só e identificava-se com o de sabedoria como conduta racional da vida humana (cf. Platão, República 428 b; 4-33 e). Aristóteles distinguiu e contrapôs as duas coisas: “A sofia é o mais perfeito dos saberes. Quem o detém deve saber não só o que deriva dos princípios, mas também conhecer os princípios. Assim, a quinta pode ser chamada ao mesmo tempo de intelecto e ciência, e, encabeçando todas as ciências, será a ciência das coisas mais excelentes” (Et. Nic, VI, 7, 11 4 la 16). Intelecto e ciência têm aí o sentido específico definido por Aristóteles: intelecto (vouç) como conhecimento direto dos princípios da demonstração (Ibid., VI, 6, 1141 a 7), ciência como “hábito da demonstração” ou faculdade de demonstrar (Ibid., VI. 3 1139b 31). Portanto, a sabedoria (sophia) é o conhecimento mais certo e perfeito, por ser, ao mesmo tempo, conhecimento dos princípios e das demonstrações que deles resultam. Além disso, como tal, também é a ciência das coisas mais elevadas e sublimes. “Por natureza, há outras coisas muito mais divinas que o homem, como os astros luminosos de que se compõe o mundo. (…) Por isso se diz que Anaxágoras, Tales e outros homens desse tipo são sábios, porque não conhecem as coisas que lhes são úteis, mas as coisas excepcionais, maravilhosas, difíceis e divinas, porém inúteis, visto que não indagam acerca dos bens humanos” (Ibid., VI, 7, 1041 b 1). Portanto, o objeto específico da sabedoria é o necessário, aquilo que não pode ser de outro modo (Ibid., 1041 b 11), ao passo que a sabedoria tem por objetivo as atividades humanas mutáveis e contingentes. Essa doutrina de Aristóteles constitui um dos aspectos que mais acentuam a divergência entre ele e Platão, porquanto a filosofia de Platão tem em mira a sabedoria humana, enquanto a de Aristóteles opõe a esta a sabedoria divina. A afirmação do primado desse tipo de sabedoria caracteriza as filosofias de tipo contemplativo, tanto quanto a afirmação da superioridade da sabedoria prática caracteriza as filosofias orientadoras (v. Filosofia, II).

Em vista do caráterdivino” da sabedoria (sophia), não admira que nas filosofias de fundo religioso da época alexandrina e posteriores, ela tenha sido substancializada e entendida como uma espécie de intermediária entre Deus e o mundo: um equivalente do logos. Segundo Plotino, há uma sabedoria que é substância, e nenhuma outra sabedoria é melhor que ela: “cria todos os seres, todos emanam dela; ela mesma é os seres que nascem com ela e com ela se identificam, de tal maneira que sabedoria e substância são uma única coisa’’ (Enn., V, 8, 4). Esta concepção já se encontrava no livro bíblico da Sabedoria, onde se diz: “É um vapor da virtude divina e uma emanação sincera da luz de Deus onipotente. É esplendor da luz eterna, espelho imaculado da majestade de Deus e a imagem de Sua bondade. Embora sendo una, pode tudo, e, permanecendo em si, inova todas as coisas e transporta-se de nação a nação nas almas santas, que constituem os amigos de Deus e os profetas” (Prov., VII, 25-27). Por outro lado, os gnósticos haviam personificado a sabedoria, transformando-a na última emanação ou eão, que quer sair de seu estado de desejo e alcançar o conhecimento direto do Pai (Irineu, Adv. Haer., II, 5). Os próprios estoicos chamaram Deus, como alma do mundo, de “perfeita sabedoria” (Cícero, Acad., I, 29).

A filosofia medieval, com Tomás de Aquino, retoma o conceito aristotélico de sabedoria Segundo ele, a sabedoria tem em comum com todas as ciências a capacidade de deduzir conclusões de princípios, mas também tem algo mais que as outras ciências, “porquanto julga todas as coisas, não só quanto às conclusões, mas também quanto aos primeiros princípios; assim, é uma virtude mais perfeita que a ciência” (Suma Teológica, III, q. 57, a. 2, ad 1).

Na filosofia moderna, esse termo conservou o significado de conhecimento perfeito, tanto por ser completo quanto pela natureza de seu objeto. [Abbagnano]