interlocutor

Assim, no Ménon (75cd), Sócrates afirma que o que caracteriza o espírito da discussão filosófica, por contraste com a simples erística, é curar não apenas das proposições enquanto tais, mas também do saber do interlocutor, estabelecendo assim, eo ipso, uma distinção tácita entre o saber e a definição. A isto se liga a importância que Sócrates atribui não só aos enunciados, tomados em si mesmos, mas principalmente a quem os enuncia, exigindo por diversas vezes a presença do autor das definições, ou, pelo menos, indicando a necessidade dessa presença, para que ele possa dar conta do que justamente enunciou (V. Chrm., 161cd e cf. 162ab, R., I, 349ab, 350e, Hp. Mi., 365cd, e principalmente Men., 71be), o que sugere claramente que o saber não se ajuíza pela simples definição, mas pela capacidade de dar a sua razão. Tal não belisca, evidentemente, o princípio distintamente platônico segundo o qual o que importa não é tanto quem diz, mas a verdade ou inverdade desse dizer; todavia complementa-o, mostrando que, para Platão, o exame comporta necessariamente a averiguação de se o interlocutor sabe ou não o que eventualmente diz bem, o que justamente estabelece uma diferença entre o puro definir e, portanto, o puro saber da definição e daquilo que a definição expressa (e que, podendo ser saber efetivo, também pode ser o fruto de uma mera aprendizagem exterior, como é manifestamente o caso de Nícias, de Cármides ou de Ménon) e o saber, outro que a definição, que eventualmente lhe subjaz. Ora é neste contexto que se justifica a descrição socrática da sua investigação como um «duplo teste», da verdade e do interlocutor, expressamente enunciada no Protágoras (333d; cf. 348ab), mas que é impossível não associar às reiteradas referências de Sócrates a um «exame de mim próprio e dos outros», nomeadamente na Apologia (18d, 20d-23c, 29a, 29d-30a, 30c-31a, 33ac, 37e-38a, 41b) e no Cármides (166de), e à descrição extremamente sugestiva de Sócrates por Nícias (La., 188ac), onde a nota saliente é a de que toda a discussão socrática, independentemente do assunto, comporta invariavelmente a análise do próprio interlocutor. [MesquitaPlatão:56-57 Nota]