Se consideramos uma mensagem verbal despojando-a de sua significação, passemos a encará-la do ponto-de-vista estritamente físico. Vista sob este prisma, a onda sonora proferida por um falante é um continuum físico, pois as análises de laboratório, realizadas pelos espectógrafos de som, não conseguem distinguir os pontos de encerramento e iniciação dos seus elementos constitutivos. Ora, se a mensagem verbal não rompesse com o continuum físico era ou seria sempre idêntica a si mesma ou estaria numa constante mudança. Em qualquer um dos casos, não seria meio de comunicação. Abordada como comunicação, ou seja, como realidade linguística atualizada, a mensagem verbal se apresenta formada por unidades discretas — descontínuas — os fonemas. Estas unidades discretas são, para Jakobson, formadas por traços distintivos, entendendo-se como tais os elementos, atuantes em plano fonológico, cujo papel decisivo é diferenciar as unidades significativas. "Em toda mensagem transmitida a um receptor cada traço distintivo exige uma decisão afirmativa ou negativa". Assim, por ex., as palavras bala e pala distinguem-se tão só pelo traço sonoro/surdo. Isto equivale a dizer: os traços distintivos são compostos segundo eleições binárias. "No material sonoro em estado bruto não há oposições. É o pensamento humano, consciente ou inconsciente, que ‘extrai daí as oposições binárias para o seu uso fonêmico". — A hipótese da binariedade, cuja longa formulação só se completaria em 1956 (Fundamentals of Language, em colab. com Morris Halle, Mouton, Haia) supõe, portanto, que as línguas humanas, malgrado sua diversidade, apresentam uma base comum sobre a qual assentam, base passível de ser cientificamente descrita. Com efeito, em FL apresenta-se uma lista de doze oposições — que não poderemos aqui transcrever — que constituiriam o universo dos traços distintivos possíveis à comunicação verbal humana. Cada língua em particular aí "escolhe" as oposições que irão fonologicamente caracterizá-la. O que significa: o inventário constitui um dos universais da linguagem. — À grandeza da pretensão jakobsoniana tem correspondido o número cerrado de objeções. Uma das mais interessantes é formulada por D.B.Fry, para o qual um dos pontos da hipótese consiste em não precisar de que lado da fronteira traçada entre física e psicologia se coloca o traço distintivo. Se êle é dotado de qualidade física isto suporia a correspondência entre^fato físico e fenômeno percentual, o que é desmentido pelas provas experimentais (Malmberg). Se, ao invés, é dotado de qualidade psicológica, é o próprio processo de transformação dó estímulo físico em dado percentual para o reconhecimento do traço que deve ser elucidado. O problema contudo não encontrou ainda solução satisfatória. Donde a espécie de reserva com que, em geral, os tratadistas se manifestam. Em vez de uma plena adesão, encontrada num Halle, ou de uma plena recusa (Martinet), vigora uma posição moderada, que assim se traduz: o binarismo é uma solução econômica de descrição, mas nada por enquanto prova que o funcionamento do mecanismo principal siga, de fato, este modelo. — (Luiz Carlos Lima - DCC)