P — Vocês precisam de conceitos?
J — Provavelmente sim. O encontro com o pensamento europeu revelou uma incapacidade de nossa língua.
P — Como assim?
J — Falta a força das definições para representar objetos num encadeamento preciso de uns com os outros, dentro de um sistema recíproco de subordinação.
P — O senhor considera mesmo essa incapacidade uma deficiência de sua língua?
J — No encontro inevitável do mundo oriental com o mundo europeu, essa pergunta exige, certamente, uma reflexão profunda.
P — O senhor toca numa questão controvertida que discuti, muitas vezes, com o conde Kuki: será mesmo necessário e legítimo que os orientais procurem os sistemas de conceitos dos europeus?
J — Diante da tecnicização e industrialização modernas de todos os recantos da terra, parece que não há outra saída.
P — O senhor fala com cautela e diz — “parece que…”
J — De fato. Pois sempre resta a possibilidade de que, olhando do lugar e do modo de ser oriental, o mundo técnico que nos arrasta se restrinja à superfície e… que…
P — nessas condições, não se dê propriamente um encontro com o lugar e modo de ser europeu, apesar de todas as tentativas de mistura e equiparação.
J — Talvez até nem possa acontecer.
P — Será que devemos afirmar isso assim tão incondicionalmente?
J — Eu seria o último a fazê-lo, pois do contrário não teria vindo para a Alemanha. Mas sempre sinto o perigo que, evidentemente, o conde Kuki também não pôde controlar.
P — A que perigo o senhor se refere?
J — Ao perigo da riqueza dos conceitos proporcionada pelo espírito das línguas europeias, trata-se do perigo de se reduzir o que ocupa nosso lugar e modo de ser a algo indeterminado e escorregadio. (GA12)
Assim, os conceitos, por intermédio dos quais interpretamos o mundo, pussuem o caráter de um grupo, que, no dizer de Poincaré, pré-existe a tal ponto em nosso espírito, que não podemos pensar sem a sua intervenção. Isto é matemática reduzida à sua forma pura. Condiciona nossos meios de expressão, já que nosso pensamento é sempre global. Não distingue homologias; antes, delas se serve. Não individualiza imagens que têm muito de devaneio, como a nuvem em que Hamlet enxergava simultaneamente uma baleia, uma doninha e um camelo. Apenas vai captar um conjunto de elementos da mesma forma, um grupo da mesma atitude, um gesto de mesmo sentido, constituindo a referência comum que caracteriza nosso interesse passageiro. A linguagem não pode obter uma precisão maior que este pensamento que ela tenta traduzir e cuja indeterminação lhe facilita expressar-se. Do gesto ao símbolo podemos portanto dizer que o mecanismo da língua, dos signos e de nosso pensamento, utiliza sempre uma simples analogia topológica. (Benoist)