Valla

Valla, Lourenço (1407-1457)

Todos parecem estar de acordo em apontar Lourenço Valla como o principal humanista da primeira metade do séc. XV. Encarna um tipo de humanista muito original, não vinculado a nenhuma escola e considerado o “ousado precursor do livre pensamento”.

Valla representa, em primeiro lugar, um manifesto do método escolástico medieval e da lógica aristotélica. Ataca esta como esquema abstruso, artificial e abstrato, que não serve para expressar nem para conduzir a um conhecimento concreto e verdadeiro. A lógica aristotélica é racional e depende em grande parte do barbarismo linguístico. Assim se expressa em sua primeira obra dialética: Disputationes contra aristotélicos (publicada depois de sua morte).

A pouca simpatia por Aristóteles o fez estar mais atento aos estoicos e epicúreos. Seduziu-o a ideia destes últimos, ao sublinhar o anelo humano de prazer e felicidade. Assim o expressou em seu jornal de estilo ciceroniano De voluptate et summo bono, no qual se equilibra para manter-se na doutrina tradicional sem se inclinar demais para o epicurismo, que tanto atraiu humanistas como Morus e Erasmo. No Diálogo sobre o livre-arbítrio trata de esclarecer o pensamento de Boécio e responde à pergunta “se a presença de Deus e a liberdade da vontade humana são compatíveis”. Responde afirmativamente.

Dois campos asseguram sua fama de humanista: 1) Seu culto quase místico do latim, cuja ignorância e abandono são, segundo ele, a causa da noite medieval e o fim dos valores humanísticos. Com razão pode-se considerar o restaurador desse latim renascentista e culto, que será a expressão do pensamento humanístico e científico dos séculos XV ao XVII. Sua obra Elegantiarum linguae latinae libri sex (1444) é o ponto de partida para esse movimento. 2) Sua condição de filólogo levou-o a adentrar no terreno muito mais profundo da redditio adfontes: o retorno às fontes, ponto de partida do humanismo renascentista. Em seu In Novum Testamentum ex diversorum utriusque linguae codicum collectione adnotationes (1449) não se limita a realizar um novo trabalho gramatical ou filológico, mas procura devolver à cristã as contribuições da antiga razão, restituir a pureza dos textos bíblicos e indicar aos eruditos os caminhos do verdadeiro cristianismo. Essas anotações foram para Erasmo um verdadeiro achado. Nessa mesma linha da redditio ad fontes está seu estudo da Doação de Constantino (1442), na qual prova o caráter apócrifo do documento da doação constantiniana ao papa. Valla é assim modelo e exemplo dos novos humanistas procuradores da novidade na pesquisa dos velhos manuscritos e pergaminhos.

BIBLIOGRAFIA: Opera omnia. Basileia 1540; Scritti filosofici e religiosi. Ed. de G. Radetti, Florença 1953; P. O. Kristeller, Ocho filósofos del Renacimiento. México 1974, 35-36, em que estuda a contribuição de Valla ao pensamento humanista do Renacimiento; Humanismo y Renacimiento. Estudo e seleção de textos por Pedro R. Santidrián. Madrid 1986. (Santidrián)