fim

(gr. telos, ou eneka; lat. finis; in. End, Purpose; fr. Fin, But; al. Zweck; it. Fine).

Esta palavra tem as seguintes significações principais:

1) limite, no sentido com que Aristóteles diz: “a natureza procura sempre o fim”, ou seja, “foge do infinito” (De gen. an., I, 1, 715 b, 16, 15). Dewey usou essa palavra no mesmo sentido: “Podemos conceber o fim como devido ao cumprimento, à consecução perfeita, à saciedade, à exaustão, à dissolução, a alguma coisa que diminuiu ou cedeu”; em outras palavras, os fim são só “termos ou conclusões de episódios temporais” favoráveis ou desfavoráveis, bons ou ruins (Experience and Nature, pp. 97 ss.);

2) término ou perfeição, com o sentido que frequentemente tem a palavra grega télos. Neste sentido diz-se que uma coisa “chegou ao fim” sobre uma coisa que foi terminada;

3) motivo ou causa final, no sentido da quarta das quatro causas aristotélicas (v. causalidade). Neste sentido a palavra italiana scopo, a francesa but, a inglesa purpose são mais bem empregadas, pois têm caráter objetivo, quer se entenda o fim como imanente à natureza, quer se entenda como motivo de um comportamento humano: é o termo final do projeto ou do plano ao qual se refere;

4) intuito ou alvo, ou seja, fim em seu aspecto subjetivo, como aquilo que tem em mira certa intenção, mas que pode ser diferente do alvo atingido na realidade. [Abbagnano]


Via de regra, na terminologia filosófica, este vocábulo não designa o mero termo, ou seja, o último de uma série, mas sim “aquilo, pelo qual (id, propter quod) alguma coisa existe ou se faz (fit). A expressão “pelo qual” mostra que o fim é um certo bem que move a operar, não aquilo “mediante” (per) o qual alguma coisa se faz ou realiza. Se o mencionado bem é realmente distinto daquilo que por ele existe ou se faz, nesse caso o fim constitui uma verdadeira causa, a saber: a causa final. Mas se o bem, que move a operar, se identifica realmente com aquilo que por ele existe, o fim não é causa final na acepção própria, mas unicamente razão final, a qual quase coincide com o sentido teleológico. Assim, p. ex., a indicação das horas é causa final da ação do relojoeiro, mas é razão final do movimento regular dos ponteiros do relógio.

A causa final exerce influxo causal, porque, conhecida em sua dimensão de bem, incita a causa eficiente a operar; donde, só pode causar por intermédio desta. Não se pretende pois, por forma alguma, substituir a causa eficiente, pela final, nem como por vezes se objeta, admitir a segunda por mera ignorância da primeira. Do exposto, resulta claramente que a causa final, pelo menos quando considerada de maneira completa, ou seja, forma/mente (formaliter), implica relação com o entendimento e com a vontade, porque só ao conhecimento e ao apetite racionais é dado alcançar o bem enquanto tal. Contudo, o animal, dotado só de conhecimento e de apetite sensitivos, age também analogicamente em ordem a um fim, visto ser impelido à atividade por um determinado bem particular em seu aspecto de bem deleitável. Mais: todo agente, pelo menos enquanto dirigido pelo apetite natural, opera, tendo em vista um fim. Aliás, o fim apetecido de modo sensitivo ou meramente natural supõe, em derradeira instância, um fim conhecido por uma inteligência e apetecido por uma vontade racional. Donde, o fim apreendido de maneira incompleta, como puro termo do apetite natural ou sensitivo, só pode com razão chamar-se fim, do ponto de vista material (materialiter). Com maior razão, considera só materialmente o fim quem atende exclusivamente aos critérios empíricos que nos indicam a ordenação teleológica.

O bem, que é fim, pode obter-se de diversas maneiras, relativamente à operação que para ele tende. Com efeito, ou esse bem ainda não existe e deve primeiro ser produzido pela operação: fim a ser realizado (finis efficiendus); ou já existe, mas sem que o apetente o possua ou deseje alcançá-lo: fim a ser obtido (finis oblinendus); ou então, sendo já possuído pelo sujeito querente, este tende para ele a fim de comunicá-lo a outros: fim a ser comunicado (finis communicandus); assim, p. ex., Deus comunica sua bondade às criaturas, pelo amor que lhes tem. Quando o fim não se realiza ou se obtém imediatamente por sua mera volição, é necessário empregar meios _ adequados à sua consecução. Estes são puros meios, se apetecidos exclusivamente por motivo de outra coisa, que não pela bondade que em si possuem; mas constituem um fim intermédio, se até certo ponto são apetecidos também por sua própria bondade ordenada ao fim.

O fim (principalmente o fim a ser realizado) pode ser interno ou externo consoante se realize no mesmo agente que a ele se ordena ou noutro ente. Assim, p. ex., fim interno do vivente é o pleno desenvolvimento de sua vida; fim externo do mesmo vivente pode ser o proveito de outro vivente, como ocorre na hetero-finalidade (Finalidade). Não coincide com esta divisão do fim, a que se faz da finalidade em interna (ou intrínseca) e externa (ou extrínseca), entendendo-se pela primeira a que dimana de um princípio ativo interno, e pela segunda a que, carecendo de tal princípio, lhe é imposta de fora. Uma máquina, por exemplo, não possui um princípio interno que tenda para seu fim, mas suas partes foram simplesmente coordenadas desde o exterior, de tal forma que por sua cooperação se obtenha o fim que o construtor tinha em vista; pelo contrário, tratando-se da hetero-finalidade de um vivente, este tende com finalidade interna para um fim externo, a saber: o proveito de um ente de diversa espécie. — Tampouco coincide com a divisão exposta do fim em interno e externo, a que se propõe, dividindo-o em fim da obra (finis operis) e fim do operante (finis operantis). Entende-se por “fim do operante” todo e qualquer fim que um agente tem em mira, e por “fim da obra” o fim a que a obra está ordenada por sua mesma natureza. Assim, por exemplo, o fim que o relojoeiro tem em mira, ao construir um relógio, pode ser o sustento de sua família: fim externo, tanto ao relojoeiro quanto ao relógio. Contudo, o fim da obra pode também ser externo a esta, como, p. ex., o corte, que se há-de dar, é o “fim da obra” da faca.

No agente livre, temos que distinguir principalmente o fim procurado de fato e o fim que ele deve procurar, ou seja, o que lhe é assinalado ou fixado, fim que continua sendo fim, embora de fato não se tenda a ele. Assim, o bem moral é o fim, à obtenção do qual o homem deve tender.

No que tange à aplicação de meios para a consecução de um fim, servem de norma os seguintes princípios: meios em si indiferentes participam da bondade do fim, quando aplicados a um fim bom; ao passo que meios em si moralmente maus nunca podem ser coonestados por um fim bom. Assim sendo, é falso o asserto: “o fim justifica os meios”. — De Vries. [Brugger]