A palavra falada nunca se encontra por si. Ela é sempre uma resposta, uma contrapalavra no sentido exato do termo; ela é réplica [Cf. o vocábulo antworten (responder) no Dicionário Grimm (Grimm, Dicionário alemão, primeiro volume, Leipzig, colunas 508-510)], mesmo quando é visada com concordância. A pergunta também sempre se mostra como uma resposta quando está ligada àquilo que foi dito e ela é passível de ser reconhecida como resposta, quando se mostra como uma nova pergunta ou uma outra pergunta. Todavia, enquanto contrapalavra, a resposta não permanece contraposta. Ela é direcionada para o outro e é, quando tem sucesso, acolhida por esse outro. Ela se comunica com ele. Toda palavra falada é comunicação e pertence, assim, a um diálogo; isso se não nos dispusermos a compreender por um tal diálogo a troca entre poucos e se retirarmos da palavra “diálogo” o sentido edificante que por vezes a envolveu. “Estar em diálogo” nem sempre é algo bom, nem precisa ser tampouco algo agradável e amistoso. O discurso político também está vinculado dialogicamente; ele também se mostra como polêmica, como provocação ou como réplica. [FigalO:79]
Mas por que se fala ainda em Mundo e Universo? Por que se fala em Deus ou em deuses, por que se fala de Alma e Espírito, por que se fala em outras tantas coisas do mesmo jaez, embora uns só nelas falem por ouvir falar, e outros falem com certo sentimento de estranheza, com certo pejo de falta cometida contra a ciência de objetividade? Podem dizer-nos: «São modos de falar!» Mas ainda havia que retorquir: «Sim; mas de falar do quê?» Se não é disso que falam, por que o falam e de que falam? Porquê prender no conservatório dos léxicos palavras que perderam o sentido? Decerto porque ainda não se perderam do sentido que tiveram, e nós não nos desapegamos do passado, como se o passado tivesse efetivamente passado. E assim se mantêm, na condição de as traduzirmos, como se pertencessem a uma língua morta, uma língua que ninguém fala no propósito de dizer algo que valha a pena ser dito. Escrevi, já não me lembro quando, que muitas palavras circulam entre os vivos que falam como se fossem «almas penadas». Sustento o que escrevi: há palavras que andam de boca em boca porque ninguém piedosamente as sepultou. Há de haver forte motivo para que o não fizessem. Não só porque bem caibam em verso de bom ou mau versejador, mas porque ainda podem, eventualmente, prestar verídico testemunho, se a tal forem chamadas, acerca do passado que se supõe passado, mas não passou, acerca do outrora que sempre surge no entreagoras, que pacientemente esperam a vez de manifestar a sua presença de que se fez ausência, sem refletir que o reparar-se na ausência é modo de se afirmar a presença. Em ab-s-entia e prae-s-entia está a entitas do que é, umas vezes envolvida e encoberta, outras, desenvolvida e desencoberta. [EudoroMito:67]