comunicação das substâncias

Concebamos aqui que a alma tem sua sede principal na pequena glândula que há no meio do cérebro, de onde irradia a todo o resto do corpo por meio dos espíritos, os nervos e inclusive o sangue, que, ao participar das impressões dos espíritos, pode levá-los pelas artérias a todos os membros; e, recordando o que antes se disse da máquina de nosso corpo, a saber, que os pequenos fiosinhos de nossos nervos estão de tal modo distribuídos por todas suas partes, que pelos diversos movimentos que ali se excitam pelos objetos sensíveis, abrem de modo diverso os poros do cérebro, o que faz com que os espíritos animais contidos nessas cavidades entrem de maneira diferente nos músculos, por meio do que podem mover os membros de todas as diversas maneiras em que são capazes de se moverem, e também que todas as demais causas que podem mover de modo distinto os espíritos bastam para conduzi-los a diversos músculos, acrescentemos aqui que a pequena glândula que é a sede principal da alma está de tal modo suspensa entre as cavidades que contêm esses espíritos, que pode ser movida por eles de tantos modos diversos quantas diversidades sensíveis há nos objetos; mas que também pode ser movida de diversas maneiras pela alma, que é de tal natureza que recebe tantas percepções distintas quantos movimentos acontecem nessa glândula; como também, reciprocamente, a máquina do corpo está de tal modo composta que, pelo único fato dessa glândula ser movida de diversos modos pela alma ou por qualquer outra causa possível, impulsiona os espíritos que a rodeiam para os poros do cérebro, que os conduzem pelos nervos aos músculos, e por este meio os faz mover os membros. (Descartes – Traité des passions de l’âme, I, 34.)