eleos

A reprodução imitadora (μίμησις [mimesis]) da tragédia como distorção do sentido do sofrimento (λύπη [lype]). A compaixão (ἔλεος) patológica dessa «distorção»

«O poeta faz nascer uma má constituição na existência particular de cada um» [Rep., 605b7]. Como resultado desta má constituição (κακή πολιτεία [kake politeia]), os melhores podem ser pervertidos [Rep., 605c7]. Esta «perversão» e «distorção» das situações (πράξεις [praxeis]) humanas podem resultar da atenção prestada aos poetas. É o que acontece quando procuram representar a situação aflitiva em que se encontra qualquer um dos heróis, e a circunstância em que ele se encontra, quando se está a queixar do que lhe sucedeu [Rep., 605d2]. O que nessa altura se passa, de uma forma extraordinária, é que nos regozijamos e nos abandonamos a eles, seguindo o que se passa com compaixão e avidez. Então, achamos que o poeta que nos deixa assim dispostos de uma forma extrema (μάλιστα [malista]) é bom [Rep., 605d3-5. Cf. Marta Nussbaum, «Tragedy and Self-Sufficiency: Plato and Aristotle on Fear and Pity», OSiAP, pp. 107-160, p. 125.].

A representação mimética das ações humanas cria uma situação absolutamente paradoxal. As situações aflitivas que levam a [90] lamentos pesarosos e a um sofrimento agudo fazem que nos regozijemos, que nos abandonemos a esse espetáculo e o gozemos, sentindo um prazer intenso. O sofrimento «reproduzido mimeticamente» dá prazer. Ou seja, o sentido da situação em que se encontra alguém que sofre não é só percebido à distância. Por essa «distância mimética» dá-se uma perturbação tal que o sentido da situação é completamente distorcido [A distorção do sentido tem como resultado a contraditoriedade que há entre o estar ἐν πένθει [en penthei], ἐν τοῖς ὀδυρμοῖς [en tois odurmois] e, por outro lado, ο χαίρειν [chairein] com que acolhemos esses πάθη.].

A distância a que nos encontramos da situação é quase inultrapassável. Se, quando a situação de depressão (λύπη) nos sucede a nós, há uma enorme dificuldade em sabermos de que modo nos devemos e podemos comportar, ora abandonando-nos ao pathos (πάθος), ora mantendo a calma, essa dificuldade é então acrescida, quando tomamos em consideração aquilo que acontece não a nós mas a um outro. Isto é, se, «quando um cuidado e preocupação particulares nos sucedem a cada um de nós, fingimos que é o contrário que se passa, e tentamos passar bem, dominar o sucedido, achando que é esta a forma de comportamento corajosa e a outra [sc., a que se abandona ao sofrimento] efeminada» [Rep., 605d7]; se achamos mais valorosa a disposição da tranquilidade, relativamente às situações adversas por que passamos, do que o lamento queixoso, como é, então, sentirmos uma forma de prazer (ἡδονή [hedone]) ao ver «outro» nessa situação? [«Aquela parte da alma que era violentamente constrangida no momento em que é afetada pelas adversidades particulares que lhe sobrevêm e tem necessidade [à letra, tem fome] de chorar e de se lamentar amargamente e de saciar-se até à satisfação — porque é da sua natureza o desejar este tipo de coisas —, é a que é preenchida pelos poetas, e a que faz regozijar; por outro lado, a [parte] que por natureza é a melhor de nós, uma vez que não foi suficientemente educada pelo logos nem pelo hábito, afrouxa a guarda à sua parte queixosa, na medida em que tem em vista as afetações alheias, e não é nada vergonhoso elogiar e ter pena de um outro homem qualquer que se diz bom, quando este se lamenta de uma forma extemporânea» (Rep., 606a3-b3). Mario Puelma, «Der Dichter und die Wahrheit in der griechischen Poetik von Homer bis Aristóteles», MH, 46, (1989), pp. 65-100: «Der Dichter schmeichelt mit seinen mimetischen Bildem der sinnlichen Welt nur dem vernunftlosen Seelenteil, in der das Triebhafte vor dem verniinftig Einsichtsvollen herrscht» (p. 84). Wolfgang Hiibner, «Hermes ais musischer Gorr», Philologus, 130, 1986, 2, pp. 153-174: «O modo como Hermes diz a verdade é o da dupla negação, a qual «kann das diskursive Denken nur im Paradox formulieren, und damit ist die Grenze dessen, was sich denken oder noch irgenwie die Worte fassen lässit, erreicht» (p. 174).] [91] [CaeiroArete:90-91]


ELEOS = MISERICÓRDIA, COMPAIXÃO, PIEDADE

Bem-aventurados os misericordiosos (eleimon), porque eles alcançarão misericórdia (eleithesontai — eleos); (Mt 5,7)

7 Em marcha, os matriciais! Sim, eles serão matriciados! (tr. Chouraqui)


Infelizmente o termo ganhou uma conotação “melosa” que nada tem de sua força viril original, indicativa de um esforço interior de grande intensidade, requerendo uma condição de trabalho sobre si mesmo que só poucos dispõem, apenas os “bem-aventurados” (v. BEATITUDES).

Excertos do “Vocabulário de Teologia Bíblica”
El lenguaje corriente, influenciado sin duda por el latín de iglesia, identifica la misericordia con la compasión o el perdón. Esta identificación, aunque valedera, podría velar la riqueza concreta que Israel, en virtud de su experiencia, encerraba en la palabra. En efecto, para él la misericordia se halla en la confluencia de dos corrientes de pensamiento, la compasión y la fidelidad.

El primer término hebreo (ra’hamim) expresa el apego instintivo de un ser a otro. Según los semitas, este sentimiento tiene su asiento en el seno materno (rehem: 1Re 3,26), en las entrañas (rahamim) — nosotros diríamos: el corazón — de un padre (Jer 31,20; Sal 103,13), o de un hermano (Gén 43,30): es el cariño o la ternura; inmediatamente se traduce por actos: en compasión con ocasión de una situación trágica (Sal 106,45), o en *perdón de las ofensas (Dan 9,9).

El segundo término hebreo (hesed), traducido ordinariamente en griego por una palabra que también significa misericordia (eleos), designa de suyo la piedad, relación que une a dos seres e implica fidelidad. Con esto recibe la misericordia una base sólida: no es ya únicamente el eco de un instinto de bondad, que puede equivocarse acerca de su objeto o su naturaleza, sino una bondad consciente, voluntaria; es incluso respuesta a un deber interior, fidelidad con uno mismo.

Las traducciones de las palabras hebreas y griegas oscilan de la misericordia al amor, pasando por la ternura, la piedad o conmiseración, la compasión, la clemencia, la bondad y hasta la gracia (heb. len), que, sin embargo, tiene una acepción más vasta. A pesar de esta variedad, no es, sin embargo, imposible circunscribir el concepto bíblico de la misericordia. Desde el principio hasta el fin manifiesta Dios su ternura con ocasión de la miseria humana; el hombre, a su vez, debe mostrarse misericordioso con el prójimo a imitación de su Creador.


CRISTOLOGIA
Mestre Eckhart: SERMÃO VII


PERENIALISTAS
Frithjof Schuon: O ESOTERISMO COMO PRINCÍPIO E COMO VIA
O modelo divino da generosidade é a Misericórdia ou, mais precisamente, o elemento BondadeBelezaBem-aventurança. À misericórdia de Deus corresponde a confiança do homem — virtude que se opõe à dúvida, à amargura e ao desespero —, ao passo que a generosidade humana participa necessariamente da Misericórdia divina.