Noé

Para melhor compreender o que se trata, é preciso em primeiro lugar lembrar que Vishnu, ao se manifestar sob a forma de peixe (Matsya), ordena a Satyavrata, o futuro Manu Vaivaswata, que construa a arca na qual deverão ser encerrados os germes do mundo futuro, e que, sob essa mesma forma, ele guia a seguir a arca sobre as águas, durante o cataclismo que marca a separação de dois Manvantaras sucessivos. O papel de Satyavrata é aqui semelhante ao de Seyidna Nuh (Noé), cuja arca contém de igual modo todos os elementos que servirão à restauração do mundo após o dilúvio; pouco importa que a aplicação que dele se faz seja diferente, no sentido de que o dilúvio bíblico, em sua significação mais imediata, parece marcar o início de um ciclo mais restrito que o Manvantara. Mas se não for o mesmo acontecimento, são pelo menos dois acontecimentos análogos, em que o estado anterior do mundo é destruído para dar lugar a um novo estado. (Guénon)


Enoque é o único exemplo de “retorno sucedido” que contém a Bíblia das Origens. Mesmo Noé, do qual ela nos diz no entanto que também “andava com os deuses”, e a quem seus méritos — relativos, no seio de sua geração inteiramente corrompida — valerão ser poupado pelo Dilúvio, aí não chegou jamais. Ao contrário, permanecerá mergulhado até o pescoço na “adama”…

Noé é o filho de Lemek, que saudou seu nascimento o chamando (QR’) de seu nome derivado da raiz NWH (se repousar), e em predizendo que “ele os consolaria (da raiz NHM) dos sofrimentos que lhes infligia o trabalho de suas mãos, mais que não o fazia a “adama” que YHWH tinha amaldiçoado”(5,29). Frase equívoca onde Noé rivaliza com a “adama”, seja como consolador de seus contemporâneos (para quem a “adama” devia aparecer então como “consoladora”), seja para os consolar dos sofrimentos que ela lhes infligia (se se traduz a preposição “min” não por “mais que “ como venho de fazer, mas por “fora de” ou “proveniente de”, o que é sintaticamente possível). Depois do Dilúvio, Noé será qualificado ‘Y(SH) H’DMH (pronunciado “ish haadama”) quer dizer “alguém de adama” (9,20).
Desde antes do Dilúvio todavia, é dito dele como Enoque que “andava com os deuses” (“haelohim”) (6,9). [Paul Nothomb: Túnicas de Cego]