Por conseguinte, esta inibição universal de todas as tomadas de posição frente ao mundo objetivo, à qual damos o nome de epoché fenomenológica, torna-se justamente o meio metódico pelo qual me apreendo puramente como aquele eu e aquela vida da consciência na qual e para a qual todo o mundo objetivo é para mim, e é tal como para mim é. Tudo o que é mundano, todo o ser espácio-temporal é para mim em virtude de o experimentar, percepcionar, recordar, de algum modo o pensar, julgar, valorar, desejar, etc. Tudo isto é designado por Descartes, como se sabe, com o título cogito. O mundo em geral é para mim apenas o que existe conscientemente e para mim vigora em tais cogitationes. Dessas cogitationes recebe ele todo o seu sentido e toda a sua vigência de ser. Nelas decorre toda a minha vida mundana. Não posso viver, experimentar, pensar, valorar e agir em nenhum outro mundo que não tenha o sentido e a validade em mim e a partir de mim próprio. Se me elevar acima de toda esta vida e me abstiver de toda a realização de qualquer crença no ser, a qual supõe justamente o mundo como existente, se dirigir exclusivamente o meu olhar para esta própria vida enquanto consciência do mundo, então ganho-me a mim como o ego puro com a corrente pura das minhas cogitationes. [Husserl – Meditações Cartesianas]