virtudes cardeais

(lat. Cardinales virtudes; in. Cardinal virtues; fr. Vertues cardinales; al. Kardinaltugenden; it. Virtú cardinali).

Assim foram chamadas por Sto. Ambrósio (De off. ministr., I, 34; De Par, III, 18; De sacr., III, 2) as quatro virtudes de que fala Platão em República e que estão entre as que Aristóteles chamava de virtudes morais ou éticas, a saber: prudência, justiça, temperança e fortaleza. Tomás de Aquino procurou mostrar a oportunidade desse qualificativo, demonstrando que só as virtudes morais podem ser chamadas de cardeais ou principais, pois só elas exigem a disciplina dos desejos (rectitudo appetitus). na qual consiste a virtude perfeita; por isso, devem ser assim denominadas as virtudes morais às quais todas as outras se reduzem, isto é, as quatro acima referidas (S. Th., II, 1, q. 51) (v. virtude). [Abbagnano]


São assim denominadas (do latim cardo = gonzo), porque toda a vida moral gira em torno delas, como a porta em torno dos gonzos. São chamadas virtudes fundamentais, por serem a pressuposição necessária de todas as outras virtudes. Porque visam o que há de mais importante e árduo na vida moral, designamo-las também virtudes principais ou capitais, relativamente às quais as restantes, como virtudes acessórias, estão em relação de subordinação e de vassalagem. — Desde a Antiguidade se enumeram quatro virtudes cardeais: prudência, justiça, fortaleza e temperança.

[A justiça como virtude é a constante e firme vontade de dar a cada um o que lhe cabe por direito. Afins a ela são: a religiosidade, ou a vontade de honrar a Deus no culto (religião); a piedade (família), ou seja, a vontade de honrar os pais e a pátria, o respeito e a obediência (autoridade), isto é, a vontade de prestar honra aos que nos são superiores e seguir suas ordens no que for justo; a gratidão, ou a vontade de reconhecer de bom grado os benefícios recebidos e retribuí-los com o bem, na medida do possível.] — Brugger.

A prudência é a virtude mediante a qual a razão se torna capaz de ponderar meios e caminhos conduzentes ao fim último (Deus), de julgar e estabelecer a operação conforme com a razão e de prescrevê-la em cada caso particular. A virtude da prudência deve ser cuidadosamente diferenciada da prudência nos negócios, a qual pode comportar-se também de maneira imoral. A prudência é virtude intelectual e, nessa qualidade, não realiza ela mesma as ações morais. Contudo, é virtude moral, porque exige e determina a retidão do desejar, querer e operar. A prudência orienta a vontade; mas em compensação, depende desta, no que tange à sua existência. Quer isto dizer que a vontade, se não estiver dirigida em geral para o bem moral, forçará o juízo do entendimento de acordo com sua inclinação. A prudência compreende duas espécies: prudência para se dirigir a si mesmo e prudência para dirigir os outros. Aparentadas com a prudência são: a reflexão, ou capacidade para descobrir os meios; a inteligência, ou habilidade para decidir com clareza e segurança nos casos particulares; o juízo superior, ou aptidão para encontrar o reto caminho nos casos difíceis.

A fortaleza ou valentia consiste na disposição para, em conformidade com a razão, isto é, em atenção a bens mais elevados, arrostar perigos, suportar males e não retroceder, nem mesmo ante a morte (heroísmo). A fortaleza vence o medo, que faz recuar ante o mal iminente, e refreia a audácia (temeridade) que desafia e vai ao encontro do perigo e da morte; reprime a tristeza e prefere a virtude à vida corporal. A fortaleza mostra-se nos embates e na perseverança até o fim. São suas virtudes auxiliares: a paciência, ou constância em suportar as adversidades; a generosidade, ou energia e decisão no embate animoso; uma e outra principalmente com perigo de morte. São afins à fortaleza: a confiança, ou a justa autoconfiança ante a aproximação do perigo; a munificência (magnanimidade), ou prontidão em sacrificar seus bens em prol de fins bons; a tenacidade, ou firmeza perante as dificuldades exteriores, e a constância, ou o manter-se firme ante as resistências internas.

A temperança (disciplina, moderação) aperfeiçoa a potência apetitiva sensível, contendo o desejo de prazer sensitivo dentro das barreiras da razão. O prazer sensível, ligado a muitas atividades, não é, em si, reprovável, serve até para estimular o homem à prática de ações indispensáveis para a conservação do indivíduo e da espécie. Não deve, portanto, ser buscado de maneira excessiva e contrária ao fim. São espécies da temperança: a moderação no comer; a sobriedade no beber; e a castidade no que se refere ao prazer sexual. Como virtudes auxiliares, mencionamos: o decoro e o sentimento da honra. São aparentadas com a temperança: a negação ou domínio de si mesmo, isto é, a vontade de não se deixar desviar do bem, nem sequer pelas mais violentas excitações do desejo: a humildade (honra), ou moderação na tendência para sobressair; a mansidão, ou a vontade de dominar a ira; a clemência que se exerce na indulgência em castigar; e a modéstia que regula o comportamento externo.

A temperança e a fortaleza convêm em que ambas evitam as faltas contrárias e mantêm o justo meio, tal como a prudência o prescreve. Vide virtude, justiça. — Kleinhappl. [Brugger]