O primeiro, e o mais abstrato, de todos esses princípios, é o princípio da permanência do ser — que cada corpo, ou cada ente, tem, antes de mais nada, a tendência a continuar sendo o que é, a resistir às forças externas que tendam a desintegrá-lo. A desintegração total é difícil na proporção da complexidade do corpo; uma molécula é mais fácil de desintegrar do que uma sociedade, porque uma molécula tem uma medíocre capacidade de resistência, ao passo que uma sociedade, pela sua complexidade, tem muitas. Mas, ao contrário, os corpos de mais difícil desintegração total, pela sua complexidade, são, por essa mesma complexidade, de-fácil desintegração parcial.
O segundo princípio é o de que essa tendência a permanecer tal qual é deriva, em qualquer corpo, de um equilíbrio, ou, antes, realiza-se, ou não se realiza, em qualquer corpo, consoante se mantém, ou se não mantém, determinado equilíbrio.
Daí o fato de que o corpo inorgânico ou existe ou deixa de existir, ao passo que o corpo orgânico é susceptível, além da morte, de uma coisa chamada a doença.
A humanidade não existe sociologicamente, não existe perante a civilização. Considerar a humanidade como um todo é, virtualmente, considerá-la como nação; mas uma nação que deixe de ser nação passa a ser absolutamente o seu próprio meio. Ora um corpo que passa a ser absolutamente do meio onde vive é um corpo morto. A morte é isso — a absoluta entrega de si próprio ao exterior, a absoluta absorção no que cerca. Por isso o humanitarismo e o internacionalismo são conceitos de morte, só cérebros saudosos do inorgânico o podem agradavelmente conceber. Todo o internacionalista devia ser fuzilado para que obtenha o que quer, a integração verdadeira no meio a que tende a pertencer.
Só existem nações; não existe humanidade. (Presumivelmente de 1928) [Fernando Pessoa]