intuição emotiva

A intuição emotiva, que em alguns casos não deixa de estar tingida de um elemento religioso, encontra-se em dois pensadores modernos, nos quais quase não foi notada até agora. Um ó Espinosa. Em muitíssimos livros de filosofia se diz que Espinosa não faz uso da intuição; que Espinosa demonstra suas proposições more geométrico, como puras demonstrações de teoremas de geometria, onde o elemento discursivo abafa por completo toda intuição. Todavia, isto é mera aparência. Na realidade, no fundo da filosofia de Espinosa, existe como que uma intuição mística; chega um momento, no último livro da Ética de Espinosa, em que, sob a forma de uma demonstração geométrica, aparece a intuição emotiva, que rompe os moldes lógicos da demonstração e se faz patente ao leitor, não sem uma comoção verdadeiramente tremenda da alma; é quando Espinosa, ao chegar quase ao término de seu livro, sente-se elevado, sente-se sublimado no propósito filosófico que desde o começo o anima, e escreve esta frase como o enunciado de um de seus teoremas: “Sentimus experimurque nos esse aeternos”, que quer dizer: “Nós sentimos e experimentamos que somos eternos”. Aí se vê bem até que ponto toda esta crosta de teoremas e de demonstrações estava recobrindo uma intuição palpitante de emoção, uma intuição quase mística da identidade do finito com o infinito e da eternidade no próprio presente.

Outro que, por estranho que pareça, pretende também esta intuição emotiva é nada menos que o filósofo inglês Hume. Para Hume a existência do mundo exterior e a existência do nosso próprio eu não podem ser objeto de intuição intelectual; não podem ser objeto nem de intuição intelectual nem de demonstração racional. Não se pode demonstrar a ninguém que o mundo exterior existe ou que o eu existe. A única coisa que se pode fazer é convidar alguém a dizer se acredita que existe o mundo exterior ou se crê que existe o eu, porque a ideia que temos do mundo exterior não é mais que um belief, uma crença. Cremos, temos ; nossa crença no mundo exterior e na realidade de nosso eu é um ato de fé. [Morente]