As mônadas têm percepções; porém algumas dentre as mônadas além de percepções, têm apercepções. As mônadas que têm apercepções e memória constituem o que se chama as almas, ou seja um plano superior, na hierarquia metafísica, ao das simples mônadas com percepções, ou seja, com ideias confusas e obscuras. Esforça-se Leibniz,, em muitas passagens de suas obras, para tornar patente a existência de percepções inconscientes; pois se não houvesse ou não pudesse haver percepções inconscientes, toda sua teoria viria abaixo. Se toda percepção fosse também, necessariamente apercepção, então todo o sistema metafísico de Leibniz viria abaixo. Porém Leibniz esforça-se por mostrar como na nossa própria vida psíquica, tão desenvolvida, pois somos almas com apercepção e memória, encontramos também percepções sem consciência, e alude a uma porção de fatos psicológicos bem conhecidos desde então na psicologia e que revelam que a cada momento estamos percebendo sem aperceber. Temos percepções e não apercepção disso. Por exemplo, quando Leibniz faz notar que o ruído das ondas do mar sobre a praia tem que se compor necessariamente de uma multidão enorme de pequenos ruídos: o que cada gota de água faz sobre cada grão de areia; e sem embargo, não somos conscientes desses pequenos ruídos, disso que ele chama petites perceptions, pequenas percepções. Somos conscientes somente da soma deles, do conjunto deles, mas não de cada um deles. À parte as sensações, alude também a uma porção de outros fenômenos psíquicos que não são conscientes. Seria bem fácil mostrar como em nossa vida psíquica estamos a cada momento tendo percepções e sensações das quais não nos damos conta. Pois bem: quando a mônada, além da percepção inconsciente, tem percepção consciente, ou seja, a percepção e capacidade de relembrar, ou seja, a memória, essa mônada é alma. Aqui Leibniz opõe-se radicalmente à teoria de Descartes, que afirmava que os animais não têm alma, que são puros mecanismos, iguais aos relógios, e funcionam como relógios. Pois bem; Leibniz considera que não há tal, antes que os animais têm alma, porque têm apercepção, se dão conta e ademais têm memória.
Outro degrau superior na hierarquia metafísica das mônadas seriam os espíritos. Leibniz chama espíritos às almas que ademais possuem a possibilidade, capacidade ou faculdade de conhecer as verdades racionais, as verdades de razão. A possibilidade de intuir as verdades de razão, de ter percepção aperceptiva das verdades de razão, é para Leibniz o sinal distintivo dos espíritos.
E, por último, no mais alto, no ponto supremo da hierarquia das mônadas, está Deus, que é uma mônada perfeita, ou seja, em que todas as percepções são apercebidas, em que todas as ideias são claras, nenhuma confusa, e em que o mundo, o universo, está refletido não de um ponto de vista, mas de todos os pontos de vista. Imaginemos, pois, um ser que veja o universo, como o vemos nós, de um setor do universo. Todo o universo está nesse setor, porque sem descontinuidade nenhuma poderíamos passar desse setor a outro; porém simultaneamente não podemos estar situados mais que num ponto de observação; de maneira que, embora tendo o máximo conhecimento científico não poderíamos refletir o mundo mais que de um certo ângulo visual. Mas imaginemos agora um ser que possa refletir, da soma de todos os ângulos visuais, o mundo, um ser que tenha uma perspectiva universal: esse é Deus.
Desta maneira, o enxame infinito das mônadas constitui um edifício hierárquico em cuja base estão as mônadas inferiores, as mônadas materiais, cujos conglomerados constituem os corpos mesmos, que são pontos de substância imaterial, pontos de substância psíquica com percepção e apetição. Mas logo em cima estão as almas, ou seja aquelas mônadas dotadas de apercepção e de, memória. Por cima ainda, os espíritos, aquelas mônadas dotadas de apercepção memória e conhecimento das verdades eternas. E finalmente, no ápice, está Deus, mônada perfeita, na qual toda ideia é clara, nenhuma confusa, e toda percepção é apercebida ou consciente. [Morente]