Entender alguma coisa significa, em primeiro lugar, penetrá-la completamente até sua razão ou fundamento. O que se compreende inteiramente vê-se tal como é, ou seja, desde seu fundamento primeiro. Todavia, como o contingente tem sua razão suficiente, não em si, mas sempre noutro que é sua causa, entender um objeto contingente é conhecê-lo por suas causas. Para entender os fenômenos da natureza, serve, antes de mais nada, a explicação (explicar) ou redução a causas ou leis naturais necessárias, e também, a modo de complemento, a compreensão que se situa no ponto de vista da finalidade; para entender o ser espiritual, recorre-se aos fins e à individualidade espiritual, ou seja à compreensão (compreender) própria das ciências do espírito. Se algo contingente deve ser completamente compreendido, quer dizer, não só nesta ou naquela peculiaridade, senão em sua própria contingência, importa remontar à Causa última e necessária por si mesma.
A intelecção por parte do entendimento corresponde a inteligibilidade por parte dos objetos. A questão está em saber se os objetos em sua totalidade são inteligíveis ou se o ente, enquanto tal, é inteligível. Em todo caso, a inteligibilidade essencial ao ente enquanto tal não pode ser referida exclusivamente ao entendimento humano; ela implica relação ao entendimento em geral e, em primeiro lugar, ao entendimento puro e infinito de Deus. Só para Deus existe a inteligibilidade plena e absoluta de todo ente, porque, mercê da perfeita identidade de conhecer e ser, ele é completamente inteligível, para si mesmo e com sua visão penetra tudo o mais até o mais íntimo fundamento, enquanto tudo dimana dele (e de seu ato livre de vontade). O princípio da inteligibilidade universal de todo ente caracteriza o idealismo metafísico. Este princípio exclui a possibilidade e um transininteligível em si, que seja completamente incognoscível (N. Hartmann); mas não exclui que a inteligibilidade do ente tenha graus correspondentes aos graus da diversa perfeição ontológica (graus de ser). O que existe unicamente num sentido impróprio e atenuado, p. ex., o mal, é inteligível também só num sentido impróprio e atenuado.
Todo ente está, de algum modo, aberto ao entendimento humano, visto este ser verdadeiro e genuíno entendimento, isto é, pode, de alguma maneira, embora imperfeita, tornar-se objeto de seu conhecimento. Pelo contrário, há obstáculos que impedem a intelecção plena. Não podemos captar exaustivamente a realidade integral mediante conceitos próprios (conceito), como o racionalismo pensava; só nos é dado definir conceptualmente um domínio intermédio daquela, e, mesmo assim, só de maneira incompleta. A completa e positiva definição conceptual subtraem-se tanto a indeterminação do resto material (ininteligível) remanescente após toda abstração e a individualidade condicionada pela matéria (indivíduo), quanto a infinidade do Ato puro situado além de toda forma e limitação. Contudo, na área intermédia encontram-se o sentimento e o fato da livre decisão, que não admitem compreensão conceptual exaustiva. Nosso pensamento pode aproximar-se destes objetos só mediante conceitos análogos (analogia, conceito) e reflexão. Assim se torna possível conhecer de modo mediato e analógico o resíduo ininteligível de um objeto pela relação com a quididade conceptual e conhecer, outrossim, a infinidade do Ato puro como fonte das essências finitas. Mas a possibilidade de conhecer (imperfeitamente) o próprio sentir e querer é subministrada pelo fato de a razão penetrar as restantes faculdades da alma, sendo, em derradeira instância, o homem todo quem atua mediante as potências, e não cada uma destas em separado. O homem não só vê, sente e quer; sabe também que executa estes atos e pode com sua razão refletir sobre eles, obtendo assim um conhecimento mediato destas atividades e dos objetos das mesmas. — Brugger.
Duns Scot nos mostra que a inteligibilidade acompanha a toda entidade, repetimos. Todo ser, enquanto é, é inteligível.
Todo ser, enquanto é, é semelhante a qualquer outro, porque o ser é predicável tanto a um como a outro.
A inteligibilidade do ser é a sua verdade ontológica. É esta a propriedade de todo e qualquer ser, enquanto tal, pois é assimilável aos esquemas noéticos.
É esta verdade que funda a verdade lógica, quando esta se dá pela adequação do esquema noético ao esquema concreto do ente. [MFS]